Raphael Assis
O Brasil é um dos principais consumidores e exportadores de açúcar e etanol do mundo. Apenas no primeiro bimestre de 2021, exportamos mais de 340 milhões de litros de etanol para o exterior e produzimos cerca de 40 milhões de toneladas de açúcar.
A matéria-prima utilizada na produção desses produtos, tão importante para a economia brasileira, é a cana-de-açúcar, cujo cultivo se concentra no Sul-Sudeste, devido ao avanço da tecnologia nessa região e ao uso da colheita mecanizada.
Em Sergipe, porém, com apenas 10% da área de colheita mecanizada, resta aos trabalhadores canavieiros a exaustiva tarefa de cortar manualmente os mais de 40 mil hectares de plantação de cana-de-açúcar no Estado.
A equipe do jornal A Verdade visitou um dos canaviais do Município de Laranjeiras para conversar com os trabalhadores e conhecer um pouco mais sobre sua vida e seu trabalho.
Apesar de os cortadores de cana trabalharem em regime CLT, o salário é calculado com base na produção. Em média, eles recebem R$ 9,38 a cada tonelada de cana cortada. Alguns conseguem cortar cerca de seis toneladas por dia. Quando se produz menos, ganha-se menos. Há relatos de trabalhadores que quase não conseguem completar um salário-mínimo no final do mês.
Nas palavras de José, cortador de cana que conversou com nossa equipe, “depende da experiência da pessoa. Aqueles menos experientes às vezes não conseguem cortar tão rápido como os que têm mais experiência e acabam ganhando menos”.
Em Laranjeiras, muitos trabalhadores vêm de Alagoas e precisam ficar alojados nas fazendas. Se quiserem visitar seus familiares nos fins de semana, precisam pagar suas próprias passagens ou esperar, uma vez por mês, um transporte coletivo fornecido pela empresa. Sobre a alimentação, eles precisam tirar do próprio bolso, pois a empresa não fornece vale ou refeições durante o expediente.
São comuns também os acidentes de trabalho em decorrência das técnicas manuais de corte. Há vários casos de dedos decepados e picadas de cobras nos canaviais. É unânime a opinião entre os trabalhadores de que não há assistência de vida da empresa quando situações como essas ocorrem. Um trabalhador que conversou com nossa equipe mostrou um de seus dedos da mão esquerda cortado e afirmou que nunca recebeu nenhum auxílio devido ao acidente.
É preciso salientar que com mais de dois milhões de toneladas de cana-de-açúcar colhidas em Sergipe foram produzidas 80 mil toneladas de açúcar e mais de um milhão de litros de etanol apenas em 2020. A cotação do açúcar já passa dos R$ 2,70 por quilo e a do etanol, R$ 4 por litro.
Isso significa dizer que, apenas com a produção de açúcar base, sem considerar o refino e a comercialização, as usinas privadas faturaram R$ 220 milhões à custa do suor do trabalho manual e árduo dos cortadores de cana, que não chegam a ganhar R$ 10 a cada mil quilos de cana cortada.
A usina privada Coruripe, por exemplo, que tem uma receita que ultrapassa os R$ 2 bilhões, lucrou R$ 338 milhões somente no ano passado com sua produção de açúcar e álcool, e seus lucros continuam aumentando.
Realidades como essa são comuns não só em Sergipe e nos canaviais, mas em todo o Brasil e nos mais diversos ramos da produção. Em nosso país, os chamados setores essenciais da economia ficam sob responsabilidade de empresas privadas, as quais buscam aumentar seus lucros cada vez mais, tornando impossível o pagamento de um valor justo dos salários aos trabalhadores e a garantia de direitos trabalhistas.