A ser votada na terça (12/11) pela CCJ da Câmara, a PEC 164/2012 traz risco de grande retrocesso nos direitos das mulheres. Ao definir que a vida tem início na fecundação do óvulo, o projeto proposto por Eduardo Cunha pode criminalizar até os procedimento de aborto já previstos em lei
Larissa Mayumi e Luiza Camargo | Movimento de Mulheres Olga Benário
Nesta terça-feira (12/11), a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos Deputados vai pôr em votação a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 164/2012, que pode promover um enorme retrocesso no direito ao aborto no Brasil, acabando com todas as formas de aborto legal atualmente previstas em lei.
A PEC visa alterar o 5º artigo da Constituição Federal, que diz: “ Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade”.
A manobra de alteração propõe que a “inviolabilidade da vida” presente no texto constitucional seja considerada desde o momento que o óvulo é fecundado. Desta forma, mesmo o aborto sendo legalizado desde 1940, nos casos de gestação fruto de estupro, risco à vida da gestante e feto anencéfalo, realizar o procedimento do aborto poderia passar a ser considerado crime. O Movimento de Mulheres Olga Benário convoca a população a se mobilizar contra a aprovação dessa proposta reacionária e anti-direitos.
Uma década de mobilização pelo aborto legal
A PEC 164/2012 foi apresentada pela primeira vez em 2012 pelo ex-deputado federal Eduardo Cunha, responsável por conduzir na Câmara o golpe contra a ex-presidenta Dilma Rousseff e que teve seu mandato cassado em 2016 devido a seu envolvimento em casos de corrupção.
Além disso, em 2013, Cunha também foi responsável pelo Projeto de Lei 5069, que na prática ampliava a repressão a mulheres que precisam abortar, propondo punições mais severas para aquelas que tomassem medicamentos abortivos e tornando obrigatória a comprovação de abuso sexual para acessar o aborto legal. Os absurdos do projeto foram denunciados pelos movimentos de mulheres à época, uma vez que o exame de corpo de delito é invasivo e muitas vítimas não se sentem à vontade para realizá-lo após agressão sexual.
O PL 5069/2013 chegou a aprovado na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara em outubro de 2015. Contudo, a aprovação levou milhões de mulheres às ruas sob a palavra de ordem “Fora Cunha”. Vitoriosas as manifestações, o projeto não foi para frente.
Desde então, inúmeros fascistas têm tentado atacar este direito fundamental para salvar a vida de mulheres, crianças e pessoas que gestam. O aborto legal permite que vítimas de estupro (no Brasil, mais de 60% delas são crianças de até 14 anos) tenham sua saúde preservada e não sejam torturadas pela continuidade de uma gestação fruto de uma violência extremamente traumática, como o estupro.
Proposto neste ano, o PL 1904/2024, mais conhecido como PL do Estupro, também tinha por objetivo criminalizar os abortos realizados após as 22 semanas de gestação, prejudicando principalmente as crianças, que demoram mais tempo para identificar uma gravidez e acessar o direito ao aborto. Outros ataques, como as tentativas de instituir o “Dia do Nascituro”, fechar serviços de abortamento legal, perseguir médicas que realizam o procedimento do aborto ou investigar fichas médicas sigilosas são algumas das ofensivas que tem acontecido contra esse direito das mulheres.
Luta das mulheres pode derrotar a PEC
Agora, a PEC 164/2012 que será votada amanhã pela CCJ da Câmara foi apelidada por movimentos reacionários e conservadores de “PEC da vida”. No entanto, estes que se dizem “a favor da vida” não defendem a vida das 84 mil vítimas de estupro anuais no país, nem daquelas que podem morrer caso sigam com uma gestação de risco e nem das que realizam aborto inseguro, uma das principais causas de morte maternas no Brasil. Muito menos, das mais de 25 mil crianças que todo ano seguem com uma gravidez que coloca suas vidas em risco, sendo a maioria delas negras.
Apesar dos ataques, as mulheres já mostraram que tem disposição de defender o aborto legal e lutar pela descriminalização e legalização do aborto, uma vez que derrotaram Cunha em 2015 em grandes manifestações pelo Brasil todo e barraram a votação do PL do Estupro neste ano. A PEC 164/2012, que deveria ser chamada de PEC do Estupro e não de PEC da Vida, também será derrotada com grandes manifestações de rua!