Muitas estudantes mães tiveram que desistir de cursar suas disciplinas e/ou foram reprovadas pela piora nas condições de vida com a pandemia e o aumento da carga de trabalho doméstico e a insensibilidade das universidades.
Gabriela Alves e Priscila Carvalho
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SÃO PAULO – Com a suspensão das aulas presenciais no ensino básico e superior, as estudantes mães se tornaram ainda mais sobrecarregadas com o chamado trabalho doméstico. Muitas foram obrigadas a realizar o cuidado e se responsabilizar pela educação escolar dos filhos em tempo integral, além de conciliar suas próprias aulas online com o cuidado da casa. Tudo isso mantendo o trabalho formal – quando não foram demitidas – para sustentar a família.
Devido a soma desses fatores, muitas estudantes tiveram que desistir de cursar suas disciplinas e/ou foram reprovadas.
Apenas nos anos 2000 as mulheres passaram a ser maioria nas universidades. Mesmo esse marco tendo sido alcançado há 20 anos, ainda hoje as universidades não se adequaram ao ingresso das mulheres no ensino superior. O problema que mais enfrentamos é a permanência, principalmente se são estudantes mães.
Segundo dados da Andifes de 2018, 48,1% das estudantes têm filhas/os e 4,7% das alunas precisaram trancar sua matrícula na universidade devido à licença maternidade. Embora saibamos dessa realidade, ainda nos faltam dados oficiais por parte das universidades para ajudar a criar políticas de auxílio às estudantes.
No sistema capitalista atual pouco importa a situação em que as jovens vivem e se espera que, independentemente de suas especificidades e diferentes trajetórias, todas possuam o mesmo rendimento e dedicação aos estudos e trabalho. Isso acontece por parte dos governos, das reitorias, das coordenações de cursos, de professores(as) e do mercado de trabalho.
Mulheres pesquisadoras
Outro reflexo da desigualdade de gênero no meio acadêmico é o número de pesquisadoras ser muito inferior ao número de homens na mesma posição. As mulheres correspondem somente a 40% dos pesquisadores no Brasil e ainda hoje sofrem preconceito dentro desse espaço.
No contexto da pandemia, o número de publicações científicas realizadas por mulheres diminuiu consideravelmente enquanto as publicações feitas por homens aumentaram.
Esse fato se dá pelo alto número de responsabilidades atreladas às mulheres que ficam responsáveis por cuidar dos filhos e, por vezes, precisam cuidar de familiares mais velhos e/ou enfermos, tendo pouco tempo para se dedicar a outras tarefas.
Um estudo sobre os efeitos de raça, gênero e parentalidade na produção acadêmica durante a pandemia, realizado pela Parent Science com a participação de 9.970 alunos de pós-graduação, mostrou que as estudantes negras que possuem filhos foram as que mais tiveram dificuldade em continuar com suas pesquisas.
Da mesma forma, a doutoranda Carleane relatou, em uma matéria da Folha de São Paulo, que sua bolsa é a principal renda da família e faz malabarismo para pagar aluguel e outras despesas, como o financiamento da casa de sua mãe.
Essa é a realidade vivida por muitas outras mulheres acadêmicas.
A sobrecarga materna
Podemos afirmar que mulheres estudantes, mães, donas de casa e que fazem parte da força de trabalho formal ou informal têm que arcar com até quatro jornadas de trabalho, sendo três delas não remuneradas.
Pequenas ações diárias necessárias para sua sobrevivência e de seu(s) filho(s) muitas vezes não são notadas pela comunidade ao redor – a qual muitas vezes deixa de apoiar e acolher as mães nos espaços – ou pior, julgam uma mãe que precisa levar seu filho a ambientes que não estão preparados para receber crianças.
Na prática, as mulheres, além de responsáveis em tempo integral por todas as tarefas domésticas e do cuidado, educação, saúde e afeto dos filhos, ainda têm que se encarregar de todas as finanças e da manutenção da casa. Tudo isso levando em conta que as demissões foram muito maiores entre as mulheres no período de pandemia.
O problema está no capitalismo
As dificuldades vividas pelas estudantes mães são reflexo do sistema capitalista que tenta a todo momento nos convencer do contrário, alegando que conquistas reais, como as mulheres serem a maioria nas universidades, são uma consequência das melhorias deste sistema.
Entretanto, devemos entender que são consequência das lutas populares pelo acesso à moradia, saúde e educação.
Além disso, a conquista do acesso à universidade pelas mulheres, apesar de um grande avanço, não é sinônimo de equidade de gênero, pois ainda nos faltam mudanças estruturais que poderão garantir um acesso e a permanência plenos, populares e diversos à universidade pública.