Desde 2014, Cuiabá e Várzea Grande sofrem com a inacabada obra do VLT. Isso já virou piada para a população e ainda é considerada por muitos políticos o futuro do transporte urbano da capital. Na prática o que ocorre é que o povo continua sem transporte público de qualidade e submetidos aos prejuízos de obras que nunca são concluídas, enquanto o empresariado enche os bolsos.
Arthur Piva | Cuiabá
BRASIL – A Copa do Mundo de Futebol no Brasil deu início a inúmeras obras faraônicas espalhadas pelas cidades sedes dos jogos de futebol. Disfarçadas de melhorias para a população, essas obras superfaturadas, construídas para “inglês ver”, só serviram para encher os bolsos dos grandes empresários e dos políticos responsáveis pelos processos de licitação. 10 anos depois, muitas dessas obras permanecem inacabadas, inutilizadas e caindo aos pedaços. Um dos casos mais emblemáticos foi a construção do Veículo Leve sobre Trilhos (VLT) na cidade de Cuiabá, capital do Mato Grosso.
O VLT prometia ligar as cidades de Cuiabá e Várzea Grande, transportando até 160 mil pessoas por dia. Entretanto, essa promessa de transporte público de qualidade não passou de uma enganação. Na realidade, o VLT consumiu até o presente momento 1 bilhão de reais dos cofres do estado, dinheiro que poderia servir para efetivar as melhorias na vida dos trabalhadores. Sem nunca ter visto a luz do dia, os 280 vagões importados da Espanha permanecem na garagem e dos 22 km de trilhos prometidos, foram construídos apenas 6 km.
As obras estavam paradas desde 2014, após denúncias do Ministério Público sobre corrupção e desvio de verba. Esse processo resultou na prisão de Silval Barbosa, o governador de Mato Grosso na época. Em 2017, na gestão do governador Pedro Taques, ocorreu o rompimento de forma unilateral o contrato com o consórcio do VLT, alegando corrupção e cancelando de forma definitiva as obras.
Porém, o fim das obras só trouxe mais dores de cabeça para os moradores da baixada cuiabana. Se, durante sua implementação, o VLT já causou muitos danos, como a destruição de mais de 1.600 árvores da capital, no seu desmonte não seria diferente. A ideia do atual Governador Mauro Mendes foi transformar as linhas do VLT em corredores para o novo BRT (Bus Rapid Transit). Só nessa “transformação”, já foram desperdiçados 89 milhões de reais em ferro e borracha dos trilhos, importados da Polônia e da Itália, respectivamente.
Além disso, hoje, Várzea Grande, a segunda maior cidade do estado, sofre com obras ininterruptas que muitas vezes interditam mais da metade da principal avenida da cidade, a Avenida da FEB, que liga Cuiabá ao Aeroporto Internacional Marechal Rondon.
“As obras do VLT sempre afetaram minha mobilidade, desde o seu início lá em 2012 trabalhava no bairro Construmat, a avenida da FEB era na ocasião a principal via de trajeto casa/trabalho, essa via foi muito afetada. Hoje embora eu trabalhe no centro de Várzea Grande, estudo no centro de Cuiabá e desde 2022 sofro na mesma avenida da FEB, já que o modal de transporte passará por essa via, mas para que isso ocorra é necessário fazer obras, sinto-me prejudicada e desrespeitada já se passaram mais de 10 anos e nada além de transtorno para a população.” Afirma Keila, merendeira da rede publica de ensino de Várzea Grande.
O BRT é a solução?
A solução encontrada pelos políticos, em principal o atual governador Mauro Mendes (União Brasil) vai resolver o problema? A implementação do Transporte Rápido por Ônibus, mais conhecido por sua sigla em inglês BRT, promete ser a realização do sonho da população, por isso precisamos entender melhor esse caminho.
Pensado para substituir o VLT e conectar as duas cidades de Cuiabá e Várzea Grande, o BRT já nasceu com problemas. Só o embate entre o governador Mauro Mendes e o atual prefeito de Cuiabá, Emanuel Pinheiro, já gerou questões. O prefeito da capital já acionou tanto o Tribunal de Contas da União (TCU), quanto o Tribunal de Contas estadual (TCE-MT) para barrar as obras do BRT.
“Pensando numa vertente mais sustentável, nós sabemos que a natureza é a matéria-prima de todos esses materiais que vão ser utilizados na execução do serviço. E a natureza foi explorada, então, boa parte dos materiais acabaram sendo desperdiçados, porque não houve obra. Também houve um não aproveitamento daquela exploração, ou seja, houve uma degradação ambiental da qual não se justificou porque os materiais não foram utilizados, eles se perderam, muita coisa ficou aí a céu aberto, degradou, intemperismo agiu, enfim, se for mesmo assim ter o VLT de novo, ou seja, mais exploração ambiental, mais aquisição de recursos, isso tudo causa um impacto na natureza e parece que ninguém está se importando com isso.” Afirma Matheus Angelo, engenheiro florestal e morador de Cuiabá sobre as obras do VLT.
Outra denúncia feita são das possíveis irregularidades na licitação. Enquanto ficam nessa disputa sem justificativa, o transporte público de Cuiabá sofre a muitos anos com a intitulada “máfia do transporte”, em que as três empresas responsáveis pelo setor fazem complôs para alterar as planilhas de custo e “inflar” o valor da tarifa, usando táticas, como a elevação artificial do preço de insumos, por exemplo do diesel e dos pneus, para poderem aumentar o valor recebido do estado. Essas empresas, Integração Transporte, Caribus Transporte e Serviços e Pantanal Transportes, que atuam na cidade a mais de 17 anos, atuaram na proposta de licitação do BRT.
Por um transporte público estatal
Essa discussão política entre BRT e VLT mostra que, tanto o governo do estado, quanto as lideranças municipais, não escutam os anseios da população trabalhadora que necessita de um transporte público de qualidade, gratuito e que atenda a toda a população. Ambos os projetos podem, como já foi feito em outros lugares do Brasil e do mundo, ser implementados com sucesso. Entretanto, isso só vai acontecer quando o transporte público não for controlado por um grupo pequeno de empresários que só têm interesse no lucro.
“Para resolver a questão do transporte público defendemos que o nosso direito de ir e vir não seja tratado como uma mercadoria. Não podemos colocar esse direito nas mãos dos empresários, que querem sempre lucrar e nunca garantir uma mobilidade urbana boa de fato. Temos que pensar numa empresa pública de transporte urbano” afirma Samara Martins, vice presidenta nacional da Unidade Popular (UP). Isso significa, que o transporte público precisa ser do povo!
A UP defende a estatização de todos os meios de transporte coletivo, para que deixem de servir ao bolso de grandes empresários, passando de meios de locomoção caros, de baixa qualidades, lentos e que não atendem toda a população, para tornarem-se um serviço que tem como objetivo principal a mobilidade urbana do povo.