A severa restrição orçamentária imposta às universidades contradiz frontalmente o discurso de valorização da educação que marcou a campanha e o início do terceiro mandato do presidente Lula.
Thaís Rachel Zacharia | Vice-presidente da UNE
EDUCAÇÃO – O ensino superior brasileiro vem enfrentando uma grave crise orçamentária ao longo dos últimos anos. Enquanto universidades suspenderam serviços essenciais e alertam para a impossibilidade de manter seu funcionamento já a partir deste mês de maio, o Governo Federal mantém generosos recursos para o agronegócio e prioriza o pagamento da dívida pública, revelando contradições em sua política econômica.
No dia 30 de abril de 2025, o Governo publicou o Decreto nº 12.448, que estabelece a programação orçamentária e financeira para o exercício de 2025. O documento se tornou o centro de uma crise nas instituições federais de ensino superior. O decreto limita drasticamente os recursos disponíveis para as universidades, permitindo o empenho de apenas 1/18 do valor previsto na Lei Orçamentária Anual (LOA) até novembro deste ano. Na prática, isso representa um contingenciamento superior a 30% no orçamento das instituições federais.
Estado de Emergência
“No momento, não temos limite nenhum de orçamento para funcionar no mês de maio”, declarou a Pró-Reitoria de Planejamento, Desenvolvimento e Finanças (PR-3) da UFRJ durante sessão do Conselho Universitário realizada no dia 8 de maio. A declaração ilustra a gravidade da situação enfrentada pela maior universidade federal do país.
A Administração Central da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ) determinou, em nota oficial no último dia 7, a suspensão imediata, em caráter emergencial, de todas as despesas relacionadas a combustíveis, manutenção da frota veicular e aquisição de material de consumo. Apenas serviços considerados de extrema necessidade, como segurança, saúde e transporte interno dos estudantes, continuam autorizados.
Situação semelhante ocorre na Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), que enfrenta um corte de R$ 8 milhões em relação à estimativa inicial de R$ 170 milhões, que já era considerada insuficiente. Segundo o reitor Irineu Manoel de Souza, a universidade acumulou uma dívida de R$ 17 milhões no ano passado e precisou utilizar parte do orçamento de 2025 para quitá-la, agravando ainda mais a situação financeira da instituição.
O presidente da Associação Nacional dos Dirigentes das Instituições Federais de Ensino Superior (Andifes), reitor José Daniel Diniz Melo, alertou que “as universidades federais não conseguem fechar as contas já neste mês de maio”.
Já a Universidade Federal Rural de Pernambuco (UFRPE) contará com menos de 70% dos recursos necessários para funcionar em 2025. O orçamento caiu de R$ 143,1 milhões para R$ 74,6 milhões. A reitora Maria José de Sena alerta que a instituição está em colapso, com dívidas acumuladas e risco de interrupção total dos serviços essenciais até agosto. “Temos um orçamento que está aprovado, sancionado, mas esse orçamento não nos permite trabalhar na universidade até dezembro. Nos primeiros cinco meses deste ano, a gente já usou 41% dos recursos disponíveis para o ano inteiro. O que estamos preocupados é com o abandono orçamentário das universidades. O orçamento só cobre oito meses de despesas da UFRPE. E isso não vai mudar se o governo não mudar as suas prioridades”, declarou.
Prioridades do Governo
A severa restrição orçamentária imposta às universidades contradiz frontalmente o discurso de valorização da educação que marcou a campanha e o início do terceiro mandato do presidente Lula. A priorização do pagamento da dívida pública e dos investimentos no agronegócio, em detrimento das instituições federais de ensino, revela as verdadeiras prioridades da política econômica do governo.
Enquanto as universidades enfrentam um estrangulamento financeiro, o Governo Federal mantém e amplia investimentos bilionários no agronegócio. O Plano Safra 2024/2025 disponibilizou R$ 400 bilhões para a agricultura empresarial, um aumento de 10% em relação à safra anterior. Para o próximo ciclo, a Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA) já solicitou R$ 594 bilhões em recursos financeiros para o Plano Safra 2025/26, um aumento de 24,64%.
Mais alarmante ainda é a comparação com os recursos destinados ao pagamento da dívida pública. Do orçamento total de R$ 5,7 trilhões para 2025, impressionantes 44,14% (equivalente a R$ 2,5 trilhões) serão destinados ao pagamento de juros e amortização da dívida pública. Este valor é 56% maior que o total combinado destinado à Educação, Saúde, Previdência Social e Bolsa Família, que somam R$ 1,6 trilhão. Especificamente para a educação pública, o orçamento prevê apenas R$226 bilhões, menos de 10% do valor destinado ao serviço da dívida.
Educação de qualidade
Sem uma reversão imediata do contingenciamento orçamentário, as universidades federais enfrentarão dificuldades crescentes para manter seu funcionamento ao longo de 2025. A situação é especialmente grave porque o contingenciamento atinge recursos destinados ao funcionamento básico das instituições, excluindo apenas a folha de pagamento. Isso significa que atividades essenciais de ensino, pesquisa e extensão estão diretamente ameaçadas.
A gestão econômica do Governo Lula tem privilegiado uma política fiscal de austeridade, buscando atender às expectativas do mercado financeiro em detrimento dos investimentos em áreas sociais essenciais, como a educação. O decreto de contingenciamento reflete uma diretriz de “adequar o ritmo de execução de despesas ao avanço do exercício e ciclo de avaliação e gestão fiscal do orçamento”, como justificado pelo próprio governo.
Esta orientação, que coloca o ajuste fiscal e o pagamento da dívida como prioridades absolutas, compromete não apenas o presente das instituições federais de ensino superior, mas também seu futuro e sua capacidade de contribuir para o desenvolvimento científico, tecnológico e social do país.
Diante desse cenário, a mobilização do setor da educação tem sido indispensável. Estudantes e trabalhadores têm se organizado em atos nacionais para denunciar os cortes e exigir recomposição orçamentária. Essas manifestações precisam seguir ocupando as ruas em todo o país denunciando o risco de desmonte das universidades públicas e a importância de defender o ensino superior gratuito e de qualidade.
Sem orçamento, não há educação de qualidade! Somente a mobilização coletiva pode garantir que a educação volte a ser prioridade no orçamento brasileiro!
Matéria publicada na edição 313 do Jornal A Verdade.