Povo de Natal sofre com um dos piores sistemas de transporte público do país. Em um cenário em que os grandes empresários que lucram milhões por ano com esse serviço, controlam tudo referente ao transporte, como os trabalhadores ficam frente tamanho sucateamento?
João Pavanelli | Redação RN
BRASIL – O transporte público da cidade de Natal é extremamente precário. Nos pontos de ônibus o que não falta é reclamação da infraestrutura, do calor, do desconforto, do tempo enorme de espera e, é claro, da indiscreta tarifa de R$ 4,50. A tarifa de ônibus natalense é mais cara do que as das cidades de São Paulo (R$ 4,40), Rio de Janeiro (R$ 4,30) e Brasília (R$ 3,85).
Na cidade de Natal, entre 2007 e 2022, enquanto o número de motos aumentou 136,5% e o de carros 64,5%, a frota de ônibus aumentou em apenas 49,1%. Estes dados do IDEMA (Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente do Rio Grande do Norte) demonstram uma tendência de expansão do transporte privado frente ao transporte público, deixando a classe trabalhadora sem opções para se locomover pela cidade, pois os preços de veículos populares cada dia mais e mais se tornam inacessível para a grande maioria das famílias.
Além deste desprezo pelo transporte público, a prefeitura do Natal também não parece se importar muito com algumas linhas que foram todas retiradas de circulação desde a pandemia de COVID-19, segundo o Agora RN. A prefeitura realmente acha que não precisa transportar trabalhadoras e trabalhadores entre todas as regiões da cidade. As linhas também são cortadas por falta de interesse privado: se poucas pessoas se transportam em determinada região, e um ônibus pode lucrar mais em uma região que já possua mais de uma linha, a empresa privada que detém a concessão das linhas simplesmente fecha uma linha.
Também é possível perceber no relatório do IDEMA que além das empresas terem diminuído o número médio anual de viagens por ônibus (de 203, em 2013 para 177, em 2019), os carros ainda rodam menos. Um ônibus costumava percorrer 7.159 quilômetros em 2013, enquanto em 2019 percorria apenas 6.173 quilômetros, uma queda de 13,8% de percurso para os trabalhadores e trabalhadoras. Não para por aí, segundo o G1 do RN o número de linhas caiu de 83 para 55 depois da pandemia de Covid-19.
Em contrapartida a esse serviço horrível de transporte, segundo estimativa feita pelo Jornal A Verdade, também com os dados do relatório do IDEMA, arrecadou-se em 2019, cerca de R$ 24.390.602,70 (quase 25 milhões de reais) fruto do acúmulo das tarifas pagas pelos trabalhadores. Uma quantidade enorme de faturamento para um serviço tão precário de transporte.
Os contratos das empresas privadas com a prefeitura
O mistério das licitações já dura mais de 10 anos em Natal. Ninguém tem acesso aos contratos entre a prefeitura e as empresas “vencedoras” das licitações que permitem a concessão da oferta de transporte público no estado.
Como o transporte público é um serviço de bem estar coletivo, as empresas privadas não possuem o direito de fazer o que bem entendem com as linhas e com a qualidade do serviço. Isso significa que o poder público tem obrigação de fiscalizar e cobrar das empresas que não oferecem os serviços de acordo com o que foi contratado com a licitação. Quem faz essa fiscalização é o Tribunal de Contas. Mas como ele pode fiscalizar contratos que não são encontrados? É como se houvesse um muro que tapa o órgão fiscalizador de verificar se os contratos estão sendo cumpridos pelas empresas privadas que detém as concessões das linhas de transporte.
A prefeitura tem o dever de disponibilizar os contratos imediatamente, e de cobrar que o Tribunal de Contas fiscalize e até mesmo suspenda as licitações que não estão cumprindo com suas obrigações legais.
Um dos argumentos da STTU (Secretaria de Mobilidade Urbana), segundo o G1 do RN, os contratos atuais são “emergenciais” e de curto prazo para dar conta das áreas não atendidas.
Sem acesso às condições das licitações o povo não pode saber quem está recebendo os quase 25 milhões de reais anuais. Como cobrar quem não conhecemos?
Quanto realmente custa o transporte público da cidade
A redação do Jornal A Verdade no RN fez uma estimativa considerando valores razoáveis de um ônibus novo com vida útil de 9 anos e a média de rodagem real dos últimos anos, bem como seus custos de manutenção, e também considerando o preço do combustível, e do salário de 3 motoristas e 3 cobradores. Com tudo isso temos um valor aproximado de R$ 1,36 por quilômetro rodado. Será que R$ 4,50 é realmente uma tarifa adequada?
É importante o acesso público aos contratos de licitação das empresas privadas concessionárias das linhas do transporte coletivo de Natal. Para isso é necessária uma pressão da classe trabalhadora junto ao poder público.
Por fim, para que o povo supere esses problemas e consiga viver dignamente em uma cidade que pense e se importe com a classe trabalhadora, é necessária uma luta pela estatização do transporte público. Enquanto o sistema de transportes estiver nas mãos de meia dúzia de milionários, o povo vai continuar pagando a conta do sucateamento dos ônibus em Natal.
Excelente matéria parabéns a redação e ao jornal A Verdade.