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quinta-feira, 21 de novembro de 2024

Defender o direito de greve

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A greve é um direito fundamental dos trabalhadores assegurado pela Constituição Federal de 1988. O fato de esse direito constar no texto constitucional se deve aos longos anos de lutas desenvolvidas pela classe trabalhadora.

Thiago Santos | Presidente da UP (PE)


SOCIEDADE – A greve é um direito fundamental dos trabalhadores assegurado pela Constituição Federal de 1988. É um direito que está na mesma lista onde encontramos a liberdade sindical e a negociação coletiva. Segundo a Constituição, cabe unicamente aos trabalhadores decidir sobre a sua deflagração.

O fato de esse direito constar no texto constitucional se deve aos longos anos de lutas desenvolvidas pela classe trabalhadora. Em julho de 1917, um movimento iniciado por empregados da indústria têxtil de São Paulo culminou com a primeira Greve Geral em nosso país. Graças à mobilização, empresários, Secretaria de Segurança Pública e o Comitê de Defesa Proletária firmaram um acordo, comprometendo-se em não fazer retaliações aos operários grevistas, além de aumentar os salários, libertar os operários detidos e garantir o direito de reunião.

Também sob a ditadura militar, houve greves históricas dos trabalhadores. Destacaram-se especialmente a greve de maio de 1978 nas fábricas de caminhões da Saab-Scania, em São Bernardo do Campo; em 1979, nas cidades de Osasco e Guarulhos, envolvendo metalúrgicos, professores, bancários, funcionários públicos, jornalistas, operários da construção civil, médicos, agentes de limpeza e outras categorias; e em 1980, novamente em São Bernardo, a greve dos metalúrgicos que durou 41 dias e mobilizou 300 mil operários, contando com amplo apoio popular.

Patrões não podem perseguir grevistas

Com a previsão do Direito de Greve na Constituição, classifica-se como prática antissindical a conduta do empregador que ameaça com demissões os empregados durante as negociações. Não pode haver dispensa de trabalhadoras e trabalhadores por participarem de movimento grevista. Outras represálias aos trabalhadores que participam das atividades do sindicato também são consideradas práticas antissindicais e devem ser denunciados e combatidos pelas entidades classistas.

“Nas 24 Procuradorias Regionais do Trabalho e na Procuradoria-Geral do Trabalho, são frequentes investigações e intervenções judiciais relacionadas à livre filiação sindical, à negociação coletiva e ao direito de greve”, é o que relatam os  procuradores do Trabalho Alberto Emiliano Oliveira Neto, Bernardo Leoncio Moura Coelho e João Hilário Valentin no Manual de Atuação sobre Práticas Antissindicais da Comissão Nacional de Liberdade Sindical (Conalis), do Ministério Público do Trabalho, publicado em 2021.

Segundo o estudo do Ministério Público do Trabalho, “a repressão atinge não só as entidades sindicais, mas, particularmente, os trabalhadores individualmente (…). É vedado ao empregador adotar meios para constranger o empregado ao comparecimento ao trabalho, bem como capazes de frustrar a divulgação do movimento grevista”. Isso está previsto na Lei n. 7.783/1989 (artigo 6º, § 2.º), a chamada Lei de Greve.

Aumentam as greves, aumenta a judicialização

Em 2022, foram realizadas 376 greves e a Justiça interveio, de alguma forma, em 47,3% dos casos. Só no primeiro semestre de 2023, 173 casos foram registrados, entre os quais, o Poder Judiciário atuou em 41% das vezes. Os trabalhadores têm recorrido mais à greve, enquanto isso, cresce, como resposta patronal, a intervenção da Justiça nos movimentos grevistas. Para efeito de comparação, em 2004 – portanto, há 20 anos –, ocorreram 180 greves, sendo que em 32,8% houve algum tipo de intervenção do Judiciário. Os dados são dos boletins do Dieese. 

Segundo o Portal Estatísticas do Poder Judiciário, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), entre 2022 e 2024, foram julgados 667 Dissídios Coletivos de greve. Na Justiça Estadual, o primeiro lugar ficou com o TJSP (São Paulo), com 30 casos, seguido de TJPI (Piauí), com 26 casos e TJSC (Santa Catarina), com 14 casos.

Decisões judiciais contra os trabalhadores

Apesar de consolidado ao longo dos anos como legítimo instrumento de reivindicação de direitos trabalhistas, aumento salarial e melhoria das condições de trabalho, e de constar no próprio texto constitucional, nem sempre essa intervenção da Justiça ajuda os trabalhadores.  A categoria das enfermeiras e enfermeiros de Pernambuco, em luta pelo cumprimento do piso salarial e que desenvolveu várias greves também por reivindicações salariais, ilustra como a questão tem sido tradada na maior parte das vezes. 

“Tivemos várias experiências negativas com a Justiça. Praticamente todas as vezes que deflagramos greve ou paralisação, o patronal ou governo entraram na Justiça. Na esmagadora maioria, a Justiça decide pela ‘ilegalidade’ do movimento. Durante o período que estou à frente do Sindicato, só em uma oportunidade a liminar não decretou a ilegalidade da nossa greve, mas, por outro lado, determinou que mantivéssemos 70% dos profissionais trabalhando, o que, na prática, esvazia o movimento grevista”, declarou Ludmila Outtes, presidente do Sindicato dos Enfermeiros de Pernambuco (Seepe).

E mais: apesar de serem comuns longas esperas por decisões judiciais em reclamações trabalhistas, segundo Ludmila, quando se trata de reprimir o direito de greve “as liminares saem antes de o movimento começar, inclusive, colocando multas altíssimas em caso de descumprimento: R$ 50 mil, R$ 100 mil por dia. Apagam a Lei de Greve, que garante esse direito ao trabalhador, sem ao menos ouvir nosso lado”.

Curioso é observar que, em 1889, tratando sobre o tema das greves, Lênin escreveu: “O operário começa a entender que as leis são adotadas em benefício exclusivo dos ricos, que também os funcionários defendem os interesses dos ricos, que se tapa a boca do povo trabalhador e não se permite que ele exprima suas necessidades” (V. I. Lênin, Sobre as Greves).

É preciso lembrar que houve um tempo no nosso país que promover greves era considerado caso de polícia, mas houve quem resistisse. Por isso, devemos seguir fazendo valer todo o esforço levado a cabo pelas gerações passadas do movimento operário e sindical brasileiro, que, com muito esforço, firmeza, dedicação e coragem, colocando tudo o que tinham a perder, foram à luta para assegurar esse direito e ainda obtiveram importantes conquistas, como a limitação da jornada de trabalho, férias remuneradas, 13º salário, licença maternidade e salário-família. Acontece que, para a classe trabalhadora fazer valer o seu direito no capitalismo é preciso ir à luta!

Matéria publicada na edição nº290 do Jornal A Verdade.

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