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segunda-feira, 1 de julho de 2024

O que é e o que causa o aquecimento global

Neste mês, começamos a acompanhar o desastre climático que vem acontecendo no Estado do Rio Grande do Sul. Chuvas fortíssimas, levando a enchentes e inundações em 447 municípios, afetando 1,5 milhão de pessoas. O aquecimento global e suas consequentes alterações climáticas são a causa primária do problema.

Gildo Bastos* | Florianópolis


SOCIEDADE – No início do mês de maio de 2024, começamos a acompanhar a tragédia climática que vem acontecendo no Estado do Rio Grande do Sul. Chuvas fortíssimas, levando a enchentes e inundações em 447 municípios, afetaram 1,5 milhão de pessoas. Desabrigo, destruição de patrimônio público e privado, desabastecimento de alimentos e água, propagação de doenças e a situação extrema da morte de alguns habitantes são alguns dos efeitos dessa emergência climática.

Podemos apontar diversos fatos que atuaram para o agravamento dos problemas a que a população gaúcha foi submetida: demora dos governos municipais e estadual na pronta resposta à emergência; falhas no funcionamento de equipamentos públicos para o enfrentamento deste tipo de evento; destruição ambiental causada pelo desmatamento, assoreamento dos rios e perda das matas ciliares; flexibilização da legislação de controle ambiental; construções em áreas extremamente suscetíveis a inundações e chuvas fortes, como encostas e margens de rios.

O aquecimento global e suas consequentes alterações climáticas são a causa primária do problema. Pesquisadores nesta área do conhecimento humano não cansam de apontar que haverá, cada vez mais, a ocorrência de eventos climáticos extremos causados pelas mudanças climáticas: inundação de cidades, principalmente no litoral; perda de produção agropecuária, levando à fome; redução no estoque de água disponível para consumo; perda massiva da biodiversidade; aumento de epidemias; grandes migrações humanas. Todas essas transformações levariam a cenários adversos, que iriam desde uma Terra distópica e o fim da sociedade humana como a conhecemos até a possível extinção da espécie humana.

Efeito estufa

Mas o que seria o aquecimento global? Como é causado? Estaria relacionado às atividades humanas? Poderia ser evitado? São perguntas que fazemos e que, cada vez mais, interessam a mais pessoas.

Inicialmente é preciso conceituar o que é efeito estufa. Trata-se de um fenômeno planetário natural e está diretamente relacionado à presença dos gases de efeito estufa na atmosfera terrestre. Esses gases permitem que a energia luminosa do Sol alcance a superfície terrestre e os oceanos, aquecendo-os. O calor resultante é, parcialmente, irradiado de volta para o espaço. Nesse momento, os gases de efeito estufa impedem a passagem da energia calorífica, que se mantém próxima à superfície terrestre. Este processo é importantíssimo para manter a temperatura média da Terra em valores que permitem o desenvolvimento da vida em nosso planeta.

Os principais gases de efeito estufa presentes na atmosfera terrestre são: o dióxido de carbono (CO2), produzido pela queima de combustíveis fósseis, incêndios florestais e desmatamento; o metano (CH4), produzido em lixões, reservatórios de usinas hidroelétricas, mineração e agropecuária; e o óxido nitros (N20), produzido por uso de fertilizantes, e algumas atividades industriais. O aumento nas emissões e na quantidade destes gases na atmosfera, originados principalmente por atividades humanas, é o que causa o aquecimento global, que conduz ao aumento da temperatura média do ar e dos oceanos, levando a alterações climáticas e aos problemas decorrentes.

Podemos fazer algo? 

Já aumentamos a temperatura média do planeta 1,1°C acima daquela encontrada na época pré-industrial (anterior à Revolução Industrial, meados do século 18). Para evitar um aumento significativo dos impactos causados pelo aquecimento global, seria necessário atingirmos a meta de não ultrapassar 1,5°C acima da temperatura de referência. Segundo o último relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), publicado em 2023, para conseguirmos atingir essa meta, seria necessário que o pico das emissões de gases de efeito estufa acontecesse até 2025. Após este ano, teria que se iniciar uma redução de 43% até 2030, de 60% até 2035, de 70% até 2040 e zerando as emissões até 2050. Conseguiremos isso? Infelizmente já não será possível. Conforme entrevista do professor Carlos Nobre, um dos mais destacados climatologistas brasileiros, disponível no site da Academia Brasileira de Ciências, a temperatura de 1,5°C foi atingida ainda em 2023.

E se a temperatura continuar aumentando, o que será de nós? Se os aumentos forem muito elevados podemos chegar até a extinção da espécie humana. Mas certamente a sociedade humana, tal qual a conhecemos, não conseguirá ser mantida e essa desagregação social, como uma foto do que já acontece hoje em dia, afetará mais as populações mais pobres e os países periféricos.

A nossa espécie (Homo sapiens) surgiu há mais ou menos 200 mil anos. As condições climáticas nesta época não eram as mais satisfatórias e os homens e mulheres primitivos viviam de forma nômade, sem o desenvolvimento da agricultura e sem a formação de grandes núcleos populacionais. Há aproximadamente 10 mil anos, a Terra entrou na época geológica conhecida como Holoceno e o clima se tornou mais ameno e mais estável, sem apresentar grandes variações entre as temperaturas mais frias e as mais quentes. Isso permitiu que os homens desenvolvessem a agricultura e passassem a construir povoações maiores, evoluindo até a sociedade atual.

No início dos anos 2000, começou a ser proposto por vários cientistas que a Terra teria entrado em outra época geológica. Esta época, nomeada como Antropoceno, teria as atividades humanas como principal agente de modificação das características ecológicas do nosso planeta. O início do Antropoceno ainda é controverso, com alguns pesquisadores sugerindo que se iniciou na Revolução Industrial, e outros apontando o início em meados do século 20, num período conhecido como Grande Aceleração, quando ocorreram grandes aumentos no consumo de recursos naturais, na concentração da população nas cidades, piora nos parâmetros ambientais, etc. Para confirmar a mudança do Holoceno para o Antropoceno, foram iniciadas diversas pesquisas para identificar as marcas das ações humanas nos registros geológicos da Terra, condição necessária para confirmar a troca de épocas.

Posteriormente, surgiu um conceito novo, proposto pelo professor Jason Moore, geógrafo e historiador. Segundo o pesquisador, não bastava considerar apenas os processos naturais para identificar a influência humana nas alterações ecológicas. Seria fundamental incluir os processos históricos e socioeconômicos. Com essa nova visão, começamos a perceber que o grande responsável pela degradação progressiva nas características ecológicas do planeta é o capital. Identificado o grande culpado, o pesquisador propôs o termo capitaloceno. Propôs também a data de início deste processo no século 16, quando começou a colonização dos continentes asiático, africano e americano pelas nações europeias. A invasão e a colonização destes continentes permitiram que as nações europeias tivessem acesso à chamada Natureza Barata, garantindo a apropriação de recursos naturais que serviram de arcabouço para a formação do capital. Este, com sua lógica de expansão constante da produção, é que, de fato, vem criando as condições para o aquecimento global, além de outros problemas que afetam a Terra.

Mudar o presente e o futuro

Mas será que as soluções apresentadas e discutidas nas muitas Conferências da ONU sobre Mudanças Climáticas (COPs), realizadas em diversos países, abordam, de fato, que a responsabilidade dos problemas ambientais da atualidade cabe ao capital? Evidente que não. É muito mais fácil responsabilizar as pessoas em geral, que deveriam consumir menos, reciclar o lixo e adotar outras providências para não destruir o meio ambiente. Não que isto não seja importante em um nível local, mas é completamente inútil na escala planetária. É mais fácil para os países participantes das COPs discutir soluções que, na verdade, não conseguirão solucionar nada com a rapidez que precisamos, como créditos de carbono e tecnologias de retirada dos gases de efeito estufa da atmosfera. É inocente acreditar que os governos adotarão uma agenda ambiental realmente eficiente, pois, caso comecem a fazer isso, terão que enfrentar a oposição ferrenha das grandes empresas e de seus representantes políticos.

Devemos compreender que cabe a nós, classe trabalhadora, debater a questão ambiental, incluindo-a seriamente na nossa luta. Devemos acelerar o processo de organização da nossa classe com vistas à superação do capitalismo e à adoção de um socialismo que supere o capital.

Ressalto a urgência na luta porque vários pesquisadores afirmam que estamos vivendo a década decisiva, que se encerrará em 2030. O que fizermos até lá pode representar a forma como viverão ou mesmo a sobrevivência de nossos futuros descendentes. Uma coisa é certa: em uma situação de recursos escassos, sempre quem sai perdendo é a classe trabalhadora, especialmente os mais pobres e vulneráveis. O tempo se esgota e é preciso aproveitá-lo para tentar mudar nosso futuro.

*Gildo Bastos, oceanógrafo e analista ambiental do Ibama

Matéria publicada na edição nº 292 do Jornal A Verdade.

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