Falta de cobertura de creches e precariedade na educação infantil em Pernambuco

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TCE-PE fiscaliza 2.500 unidades de educação infantil em Pernambuco e constata déficit de vagas, problemas estruturais e pedagógicos e desigualdade entre redes pública e privada.

Jesse Lisboa | Redação PE


A educação infantil é um direito fundamental das crianças e um dever do Estado, que deve garantir a oferta de vagas em creches e pré-escolas públicas, com qualidade e segurança. No entanto, uma operação de fiscalização do Tribunal de Contas do Estado (TCE-PE) revelou que a situação da educação infantil em Pernambuco é alarmante, com graves problemas estruturais, pedagógicos e de cobertura.

A operação, realizada entre outubro e novembro de 2023, visitou 2.500 unidades de ensino infantil em todos os 184 municípios pernambucanos, com 92 auditores do TCE. Os resultados, divulgados no dia 8 de novembro, mostraram que a nota geral do estado foi de 59,1 em uma escala de 0 a 100, sendo que nenhum município atingiu os níveis de bom ou desejável.

Além disso, a operação constatou que há um déficit de 172,7 mil vagas em creches e de 13,5 mil vagas em pré-escolas, considerando as metas do Plano Nacional de Educação (PNE). A cobertura em creches é de apenas 20%, enquanto a de pré-escolas é de 86%. Os municípios com as piores coberturas de creche são São José do Belmonte (2,68%), Angelim (4,5%) e Moreno (4,78%), e os com as piores de pré-escola são Ferreiros (56,2%), Manari (57,5%) e São Benedito do Sul (59,6%).

Irregularidade na Escola Municipal Zulima Pinho Alves, em Paulista. Foto: TCE-PE

O munícipio de investigação por parte do jornal A Verdade foi Paulista, em que Williany de Sena, moradora do bairro de Jardim Paulista nos relatou a situação do município. Segundo o TCE-PE, Paulista sofre com apenas 14% do total de cobertura de creches, isto é, há mais de 18 mil crianças com até 3 anos de idade, e apenas 2.630 estão matriculadas em creches. Destas, 83% estão matriculadas em creches de rede privada. 

A Verdade Em Paulista, há uma cobertura de apenas 14% do atendimento com creches. Na sua opinião, como a limitada cobertura de creches em seu município tem afetado suas opções para o cuidado e educação de seu filho?

Williany de Sena Afeta de forma muito ruim essa falta de políticas públicas da Prefeitura para ajudar a gente. É como se tivessem abandonado as famílias que precisam disso. Paulista é enorme e não tem o mínimo de cuidado com isso, não tem tudo que precisa para uma educação boa. Sobre a questão do cuidado, as creches que eu tentei ir não tinham preparação para caso a criança passasse mal, por exemplo. Pôr uma creche para o bairro é muito mais do que só colocar professor lá, é garantir a educação, a saúde, a alimentação, a segurança e o desenvolvimento social dela e da família.

Quais desafios específicos você enfrentou ao procurar uma vaga em creches para seu filho?

Antes de tudo, é difícil saber onde ficam as creches da Prefeitura, e quando abrem as vagas. Quando acha, é preciso ver se é um turno apenas ou integral (o que é muito raro, mas é necessário para muitas mães). Por fim, o maior desafio é conseguir uma vaga nas creches.

Você poderia compartilhar experiências pessoais sobre a qualidade das creches que encontrou durante sua busca?

Muitas creches não possuem tantos pedagogos quanto precisam, acontece de uma pessoa apenas ter que supervisionar dez crianças. A alimentação também não é das melhores, a própria estrutura também, pois não há ar condicionado. As creches que eu fui não tinham nem cama, lençol, nem travesseiro para hora da soneca. 

Quais mudanças ou melhorias você gostaria de ver nas políticas públicas relacionadas à oferta de creches para melhor atender às necessidades das famílias?

Se houvessem vagas pra mais gente já ajudaria. Era bom garantia de alimentação melhor para as crianças, porque às vezes não tem um almoço de verdade, um lanche bom. E a questão da localidade, pois Paulista é muito grande e não é todo bairro que tem creche municipal. Como que eu vou atravessar 2 ou 3 bairros pra deixar a criança? Porque eu não consigo pagar transporte pra isso. As creches poderiam ter algum projeto conjunto com os postos de saúde para garantir a saúde das crianças, porque uma mãe e um pai que trabalham 10h por dia não tem tempo pra levar os filhos nesses lugares, já que os postinhos fecham cedo. Creche não tem que ser só um lugar de deixar a criança e pegar depois, pode ser algo para ajudar a comunidade, incentivar o esporte com escolinhas, aulas, música, etc.

Como a falta de vagas em creches impactou não apenas sua vida, mas também a vida de outras mães na comunidade?

Eu posso dizer que eu tive uma rede de apoio para me ajudar, tive minha mãe, meu pai, meu irmão. Mas e quem não tem isso? Tem mãe q tá sozinha com os filhos no mundo, ou trabalha ou cuida deles. Tem quem não consegue sustentar a casa, se não tiver ninguém para ficar com o filho. Quem não consegue terminar a escola, a faculdade. Quem ganha com isso? Quem ganha com as mães sem ter como se manter e manter a família? É triste ver criança tendo que “virar adulto” ainda jovem porque precisa cuidar dos mais novos enquanto os pais estão trabalhando.