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domingo, 8 de dezembro de 2024

Estudantes denunciam falta de inclusão na UFPE em Caruaru

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Durante a aula inaugural do semestre letivo no Campus da UFPE em Caruaru, um estudante surdo não pôde participar do evento por não ter um intérprete de Libras no evento.

Maria Santos e Redação Pernambuco


EDUCAÇÃO – Ingressar numa universidade pública é ainda um dos maiores sonhos para a maioria da juventude em nosso país. A chamada Aula Magna é considerado o pontapé inicial para a vida acadêmica, uma espécie de ritual de passagem para todo calouro, e, sem dúvida é marcante para cada um. Mas não foi isso que foi visto na aula inaugural do Centro Acadêmico do Agreste da Universidade Federal de Pernambuco (CAA – UFPE), na cidade de Caruaru.

No último dia 13 de novembro, com a presença do reitor da universidade Alfredo Gomes, os calouros, e todo o corpo docente da instituição, os estudantes notaram uma situação muito desrespeitosa: um dos calouros presentes e o primeiro estudante surdo do curso de pedagogia do campos simplesmente não pôde participar da cerimônia por não ter nenhum intérprete de Libras no local para garantir a inclusão do estudante no evento.

Na ocasião também se descobriu que os dois intérpretes de Libras da instituição se encontravam de licença, impossibilitando assim a participação do estudante. Ou seja, além de não poder ter participado da aula magna, o estudante também se encontra ameaçado até de assistir as aulas, já que não tem como acompanhar as aulas sem um intérprete.

Estudar e lutar

Presente durante o evento, a União dos Estudantes de Pernambuco (UEP) mobilizou os estudantes presentes para denunciar a situação e exigir da reitoria um posicionamento. Além disso, os próprios estudantes deram uma aula de solidariedade ao se juntarem para garantir a interpretação em Libras do evento para o estudante.

Por conta da manifestação, a coordenação do curso e o setor de Assistência Estudantil do campus garantiram a liberação de um auxílio emergencial para a contratação de um intérprete, além de materiais didáticos específicos para auxiliar o estudante. Os cortes nas verbas para o ensino superior promovidos pelo governo Bolsonaro deixaram resquícios no cotidiano das universidades e a recente greve nacional docente foi também prova disso, porém é inadmissível que a instituição deixe os estudantes que precisam de uma apoio tão crucial como o intérprete de Libras em sala de aula desassistidos.

A mobilização durante a Aula Inaugural foi fundamental. A reitoria alegou que a contratação de um profissional de Libras para dar suporte ao espaço vago poderia levar até meses, mas garantiu o edital, com uma bolsa de R$1.000 para preencher a vaga para um intérprete logo após a repercussão da denúncia.

A garantia de diretos das Pessoas Com Deficiência (PCD)

Desde 2006 que a Convenção sobre os Direitos de Pessoas da Pessoa com Deficiência da Organização das Nações Unidas (ONU) estabeleceu a siga PcD para designar a “Pessoa com Deficiência”. Termos como “deficiente” ou “inválido” são devem ser usados mais. O jornal A Verdade entrevistou Rita Silva, professora, intérprete e especialista em Libras sobre o que diz a lei sobre a garantia de acesso ao intérprete de Libras para pessoas com surdez.

A Verdade – Existe uma garantia, ou alguma lei para o acesso à intérprete de Libras para a população surda em nosso país?

Rita Silva – Existe a Lei 10.436, de 24 de Abril de 2002, conhecida como Lei de Libras. Ela regulamenta e reconhece a Linguagem Brasileira de Sinais (Libras) como uma língua. Ali você encontra a importância de difundir a língua, e no terceiro artigo fala-se da necessidade dos serviços públicos garantirem o acesso à língua  para as pessoas com deficiência auditiva ou pessoas surdas sinalizantes. Mas vamos pensar: o que é um tratamento adequado para uma pessoa surda em espaços públicos? Minimamente, ela ter acesso à acessibilidade comunicacional, ela se fazer ser entendida e entender o que está acontecendo nesse espaço. Estamos falando de um direito fundamental para uma pessoa com surdez.

E em se tratando do oferecimento ao ensino e a interpretação da Libras, essa lei garante o acesso?

Rita Silva – Em 2005 foi assinado o Decreto N° 5.626, de 22 de Dezembro que regulamenta a Lei nº 10.436, de 24 de abril de 2002. Quando a gente vai para o decreto de Libras a gente vê um enfoque grande na formação dos profissionais que vão atuar com a educação de surdos. Boa parte desse decreto é voltada para a educação, Tem uma partezinha ali pra saúde e tal, e tem um item que fala sobre esse acesso em espaços públicos. Ali, no inciso segundo do artigo 26, fala-se da utilização dos intérpretes contratados especificamente para intermediação de comunicação, para garantir o atendimento, seja presencial ou remoto, a pessoa surda ou com deficiência auditiva. Entretanto, a gente já vê aí que diz que “poderão utilizar”, ou seja, não é algo obrigatório ou que tem a mesma conotação de “garantir” ou “devem garantir” para as pessoas surdas. Por mais que a gente tenha essa “orientação legislativa”, ainda são pouquíssimos os espaços que dispõem de profissionais intérpretes. Onde a gente encontra mais esses profissionais? Na área da educação, né?

Pode falar um pouco da importância de intérpretes de Libras em eventos públicos?

Rita Silva – Considerando essas questões que eu mencionei, é importante ter intérpretes em espaços públicos, não só em eventos. A pessoa surda ou a pessoa com deficiência auditiva sinalizante é um ser humano que tem os direitos previstos na Constituição, assim como nós, pessoas ouvintes. É um direito básico, fundamental, assim como o de ir e vir, por exemplo. E quando não há um intérprete de Libras, esse direito também é limitado. Uma pessoa surda que vai a um hospital, por exemplo, ela não tem acesso à mesma informação que nós ouvintes temos. Então, é primordial que se tenha um profissional intérprete, que se oferte esse profissional para mediar essa comunicação, para que ele realmente tenha seu direito à saúde garantido. E são inúmeros os casos na área da saúde e em várias outras de consequências terríveis mesmo, por falta de um intérprete nesse caso.  Na área médica, alguns óbitos já ocorreram por não haver essa comunicação e vários equívocos médicos também. É sobre isso que estamos falando.

Já sobre a questão dos eventos públicos, o nome já diz: é público. É para todos que desejarem ir. E a pessoa surda, ela precisa que haja acessibilidade para que ela faça parte desse momento. Infelizmente, muitos eventos públicos ainda não dispõem de interpretação, muitos espaços públicos não têm profissionais intérpretes por mais que haja essa sugestão da lei de utilização dos profissionais.  Algumas instituições, principalmente as educativas, dispõem da contratação desse profissional, mas ainda são muitas que só passam a perceber a relevância ou a necessidade do profissional após a chegada da pessoa surda na instituição. Quando falamos em incluir a Pessoa com Deficiência em todos os espaços públicos da sociedade. Esse é o desafio.

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