UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

sábado, 15 de fevereiro de 2025

Paraná é o 2° estado com mais tentativas de feminicídios do Brasil

Leia também

O Jornal A Verdade entrevistou Emily Kaiser, membro da coordenação nacional do Movimento de Mulheres Olga Benário e Luana Ganio, militante, advogada e coordenadora da Rede de Apoio às Mulheres em Situação de Violência Rose Nunes.

Movimento Olga Benário | Paraná


MULHERES – O segundo semestre de 2024 consolidou um marco dramático para o estado do Paraná, que chegou ao ranking alarmante de segundo lugar em tentativas de feminicídio no país. O crescimento é de 20% de casos entre setembro de 2023 e 2024, e se relaciona com os recentes cortes nas políticas públicas de enfrentamento à violência contra as mulheres. 

O Jornal A Verdade entrevistou Emily Kaiser, membro da coordenação nacional do Movimento de Mulheres Olga Benário e Luana Ganio, militante, advogada e coordenadora da rede de apoio às mulheres em situação de violência Rose Nunes.

Jornal A Verdade: O Paraná registrou um crescimento absurdo em casos de feminicídio no último ano, tornando-se o segundo estado do Brasil com mais casos. Curitiba é a pior cidade, com um aumento de 600% dos índices. Como o Movimento Olga analisa essa realidade? Na sua opinião, quais as causas desse aumento?

Luana: O movimento analisa esses índices como resultado de todo um sistema. O capitalismo é pensado e construído diariamente para marginalizar, objetificar e tirar a vida e a dignidade das mulheres. E isso acontece com um recorte muito acentuado de raça e de classe. Porque quanto mais pobre e periférica é a mulher, mais à margem ela estará, se é preta, não é vista nem como ser humano. O aumento nos casos de feminicídio reflete a intensificação das políticas que não só excluem as mulheres, mas, as colocam na linha de frente das violências. Por outro lado, a falta de políticas específicas, práticas e eficientes torna legítima a desumanização e o descarte das mulheres na sociedade e no Estado do Paraná.

Emily: A gente enxerga como mais uma forma de expressão do sistema capitalista. Nesse sistema, as mulheres têm pouco acesso para conseguir fazer uma política institucional, fazer leis e criar instituições que atendam às suas necessidades. Elas não estão de fato, principalmente as mulheres trabalhadoras, no comando da formulação da lei, da cidade, do estado e do país. E por conta disso, num estado em que o fascismo opera e que a direita tenta privatizar todos os serviços básicos que servem a população, faz com que as mulheres tenham pouco acesso. E o pouco acesso que já existe é cada vez mais dificultado e mais negado e precarizado também para as mulheres. E principalmente também porque as mulheres têm uma condição de vida muito mais precária do que os homens, porque historicamente é um grupo com menos condições de trabalho. Elas trabalham muito mais, consequentemente precisam ter mais acesso à saúde e não conseguem. O avanço do fascismo e o avanço da falta de direitos mesmo da população em geral da classe trabalhadora, afeta diretamente a vida das mulheres.

Jornal A Verdade: Ao mesmo tempo, as políticas públicas oferecidas pelo governo paranaense são precárias, como noticiado pelo Jornal A Verdade. Falando sobre a capital, que recursos públicos a mulher conta hoje para se proteger e se conscientizar sobre a violência de gênero?

Luana: Hoje a mulher curitibana conta com recursos completamente precários, ineficientes e que enfatizam que as vidas e os corpos das mulheres não têm importância. Mesmo elas constituindo a base que sustentam todas as riquezas do Estado, desde o trabalho reprodutivo de trabalhadores e trabalhadoras até o trabalho produtivo de mão de obra precária no mercado de trabalho. Os recursos oferecidos pelo município atualmente servem como palco para mídia, para sustentar tão somente um discurso que em nada condiz com a prática, basta atuar minimamente junto aos serviços que de pronto fica estampado tamanho descaso. A mulher não tem acesso a atendimento digno e humanizado, as violências são invisibilizadas ou reduzidas à agressão física, não existe suporte jurídico e psicológico eficiente, os sistemas de comunicação das violências e dos casos de feminicídio são precários, os suportes básicos oferecidos pela Lei 11.340 (Lei Maria da Penha) não existem na prática, como por exemplo, o aluguel social, que serve para retirar a mulher no local de violência e oferecer o mínimo de dignidade. Além disso, os serviços funcionam dentro de uma lógica que serve para vitimizar novamente a mulher que está em violência, muitas vezes a desencorajando de sair desse local, sendo que assim, nem se pode falar em chegar próximo de uma conscientização.

Emily: Hoje na cidade de Curitiba existem poucos serviços que atendem de fato as mulheres em situação de violência. Um exemplo é a casa da mulher brasileira que é um complexo de diversos serviços que não funcionam 24 horas. Apenas a delegacia funciona 24 horas, de forma extremamente precária e com profissionais com um pouco instrução, com poucas profissionais mulheres.

Existe uma dificuldade também de conseguir dentro do Serviços de Saúde, por exemplo do serviço social, instruir e ter e fazer com que as mulheres tenham acesso às políticas públicas por esses lugares. Um exemplo disso é o caso de uma mulher que nós atendemos que ela foi atendida por mais ginecologista do sistema público de saúde do SUS em uma das das unidades de saúde na qual ela foi atendida, falou que eh a mulher a médica viu sinais de violência, ela falou que foi violentada que foi estuprada, mas a médica em nenhum momento fez uma notificação compulsória que é obrigatória nesses momentos, notificar para que o estado consiga garantir não só estatística, mas também que ela seja acompanhada pelo serviço social para saber como que tá se desenrolando essa violência na vida dela, pela rede de proteção da cidade e isso em nenhum momento foi contestado. E ela falou não só com a ginecologista, mas também com diversas pessoas que a atenderam na recepção e ela não foi bem tratada nesse momento.

Então, esse é um exemplo de como não só os serviços que atendem diretamente às mulheres em situação de violência, mas os outros serviços não estão preparados para atender eh nesses casos e também nesses processos e é bem importante frisar que a casa da mulher brasileira é um complexo que não se conversa entre si, então quando acontece alguma coisa dentro da casa da mulher brasileira seja no complexo jurídico, por exemplo, as outras partes da casa não ficam sabendo. E aí a mulher é revitimizada todas as vezes que ela é atendida em alguma parte da casa da mulher brasileira.

Outro exemplo, também, de como é a situação das mulheres na cidade é que elas têm muita dificuldade de locomoção, por exemplo a cidade tem uma das passagens mais caras do Brasil e isso dificulta o acesso à cidade.

Então faz com que as mulheres tenham uma dificuldade maior em conseguir o acesso à casa da mulher brasileira, por exemplo que só existe uma casa da mulher brasileira e só existe uma delegacia para mais de 3 milhões de habitantes, não só na cidade de Curitiba, mas da região metropolitana também que é inclusive as mulheres da região metropolitana não são atendidas na casa da mulher brasileira. Porque apesar de ser um serviço Federal é considerado do município. Então as mulheres que não são do município não podem ser atendidas, isso faz com que uma mulher que sofra uma violência porque tá visitando ou tá eh passando algum tempo na cidade de Curitiba ou até mesmo vindo trabalhar ou estudar na cidade. Não consegue ter acesso ao serviço que devia ser público. 

Jornal A Verdade: E como os movimentos sociais têm se posicionado para defender a vida das mulheres na capital?

Luana: Falando em mulheres e luta das mulheres e do Feminismo no geral, entendo como preocupante a visão e atuação de alguns movimentos, tendo em vista que essa visão comentada parte de um local de privilégios, sem voltar a atenção para a grande maioria das mulheres da cidade, isto é, mulheres trabalhadoras, periféricas e pretas. Com esse feminismo que entendo como liberal, o foco acaba sendo em colocar a mulher – classe média – em pé de igualdade com o homem nos direitos e principalmente no mercado de trabalho. Ocorre que as necessidades da grande maioria das mulheres são outras, são necessidades básicas de dignidade, como alimentação, saneamento, segurança, educação. Então, para além da fala e atos em dias históricos, os quais são de suma importância, a prática e o olhar voltado a esse tipo de feminismo, o feminismo das mulheres trabalhadoras, pretas e periféricas, é basilar e urgente.

Emily: É importante dizer que quando falamos de movimentos sociais que defendem as vidas das mulheres, existem diversos movimentos sociais que atuam na defesa dos direitos das mulheres, por exemplo, o movimento estudantil que consegue garantir dentro das universidades e escolas que não haja assediador ou abusos.

Outra forma são os partidos que defendem a vida da classe trabalhadora, como a Unidade Popular que defende a revogação da reforma trabalhista e previdenciária que faz com que a maior parte da população não consiga se aposentar, trabalho precário, sem reajuste salarial com base na inflação ou que consiga garantir os custos de vida da família.

A maioria das famílias que são chefiadas por mulheres, têm uma qualidade de vida mais baixa porque as mulheres recebem proporcionalmente menos que os homens. Não só os movimentos sociais são diversos, são os únicos que fazem pressão popular para garantir que consigamos algum direito.

Jornal A Verdade: Quais as perspectivas que o Movimento Olga têm na capital? Como as mulheres paranaenses podem se organizar para enfrentar o machismo e o fascismo no estado?

Luana: O Movimento Olga Benário, além de ser um movimento feminista de mulheres trabalhadoras da classe trabalhadora, é também um movimento revolucionário, que entende que somente através da organização e da prática é que a realidade das mulheres pode ser alterada e transformada. O movimento tem atuação direta junto às trabalhadoras, com a construção de mecanismos para fazer acontecer essa realidade distinta da que temos hoje. Com pouquíssimos recursos financeiros e muita organização e luta, o movimento reúne diversos tipos de mulheres, cada uma com suas particularidades e com vontade de mudança, não só com a derrubada do machismo, mas, também do fascismo no nosso país.

O resultado dessa organização é a construção de casas com atendimento efetivo, humanizado e com atuação revolucionária através de educação, compartilhamento de saberes, compartilhamento do trabalho de cuidado, o qual recai inteiramente sobre as mulheres, exemplo disso foi a Casa Rose Nunes construída por essas mulheres e destruída com muito afinco por aqueles que as marginalizam.

Outro exemplo, é, após a destruição do espaço físico da Casa Rose Nunes, a continuidade dos trabalhos com essas mulheres através da atuação diária do movimento e da Rede de Atendimentos que conta com profissionais voluntárias e revolucionárias. Sendo assim, a perspectiva do Movimento Olga Benário é continuar todos os dias nessa luta e chegar cada vez mais em mais dessas mulheres trabalhadoras, para que somente assim com a união e a luta constante possa essa realidade ser mudada.

Emily: Não só na capital, mas no estado, as expectativas são organizar as mulheres para lutar pelos seus direitos, mas também pelo socialismo, porque não há outra forma das mulheres tenham livre acesso à cidade, à maternidade, à planejamento familiar, justiça reprodutiva, não tem como as mulheres terem acesso à saúde e políticas que enfrentam a violência, sem uma sociedade socialista, apenas através dela podemos garantir que as mulheres estejam no poder e comandem a sociedade.

Precisamos desenvolver cada vez mais lutas, para desmascarar o que o capitalismo faz com as mulheres, o verdadeiro culpado não são os homens e sim esse modo de produção. As mulheres precisam saber a podridão que é esse sistema e que não é essa perspectiva de vida que queremos. Por conta disso, chamamos todo mundo pra se organizar no movimento, em todos os bairros e região metropolitana da cidade, pelo nosso trabalho voluntário a gente atenda as mulheres não apenas para tirá-las dessa situação, mas mostrar um mundo melhor e mais justo.

Pra combater o fascismo estamos organizando cada vez mais mulheres no movimento pra construir o socialismo e também lutar contra a escala 6×1, a privatização e a militarização das escolas, lutar por mais creches populares e da prefeitura, porque existe um déficit gigante de creches nas cidades, além do aumento da violência e da falta de políticas públicas, só vamos resolver isso com a organização das mulheres trabalhadoras.

More articles

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Últimos artigos