Trabalhadores de empresa em Campinas denunciam ao Jornal A Verdade que sofrem assédio moral, perseguição e abusos corporativos por parte de uma gestão comissionada pela prefeitura, que pretende demitir para recontratar por meio de contratos terceirizados e com salários menores.
Daniel Hadad | Campinas (SP)
SOCIEDADE – Trabalhadores da IMA (Informática de Municípios Associados) – empresa de economia mista da prefeitura de Campinas e responsável pelos sistemas digitais de vários serviços públicos do município – vêm sofrendo há anos assédio moral por parte de uma gestão comissionada pela prefeitura e que goza de salários até dez vezes maiores que os funcionários concursados.
Os trabalhadores relataram que a empresa se utiliza de mecanismos corporativos para infligir medo e forçar que aceitem condições de trabalho degradantes. Entre esses mecanismos destaca-se a chamada “avaliação de desempenho”, que é aplicada sem levar em conta os fatores que existem na prática em cada função. Em denúncia ao Jornal A Verdade, Reinaldo (nome fictício) contou: “toda equipe de digitalização recebe notas em cima de critérios que simplesmente não existem em nosso setor, como, por exemplo, ‘foco no cliente’. 90% do setor não tem contato nenhum com cliente. Além disso, é um setor completamente engessado, apenas digitalizamos e interagimos com sistemas limitados e ultrapassados, dificultando muitas vezes a migração para outros setores somente com as habilidades que adquirimos na empresa”.
Outra funcionária, Elisabete (também nome fictício) revelou ao Jornal, “cheguei a ouvir de uma supervisora que ‘cada uma está onde merece estar’. Não existe mobilidade na IMA”. De acordo com Elisabete, os dirigentes da IMA querem que a empresa demita a maior parte de seus atuais funcionários e venha a fazer apenas gestão de contratos – para isso, vêm impondo aos funcionários PDVs, ou “pedidos de demissão voluntária”, para que a empresa possa assumir licitações em contratos terceirizados e não precise criar, gerir e manter os sistemas ela mesma. Os funcionários forçados a aceitar esses PDVs, além de enfrentar dificuldades de recolocação no mercado após anos de serviço “com sistemas limitados e ultrapassados”, como pontuara Reinaldo, podem acabar contratados por salários ainda menores nas empresas para as quais os serviços da IMA serão terceirizados.
Assédio e violência: instrumentos de dominação de classe
Isso não é uma situação particular à IMA: é apenas mais uma prova de que os ricos deste país – que já controlam as empresas e os meios de produção necessários à nossa sobrevivência, além de rebaixarem as prefeituras e instituições públicas ao nível de seu “balcão de negócios” – têm interesse apenas em financeirizar seus ganhos, aprofundando a crise da desindustrialização e baixa produtividade do país, ao passo que mantém os salários dos trabalhadores baixíssimos para que os lucros venham de contratos superfaturados e em que os investimentos públicos são desviados a cada degrau de terceirização que se acumula entre os servidores e as gestões.
A perseguição, o assédio por parte dos gestores, e os abusos corporativos são, senão, mecanismos para disciplinar a classe trabalhadora e silenciar suas queixas, forçando-nos a aceitar condições cada vez piores de trabalho para que os lucros dos patrões sejam maximizados. Prova disso é que, conforme nos revelaram as denúncias, a empresa transfere funcionários que tenham se queixado abertamente para locais distantes e de difícil acesso, com o intuito de desmoralizar e punir. Soma-se a isso o agravante de que a opção por trabalho home office é negada àqueles mesmos funcionários, sem justificativa. Houve também quem tivesse sido incumbido de fazer trabalho em bairros de altos índices de violência e à noite.
O sindicato reaparece após anos ignorando a situação
Recentemente, o Sindpd, sindicato que assiste parte dos trabalhadores da IMA, veio ao Ministério do Trabalho para indiciar a empresa por essas e outras faltas, entre as quais se destaca a prática antissindical – isto é, a IMA vinha deliberadamente coagindo os funcionários a se desfiliarem do sindicato e abrirem mão do direito à luta garantido por lei. Neste mês de abril o processo deu seus primeiros passos para que os trabalhadores consigam reaver seus direitos, mas ainda é necessário ampla mobilização para assegurar que pautas mais aprofundadas possam ser garantidas, tanto o mais porque, conforme publicou o Sindpd em sua página no dia 19 de março, a empresa chegou até mesmo a usar sua Comissão de Empregados para tentar desacreditar o sindicato: “a IMA aciona sua Comissão para tentar justificar o injustificável: diante das denúncias e da multa aplicada pelo Sindpd por prática antissindical, a IMA, em vez de corrigir suas condutas, acionou sua Comissão de Empregados para tentar desacreditar o sindicato e minimizar a gravidade da interferência da empresa na organização sindical dos trabalhadores.”
Para se combater efetivamente as perseguições e assédios que empresas como a IMA vêm infligindo impunes aos seus trabalhadores, a única opção é a organização de frentes combativas. O sindicato é um instrumento de que os trabalhadores dispõem nessa luta. Organizados junto ao MLC (Movimento Luta de Classes), funcionários da IMA ano passado tentaram formar uma chapa para concorrer às eleições do Sindpd e impor-se à gestão atual que, apesar da sua recente atuação, tem se mostrado pouco combativa. Ainda que essa chapa não tenha sido vitoriosa, a escolha recente do Sindpd em fazer frente à IMA pode ser explicada como uma resposta à pressão criada por esses trabalhadores, demonstrando que a luta e a organização, mesmo quando os resultados não são imediatamente visíveis, sempre fortalecem e avançam o movimento operário.