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sexta-feira, 21 de março de 2025

A luta dos portuários contra a privatização dos portos

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No Porto de Itajaí, em Santa Catarina, os portuários se mobilizam para enfrentar a ameaça de privatização. Brigadas operárias do jornal A Verdade impulsionam a organização da categoria

Leonardo Ziegler Huber e Tais Tasqueto Tassinari | Navegantes (SC)


Itajaí é a maior economia do Estado de Santa Catarina, e o trabalho portuário é ligado diretamente a sua história. No final do século 19 e início do 20, a atividade portuária detinha a maior concentração de trabalhadores. A relevância do porto e sua necessidade de melhorias foram percebidas pelo Governo Federal, que expediu, no ano de 1905, normas para organização e aperfeiçoamento do porto. Os trabalhos se iniciaram em 1907 e promoveram o melhoramento da barra de acesso, uma vez que, em virtude da pouca profundidade do rio Itajaí-Açu, muitos navios não conseguiam chegar ao cais. A primeira manifestação dos trabalhadores de Itajaí, no sentido de uma organização coletiva, ocorreu em 1902, com a fundação da Sociedade Operária Beneficente Itajahyense (Sobi), cujos membros eram majoritariamente integrantes de atividades portuárias e negros.

Quase um século depois, em junho de 1995, a autoridade sobre o porto foi cedida pela União para o Município de Itajaí, a partir do Convênio de Descentralização Administrava n° 001. O Governo Federal, através do Ministério de Portos e Aeroportos (MPOR), na data de 02 de março de 2023, declarou que a União pretendia prosseguir com a proposta de manter a autoridade portuária pública por mais 35 anos (até o ano de 2058) e realizar licitação para arrendamento das áreas operacionais à iniciativa privada. Com isso, percebe-se que, ainda assim, o porto não opera 100% como público, sendo parte de seus trabalhadores contratados através do Órgão Gestor de Mão de Obra (Ogmo), que atua no cais público, estabelecendo a forma de organização da contratação das categorias de estivadores, arrumadores, conferentes, vigias e consertadores. Já no século 21, os trabalhadores portuários ajudaram a cidade a chegar ao patamar da maior importadora do Brasil, além do segundo porto em movimentação de containers no país.

Tentativa de privatização

A precarização das condições de trabalho foi o primeiro passo, e essa é uma das características mais essenciais do processo de privatização neoliberal. O arrendamento com a empresa ATM no terminal de cargas finalizou em 2022, no Governo Bolsonaro. Na época, Tarcísio de Freitas (Republicanos), hoje governador de São Paulo, era ministro dos Transportes e eles decidiram que, naquele momento, não ocorreria mais o leilão de concessão, tendo uma queda de 95% do atracamento, praticamente paralisando o porto em um processo de sucateamento do mesmo.

O responsável pela condução do leilão de concessão, Diogo Piconi, ex-secretário de Portos do Governo Bolsonaro, depois de não efetivar o leilão, foi contratado pela Portonave como superintendente técnico, um porto totalmente privado que fica do outro lado do rio Itajaí-Açu, na cidade de Navegantes (SC). Não por acaso, no mesmo período, toda a carga que antes atracava no porto público de Itajaí começou a atracar no porto privado da Portonave.

Correio Junior, presidente do Sindicato dos Arrumadores, Trabalhadores Portuários Avulsos, Capatazia e Servidores dos Bloco de Itajaí e Navegantes, que apontava a contradição entre capital e trabalho, foi candidato a vereador, nas últimas eleições municipais, justamente pelo partido Republicanos, o mesmo de seus antigos patrões, que precarizam a vida dos trabalhadores portuários.

Lei dos Portos

Em março de 2024, Arthur Lira, então presidente da Câmara dos Deputados, criou uma comissão para revisar a Lei dos Portos, porém nenhum trabalhador portuário foi indicado para esta comissão. Somente na semana anterior à paralisação nacional (outubro de 2024), o Sindicato dos Trabalhadores Empregados na Administração e nos Serviços de Capatazia dos Portos, Terminais Privativos e Retroportuários no Estado do Paraná (Sintraport) teve acesso ao relatório desta comissão. Entre os principais pontos reformulados da lei, estão a eliminação de diversas categorias (vigias, guardas portuários, alguns funcionários administrativos), o fim da exclusividade dos trabalhadores portuários, que põe em risco o trabalho de categorias exclusivas dos portos, como a dos estivadores, que hoje são os únicos responsáveis pelo trabalho de carga e descarga portuária.

O relatório da comissão também impõe a criação de uma empresa paralela de trabalho nos portos, o que caminha na direção da precarização das condições de trabalho e dos salários, como disseram os próprios portuários durante as brigadas do jornal A Verdade. “Se privatizar, vai ser muito ruim para nós. Primeiro porque não houve conversa. Segundo que eu já trabalhei no porto na cidade vizinha que já é privado e lá eu ganhava um quarto do meu salário daqui e trabalhava quatro vezes mais. Lá a empresa não quer saber se o container pode vir a cair na nossa cabeça e muito menos deixar os trabalhadores se unirem, já que é impossível montar um sindicado, pois eles demitem todos que tentam”. Os trabalhadores portuários são contra toda essa terceirização dos serviços, como a da guarda portuária, que deixaria de existir com a reforma da Lei dos Portos.

Paralisação nacional

A paralisação foi organizada pela Federação Nacional dos Portuários (FNP). A proposta era de 12 horas de paralisação, com o objetivo de dar visibilidade às reivindicações da categoria; denunciar que as mudanças na lei usurpam direitos dos trabalhadores portuários; explicar que não estão pedindo nada de mais, além do emprego.

O Movimento Luta de Classes (MLC) iniciou as brigadas do jornal A Verdade no primeiro dia após a paralisação, seguindo todos os dias da semana, dada a rapidez com que a burguesia e seus representantes políticos têm para sabotarem os direitos dos trabalhadores. Em conversa com os trabalhadores portuários, muitos apontaram a necessidade urgente de unir as categorias e realizar greves não de apenas um dia, mas de cinco dias ou mais, o que demonstra que a rebeldia e a vontade de lutar existe nos trabalhadores, porém, muitos estão receosos com as possíveis mudanças na forma de contratação e acabam se sentindo obrigados a falar baixo ou ficarem quietos, quando algum supervisores aproximava.

No dia 23/10/2024, um dia após a paralisação, foi realizada a apresentação do relatório da comissão na Câmara dos Deputados com a presença das lideranças portuárias e sindicatos para cobrar explicações. Mesmo assim, ignorando as necessidades dos trabalhadores, a comissão aprovou o texto do relatório, que seguirá os trâmites internos das demais comissões. No dia 24, houve plenária dos portuários com representação de todas as federações para decidir os próximos passos da luta. A opinião dos portuários de Itajaí foi unânime: somente a greve nacional por vários dias conseguiria barrar os retrocessos.

Depois da tentativa de privatização e da eleição do Governo Lula, em 2022, outras incertezas se levantaram sobre a situação dos trabalhadores portuários e a movimentação de cargas no porto. A bola da vez sobre a situação é o processo de federalização. A decisão da federalização foi anunciada no dia 17 de dezembro de 2024, pelo Ministério dos Portos e Aeroportos, e justificada pelo governo como uma solução para estabilizar as operações e atrair novos investimentos. A Autoridade Portuária de Santos (PAS), responsável pelo maior porto da América Latina, assumiu a gestão do terminal portuário catarinense no dia 02 de janeiro deste ano. A questão da federalização pelo Governo Lula vem após as eleições para as municipalidades, em 2024, quando o prefeito fascista de Itajaí, Robison Coelho (PL), foi eleito. Federalizar o porto é afastar, ao menos temporariamente, a sua gestão das mãos do prefeito privatista e higienista de Itajaí.

Brigadas operárias

Desde a paralisação do porto, em 2022, após a tentativa de privatização pelos fascistas liderados por Bolsonaro, o MLC vem acompanhando a situação das trabalhadoras e trabalhadores portuários a partir das brigadas quinzenais do jornal A Verdade, coletando denúncias e aproximando-se cada vez mais da vida dessas categorias. No início de 2025, já foram seis brigadas, com dezenas de jornais vendidos. Muitos trabalhadores chegam para debater e apoiar o nosso trabalho no sentido da organização dessa categoria.

Nos Estados Unidos, em outubro passado, os portuários realizaram uma paralisação que interrompeu as atividades de 36 dos principais portos estadunidenses. Quase 50 mil trabalhadores cruzaram os braços e conquistaram um aumento de 62% nos salários.

As categorias que trabalham nos portos brasileiros merecem respeito e uma organização para chamar de sua. O trabalho de base, diário, sistemático e contínuo está crescendo cada vez mais com a classe operária desse país e a sua vitória é inevitável.

Matéria publicada na edição impressa nº 308 do jornal A Verdade

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