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domingo, 22 de dezembro de 2024

A fotografia como arma na luta de classes

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Por ser uma linguagem universal e acessível a toda população, passando sua mensagem sobre impressões do real de forma irrefutável e carregada de sentimentos e força, de uma maneira impraticável ao texto escrito, a fotografia é uma arma revolucionária preciosa.

Reinilson Câmara e Lucas Marcelino


SÃO PAULO – A imagem tem o papel de construir, transformar e difundir no proletário um olhar de classe mostrando a beleza do nosso povo, a solidariedade de classe presente no cotidiano dos trabalhadores, o encanto do lugar onde vivemos e das pessoas que somos.

Historicamente a imagem é utilizada como ferramenta de propagação ideológica. No ano de 1926, o AIZ (Arbeiter-Illustrierte-Zeitung – Jornal Ilustrado Operário) lançou um concurso de fotografias operárias. No chamamento do concurso o jornal denunciava que as agências burguesas utilizavam nos meios de comunicação uma grande quantidade de fotos que serviam para induzir a lógica capitalista na população.

Logo, era necessário criar condições para difundir fotos que mostrassem a vida do povo sem passar pelos filtros dos interesses da classe dominante. O jornal propunha um concurso de fotografias seguindo os seguintes critérios:

1) Fotografias características do movimento revolucionário na classe operária;

2) Fotografias características da situação social da classe operária;

3) Fotografias que apresentassem bem a vida cotidiana do operário em todas as suas fases;

4) Fotografias do local de trabalho que permitissem reconhecer com nitidez as condições e o lugar de trabalho.

Por fim, o chamado concluía: “A tarefa proposta não é fácil e ninguém deverá subestimá-la. Trata-se de abrir os olhos e de ver os fatos cotidianos que são normalmente repelidos e considerados desinteressantes por todos, mas que, no entanto, são o dia a dia de centenas de milhares de pessoas. Trata-se de mostrar a beleza de seu próprio trabalho e do lugar onde é exercido, mas também de mostrar com coragem o horror da miséria social” (Lugon, 1997: 287).

O sucesso do concurso foi tão grande que, após alguns meses, fundou-se a Associação de Fotógrafos Operários, com o objetivo de fornecer formação técnica e política para novos fotógrafos amadores, oriundos do proletariado.

A ideia era dar instrumentos à classe operária para que, de seu seio, saíssem novos modelos de expressão e comunicação com orientação revolucionária.

Histórias como a da fundação da Associação de Fotógrafos Operários são importantes para que se desenvolva um olhar de classe na imagem, para isso, é preciso estimular certos modos de observar o mundo.

Atualmente, com a enxurrada de imagens produzidas pela grande mídia, o olhar da maior parte das pessoas é retratado de acordo com o imaginário burguês, que classifica o mundo através da noção de gosto.

Nesse imaginário de bom gosto são colocadas as grandes grifes, os estereótipos de beleza moldados pela grande burguesia, dentre outros elementos; e afastada de vista qualquer referência mais significativa da luta de classes, do cotidiano da população e do trabalhador. Sendo classificadas de mal gosto qualquer expressão da identidade do nosso povo, principalmente aquela relacionada à classe social.

As representações do proletariado através da lente do “bom gosto” funcionam como uma ferramenta de afirmação ainda maior da classe dominante, pois, através dessas lentes há um olhar superior respaldado pelos ideais de cultura, humanidade, arte e ciência dos ricos,  que dirige ao povo esse olhar como a um objeto inferiorizado, digno apenas de piedade e caridade.

Por isso, é necessário propormos uma produção de uma fotografia operária, marcada pela consciência de classe. A imagem e a arte devem ser tomadas como armas na luta de classes. A missão dos fotógrafos operários deve ser, então, construir e difundir no meio proletário esse olhar, mostrando a beleza do nosso povo, do lugar onde vivemos e de tudo o que consquistamos.

Walter Ballhause um fotógrafo operário

A DESESPERADA | Fotografia de Walter Ballhause, tirada em 1932, é um exemplo da capacidade de captar os sentimentos do povo (Foto: Reprodução/ Walter Ballhause).

Nascido em 1911, era filho de um sapateiro. Começou um curso técnico na área química, mas não o concluiu. Autodidata na fotografia, produziu uma grande documentação visual de cunho social dos últimos anos da República Alemã e do começo do nazismo.

Abordando temas dentro do dia a dia da classe operária como desemprego, mutilados da Primeira Guerra, alcoolismo, habitação, trabalho rural, fome, questões de gênero, família, tempo livre e infância.

Ballhause fez, por exemplo, uma documentação fotográfica abordando o desemprego, com grande enfoque nos retratos das pessoas montando uma coletânea de imagens do cotidiano de uma pessoa em situação de desemprego. Suas imagens mostram os rostos sem expectativa.

A busca por trabalho nos anúncios, a espera nas filas, o vazio nas casas, o andar sem rumo pelas ruas da cidade, o olhar que contempla vitrines sem ter condições de comprar. Registrou ainda trabalhos informais, como os de trabalhadores na função “posso ajudar” de prontidão na frente de uma loja.

A história de Ballhause e da Associação de Fotógrafos Operários nos remete também ao livro Homens e coisas do Partido Comunista, escrito por Jorge Amado e onde encontramos alguns capítulos dedicados à história do jornal “A Classe Operária”.

Jorge Amado relata que os militantes responsáveis pela impressão do jornal em gráficas clandestinas não eram jornalistas ou tipógrafos, mas aprendiam a ser e se desdobravam para garantir que o jornal chegasse às mãos dos trabalhadores e trabalhadoras.

A história de luta pela imprensa e comunicação populares é recheada de pequenas faíscas que formam rastros de luz iluminando o olhar do nosso povo para a nossa realidade no presente e nossas aspirações no futuro. Assim como o flash das câmeras dos fotógrafos e fotógrafas ao registrar as imagens que ilustram as páginas do A Verdade revelando aquilo que mil palavras não seriam capazes de dizer.

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