Governo brasileiro está decidido a destruir a única fábrica estatal de semicondutores da América latina, a CEITEC, condenando o país à condição de mero exportador de commodities e consumidor de produtos de alta-tecnologia.
Marcelo Tredinnick e Raul Bittencourt
Rio de Janeiro
BRASIL – Muito se fala sobre a desindustrialização do Brasil, como se fosse um fenômeno inexplicável, quando na verdade é fruto de escolhas econômicas e decisões políticas. Jair Bolsonaro, por exemplo, está decidido a destruir a única fábrica estatal de semicondutores da América latina, a brasileira CEITEC (Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada S.A.), ao assinar o Decreto nº 10.578, que visa dissolver a empresa.
Os semicondutores são essenciais para o mundo moderno, onde a tecnológica envolve uma diversidade de sistemas eletrônicos e aplicações revolucionárias de “Internet das Coisas”, que possibilitam a autonomia de máquinas por meio de inteligência artificial. É um mercado multibilionário em constante crescimento, que deve gerar lucros de mais de US$ 600 bilhões nos próximos quatro anos.
É importante dizer que a indústria de semicondutores se utiliza das chamadas “terras raras”, minerais raros, dos quais o Brasil é exportador. Em sentido contrário à política do governo brasileiro, que aniquila a produção nacional, a China, por exemplo, está investindo US$ 1,4 trilhão em novas fábricas do setor. Ou seja, Bolsonaro quer um Brasil importador de tecnologia e exportador de produtos primários, reduzindo o país à condição medíocre de mero exportador de commodities e consumidor de produtos de alta-tecnologia.
O que é a CEITEC
A CEITEC é uma empresa pública vinculada ao MCTI. Inaugurada em 2008, atua no segmento de semicondutores e na fabricação de RFIDs de animais, smartcards, ASICs, dentre vários outros dispositivos importantes. Também atua em parceria com outras empresas para fabricar testes de Covid-19. Desde sua criação, já desenvolveu importantes tecnologias para o país, possui oito certificações internacionais, além de ter vinte depósitos de patentes no INPI, sendo, assim, uma referência nacional no setor.
Interesses obscuros
A produção de semicondutores é estratégica e de grande interesse no mercado mundial. É o terceiro produto mais comercializado no planeta, perdendo apenas para os automóveis e o petróleo. A “crise global dos semicondutores” foi gerada principalmente por dois fatores: 1) pela pandemia de Covid-19, que levou uma imensa parte das pessoas para o trabalho-remoto e impactou o lançamento de tecnologias mais avançadas, como o 5G, e 2) a briga comercial entre EUA e China, que restringiu a venda de chips entre os dois países, gerando estoques gigantescos do produto.
Esses estoques de chips de tecnologias avançadas e a consequente estagnação na produção de chips impactaram fortemente outras indústrias como a automobilística, a de eletrodomésticos e a de produtos eletrônicos (placas para computadores, televisores, smartphones, videogames, etc). Foi um verdadeiro efeito dominó da estagnação industrial, que piorou ainda mais a crise global do capitalismo, reduzindo de forma mais acentuada sua taxa de lucro em diversos setores.
Com a demanda mundial por semicondutores em alta, conforme apontam vários estudos de mercado, o que parecia ser apenas mais uma estupidez deste governo da morte, pode ser, na verdade, mais um esquema de favorecimento.
Neste mês de novembro, o ministro das Comunicações, Fábio Faria, se reuniu com o multibilionário Elon Musk, dono da Tesla e da Space X, para negociar a abertura de uma fábrica de semicondutores no Brasil. Dessa forma, fica claro que a ideia do governo Bolsonaro é destruir nossa indústria de semicondutores para, em seguida, oferecer (ou será vender?) vantagens ao mega empresário.
Bolsonaro e Guedes vendem o Brasil, tal qual uma liquidação de saldo de balanço, em um cenário no qual o banco BTG Pactual, de André Esteves, aliado da dupla nefasta, é um dos principais compradores, servindo de intermediário para “investidores” estrangeiros. O falso nacionalismo da direita fascista promove o desmonte da ciência e tecnologia made in Brasil para atrair empresas estrangeiras que enviam seus lucros para offshores, deixando o país cada vez mais dependente e o povo cada vez mais pobre, à beira da morte pela miséria e fome.
Ainda há esperança
Os trabalhadores da CEITEC fizeram atos denunciando diversas irregularidades na extinção da estatal, o que resultou em duas decisões judiciais em janeiro deste ano. As ações provam que a liquidação da entidade seria ato potencialmente lesivo ao patrimônio público.
O Tribunal de Contas da União (TCU), por 4 votos a 3, suspendeu a liquidação da CEITEC, em 20 de outubro de 2021, exigindo que o Ministério da Economia se explique. Resta fazer pressão e derrotar mais esse ataque de Bolsonaro ao futuro do país.