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quarta-feira, 9 de outubro de 2024

Governo Federal privatiza presídio no RS

No início de outubro, ocorreu um leilão para a construção de um presídio privado, que ainda será construído no Rio Grande do Sul. A empresa Soluções Serviços Terceirizados, que foi a única a participar do leilão, construirá e administrará o presídio da cidade de Erechim. A empresa é a mesma que foi punida por falta de higiene no preparo das quentinhas fornecidas aos presidiários do Rio de Janeiro.

Bela dos Santos, Paraíba e Jorge Ferreira, São Paulo


BRASIL – O modelo adotado para o novo presídio é o de Parceria Público-Privada (PPP), com financiamento de R$ 150 milhões do BNDS, isenções fiscais e o adicional de R$ 233,00 por dia para cada preso. O valor estimado para a concessão de 30 anos é em torno de R$ 2,5 bilhões. 

A iniciativa do Governo Federal de transferir recursos públicos para o setor privado, além de escancarar a lógica do liberalismo em lucrar até mesmo com a privação da liberdade do povo, ignora também as diversas denúncias de violação sistemática dos direitos humanos no sistema penitenciário, em especial por parte das empresas que já gerenciam ou prestam serviços para outras cadeias no Brasil.

“Eu estive numa unidade prisional privatizada da Bahia e tudo é ruim dentro da unidade. Os funcionários contratados estão com baixos salários e existe uma rotatividade grande porque não suportam o ambiente, o que também prejudica a pessoa privada de liberdade. Os presos não tinham banheiro, faziam cocô dentro de um saco plástico, as comidas eram da pior qualidade possível. A pessoa privada de liberdade é tratada como uma fruta podre, como uma mercadoria”, diz Vera Lúcia Dalzotto, integrante da Coordenação Nacional da Pastoral Carcerária, que atua no Rio Grande do Sul. Ela também critica a criação do presídio privado em Erechim.

País que mais prende no mundo

Nos EUA, mesmo com a taxa de criminalidade caindo, as penitenciárias só continuam lotando. Isso porque as penitenciárias privadas incentivam o encarceramento em massa, pois a empresa administradora ganha do Estado pela quantidade de presos. Assim, quanto mais presos, maior o lucro.

Várias empresas nos EUA fizeram seus presidiários trabalharem forçadamente. Como foi denunciado pelo documentário A 13ª emenda, os Estados Unidos têm mais negros na prisão hoje do que escravizados no século XIX.

As autoras Eve Goldberg e Linda Evans expõem em The prison industrial complex and the global economy a realidade dos presidiários e do complexo industrial-prisional. “Para as empresas privadas, a mão de obra prisional é um pote de ouro. Sem greves. Sem organização sindical. Sem plano de saúde, seguro-desemprego ou indenização em caso de acidente. Sem barreiras linguísticas, como em países estrangeiros. Novas prisões estão sendo construídas nos milhares de hectares sinistros de fábricas do lado de dentro dos muros. Os prisioneiros fazem processamento de dados para a Chevron, fazem reservas por telefone para a TWA, criam porcos, removem esterco, fabricam placas de circuito, limusines, colchões d’água e lingerie para a Victoria’s Secret, tudo por uma fração do custo do ‘trabalho livre’”.

O sistema carcerário 

O Brasil tem a terceira maior população carcerária do mundo, perdendo apenas para China e Estados Unidos: cerca de 338 presos para cada 100 mil habitantes. O Sistema de Informações Estatísticas do Sistema Penitenciário Brasileiro (Infopen) aponta que esse número de pessoas presas excede em quase 40% o total de vagas disponíveis no sistema penitenciário.

A criação de penitenciária privada só aumenta o lucro dos grandes empresários e em nada contribui com a desencarceramento da população. Pelo contrário, num país em que a maioria dos crimes são ligados à desigualdade social, e que a Polícia e todo o sistema criminal são profundamente racistas, o resultado não poderá ser outro: o aumento do número de pessoas encarceradas. 

No Brasil, 53,63% da população é preta ou parda no Brasil, e 61,7% da população carcerária é negra ou parda. Crianças e adolescentes pretos têm duas vezes mais chances de serem parados e revistados por policiais em São Paulo. Os dados compõem o levantamento do Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo).

Matéria publicada na edição nº 284 do Jornal A Verdade

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