Nas últimas semanas a população brasileira se deparou com uma grande quantidade de greves e manifestações populares em vários Estados, direcionadas especialmente à defesa do serviço público gratuito e de qualidade. Tantas mobilizações não são mera coincidência, mas sim a consequência de ataques em série que alguns governantes vêm promovendo contra a administração pública.
Luiz Cláudio de Paiva Jr | MLC-RS
TRABALHADORES – Em São Paulo, trabalhadores e trabalhadoras do Metrô, da Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) e da SABESP decidiram cruzar os braços em greve unificada no dia 03/10 contra o plano de privatizações do governador Tarcísio Freitas (Republicanos). No mesmo dia, servidores das três esferas de Poder também fizeram atos em todo o país contra o projeto de Reforma Administrativa (PEC 32).
Em Porto Alegre, trabalhadores paralisaram no dia do leilão de privatização da Carris, empresa centenária de ônibus que iniciou suas atividades em 1872. Os trabalhadores visavam pressionar o governo a desistir da venda das últimas 21 linhas ainda sob gestão municipal, o que inclui as ações da companhia, terrenos e ônibus e representam 22% de todo o sistema de transporte público da cidade.
Privatização leva à precarização
A lógica de gestão de um negócio privado é colocar os lucros em primeiro plano, enquanto o atendimento das necessidades da população é visto como simples meio para acumular capital.
Diante disso, são conhecidos os casos de empresas públicas privatizadas que se tornam grandes fontes de reclamações pelos maus serviços prestados, péssimo atendimento ao público e altas tarifas, como é as empresas de telefonia privatizadas nos anos 1990, que só entre 1998 e 2003 aumentaram as tarifas em 30% acima da inflação, fazendo o povo brasileiro pagar pela telefonia mais cara do mundo.
Em Belo Horizonte, após a privatização do serviço metroviário, as passagens se tornaram as mais caras do Brasil (R$5,30) e centenas de trabalhadores foram demitidos.
A concessionária fluminense Light Energia, privatizada em 1991, enviou um comunicado à ANEEL (Agência Nacional de Energia Elétrica) no início do ano alegando falta de caixa para manter as operações no RJ e pedindo autorização para aumentar a tarifa ou precisaria emprestar dinheiro do governo para não quebrar e abandonar o serviço.
Mídia burguesa contra os grevistas
Nesse momento, os grandes capitalistas mobilizam seus meios de comunicação de massas para promover uma campanha de deslegitimação dos movimentos grevistas e convencer a população a se opor às paralisações.
Argumentam esses formadores de opinião que as greves recentes são prejudiciais à população e que os grevistas devem-se limitar a pautas puramente trabalhistas, não políticas. Entretanto, a própria Constituição Federal prevê o direito de greve sem restrições desse tipo, deixando claro que compete aos trabalhadores decidir quais interesses devem ser defendidos por esse importante instrumento de luta social (CF/88, art. 9º).
Ainda assim, os tribunais da Justiça do Trabalho costumam decidir contra os trabalhadores que paralisam em razão de pautas políticas, instituindo assim uma limitação inexistente na norma constitucional e desvirtuando a função própria do Direito do Trabalho, o qual acolhe o princípio jurídico da proteção ao trabalhador diante da sua posição econômica inferior à do patrão. Ou seja, a justiça burguesa usa o processo trabalhista para negar o próprio direito e reprimir os movimentos grevistas.
Greve política é legítima
Contudo, antes de assumirem uma posição nas relações de trabalho, os trabalhadores são cidadãos e sofrem, junto com suas famílias, os efeitos das políticas econômicas e sociais adotadas pelas autoridades legislativas e executivas em níveis municipal, estadual e federal. Tais autoridades, na ampla maioria dos casos, não são sensíveis a simples petições e reclamações públicas, bem como a Justiça, como visto, é parte do aparelho estatal organizado pela burguesia para proteger seus interesses.
Na luta de classes, os capitalistas detêm o controle das fábricas, terras, bancos, além de possuírem um capital gigantesco para financiar campanhas eleitorais e formar bancadas parlamentares a seu favor, como a Frente Parlamentar da Agropecuária – FPA (ou bancada ruralista), que conta com 300 deputados federais em defesa dos interesses dos latifundiários. A classe trabalhadora, por sua vez, só tem sua capacidade de organização e mobilização social para fazer valer seus interesses.
Historicamente, os direitos sociais, como férias e descanso semanal remunerados, licença maternidade, reduções na jornada de trabalho e outros, foram conquistados com muita luta política, cujo instrumento principal de mobilização social e pressão sobre o poder público foi a greve.
Portanto, todo apoio deve ser dado aos trabalhadores grevistas nas suas reivindicações políticas, que devem contemplar pautas do interesse de toda a sociedade, como a revogação das contrarreformas neoliberais (trabalhista, previdenciária e do ensino médio), questões ambientais, promoção de reformas estruturais econômicas, para, por exemplo, combater a injustiça do sistema tributário, que cobra mais impostos dos trabalhadores do que dos burgueses. A greve, mais do que um direito posto, é uma ferramenta da luta de massas que precisa ser ampliada.
Matéria publicada na edição nº 281 do Jornal A Verdade.