No dia 24, os deputados reacionários da base do Governo Bolsonaro tentaram aprovar a cobrança de mensalidades nas universidades públicas. A PEC 206 apresentada pelos deputados federais Kim Kataguiri e General Peternelli, seria apresentada na Câmara, mas, após pressão dos estudantes, foi retirada de pauta. Para falar mais sobre o tema, o jornal A Verdade entrevistou Isis Mustafá, 25 anos, secretária-geral da União Nacional dos Estudantes (UNE) pelo Movimento Correnteza. Ela explica o que está em jogo com essa proposta e como podemos resolver os problemas da educação superior hoje.
REDAÇÃO SÃO PAULO
A Verdade –Quem será beneficiado com a cobrança de mensalidades?
Isis Mustafá – Primeiro é importante lembrar que, em 2017, o governo brasileiro encomendou um relatório ao Banco Mundial sobre os gastos públicos e uma das recomendações apontadas foi justamente a cobrança de mensalidades nas universidades públicas, alegando que ajustes fiscais seriam necessários para manter o Brasil bem localizado no compromisso com seus investidores, o capital financeiro. Então a PEC 206 não é novidade.
Tanto é que, quando o “Future-se”, foi apresentado, em 2019, ele também continha uma resolução de cobrança de mensalidade. Além disso, previa a cessão de prédios das instituições para iniciativa privada. Felizmente, este projeto foi derrotado pela mobilização das bases das universidades de norte a sul do país.
Segundo, devemos identificar porque os setores mais reacionários da política querem implementar a cobrança de mensalidade na universidade pública. Eles argumentam que a universidade pública é desigual, que existem muitas pessoas que, mesmo estudando em universidade pública, podem pagar uma mensalidade. Buscam ganhar a opinião popular com esse argumento mentiroso, como se a maioria dos estudantes das universidades públicas viessem de uma elite.
Você acha que essa desigualdade existe?
A última pesquisa do Andifes [Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior] constatou que hoje 70% dos estudantes das universidades federais são de baixa renda. Ou seja, são de famílias que têm de 0,5 a 1,5 salário mínimo de renda per capita.
Na verdade, o interesse da cobrança de mensalidades nas universidades públicas não é para combater desigualdades, mas sim para abrir mais espaço para o capital, para as grandes empresas nacionais e internacionais da educação. A cobrança de mensalidades é o abre-alas para a privatização total do ensino.
De que forma o desmonte da educação pública beneficia a iniciativa privada?
A partir do momento que se entrega o financiamento da universidade na mão do interesse privado, perdemos também a condição de responder aos interesses da sociedade, do ponto de vista da pesquisa, da extensão, da produção do conhecimento. Quem tem que financiar a universidade pública é o Estado.
Ao invés de cobrar mensalidades, a preocupação da Câmara Federal e do Governo deveria ser de fazer a auditoria da dívida pública para que se pare de gastar 40% do orçamento da União com o pagamento de juros e amortizações da dívida. Assim, não faltaria investimento nas universidades. Taxar as grandes fortunas e implementar impostos progressivos, isso sim reduziria a desigualdade.
A nossa luta é para criar mais vagas no ensino superior e acabar com as empresas privadas que lucram com a educação, porque, se o ensino superior público fosse universal, não haveria espaço para o setor privado extorquir a juventude e a classe trabalhadora com altas mensalidades.