No dia 31 de agosto, o Senado Federal aprovou por 61 votos contra 20, o impeachment da presidenta Dilma Rousseff, eleita por 54 milhões de brasileiros em 27 de outubro de 2014.
O processo teve início em 2 de dezembro pelo então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB), com o objetivo de tirar da pauta da Câmara o processo de cassação do seu mandato por corrupção e tornar presidente seu comparsa e amigo Michel Temer.
A acusação a Dilma é de que ela atentou contra a Constituição ao autorizar gastos sem aprovação prévia do Congresso Nacional e de ter usado créditos do Banco do Brasil para financiar produtores rurais. A defesa da presidenta provou que o dinheiro foi usado em benefício da Educação e da Agricultura. Entretanto, o que se buscava não era propriamente se houve ou não crime de responsabilidade, mas encontrar algo que pudesse dar alguma formalidade ao processo de afastamento de uma presidenta com baixo índice de aprovação popular e que teve seu marqueteiro confessando ter recebido dinheiro de caixa dois para realizar sua campanha eleitoral.
Os defensores do impeachment repetiram e seguem repetindo que foi dado amplo direito de defesa à presidenta, tanto na Câmara dos Deputados, onde o impeachment foi aprovado por 367 dos 513 deputados, quanto no Senado Federal, quando a sessão foi presidida pelo presidente Supremo Tribunal Federal. Nada disso, porém, nega o fato de que as acusações feitas à presidenta eleita não se enquadram em nenhuma categoria de crime de responsabilidade¹ e, por isso, tornam seu afastamento um golpe parlamentar.
Basta dizer que tais operações feitas pelo governo sempre foram aprovadas e consideradas corretas e dentro da lei pelo Tribunal de Contas. Este, entretanto, mudou seu entendimento em 2015, unicamente para dar sustentação ao processo de impeachment que já era articulado pelos principais chefes do PMDB, partido que, desde o fim da ditadura militar, faz parte de todos os governos, perdendo ou ganhando eleição, além do PSDB, DEM, PPS, SD, entre outros partidos burgueses.
Um Congresso reacionário e contra os trabalhadores
Mas por que, mesmo não havendo crime de responsabilidade, o impeachment foi aprovado?
Primeiro, porque este é dos Congressos mais reacionários da nossa história. De acordo com o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap), apesar de ter havido uma renovação na Câmara e no Senado nas últimas eleições, houve o aumento de militares, religiosos, ruralistas e outros segmentos identificados com o conservadorismo e uma expressiva diminuição dos parlamentares comprometidos com os interesses dos trabalhadores. Na legislatura passada, 83 membros defendiam a causa dos trabalhadores; na atual, são apenas 50 deputados e nove senadores. Por outro lado, 250 deputados federais e senadores declararam-se defensores dos interesses dos empresários.
Segundo, devido à própria guinada à direita do Partido dos Trabalhadores, que para eleger e reeleger Lula – e depois Dilma –, abandonou suas propostas progressistas e rompeu seus vínculos com o movimento operário e popular. Para tanto, burocratizou a Central Única dos Trabalhadores (CUT), transformando seu presidente em ministro do Trabalho e depois prefeito de São Bernardo, fortaleceu a Força Sindical e demais centrais pelegas, e, com o apoio do PCdoB, fez da UNE e da Ubes entidades meramente de gabinete, limitando-se a apoiar o MEC e a realizar congressos com ricos patrocínios. Achando pouco, o PT no Governo Federal deu prosseguimento à corrupção nas obras públicas continuando a cobrar propina das empresas que realizassem obras da Petrobras ou pelos ministérios.
Recordemos aqui o que escrevemos na edição de março de 2010 de A Verdade, no artigo Para onde vais?, analisando as decisões do 4º Congresso do PT, realizado de 18 a 20 de fevereiro daquele ano:
“Evidentemente, esse retrocesso do PT não começou agora, nem se deu de repente. O próprio Lula, em entrevista ao Estado de S. Paulo, declarou que “O PT que chegou ao poder comigo, em 2002, não era mais o PT de 1980, de 1982”.
Fraco teoricamente e sem nunca ter se esforçado para compreender em profundidade o marxismo-leninismo, a teoria revolucionária da classe operária, o PT nasceu desprezando o socialismo científico por um vago “socialismo petista”. Em pouco tempo, tornou-se um partido dominado por grupos pequeno-burgueses sem a firmeza ideológica necessária para enfrentar as ideias dominantes na sociedade capitalista, isto é, a ideologia e a moral burguesa.
Começou recebendo doações milionárias para suas campanhas eleitorais. Depois, aceitou a filiação de patrões, que passaram a ser chamados ‘empresários petistas’ e, por fim, passou a defender com unhas e dentes a propriedade privada dos meios de produção e o capital financeiro, sob o argumento de que era necessário para garantir a ‘governabilidade’.
Hoje, vários dirigentes do PT são consultores de grandes empresas privadas nacionais e estrangeiras ou se tornaram – ou seus filhos – empresários. Este é o caso de José Dirceu, consultor de um dos homens mais ricos do mundo, o milionário Carlos Slim, dono da Embratel e da Claro, e do Sr. Nelson Santos, dono da offshore Star Overseas, empresa sediada nas Ilhas Virgens, entre outros megacapitalistas.
De um partido que vivia exclusivamente da contribuição de seus militantes e parlamentares, o PT passou a ser o partido legal que mais recebeu doações de banqueiros e empreiteiras. De 2002 a 2004, as doações dos bancos para o PT pularam de R$ 520 mil para R$ 5,7 milhões, um crescimento de 1.000%. Nas eleições de 2006, o candidato do PT a presidente, Luiz Inácio Lula da Silva, recebeu dos bancos R$ 10,5 milhões.
Aliás, esta íntima relação do PT com os empresários foi definida pelo presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), Paulo Skaf, como “excelente e de carinho”. (FSP, 7/02/10)
Pois bem, como até uma criança sabe, este dinheiro doado por bancos e grandes empresas não é nenhuma caridade desinteressada; ele tem uma finalidade que é a de receber em troca obras, financiamentos e medidas econômicas que os favoreçam quando o partido estiver no governo.
A consequência dessa relação de ‘carinho’ com os empresários, como não podia deixar de ser, foi a perda de influência dos militantes no rumo do partido, o enfraquecimento e a burocratização dos laços com o movimento operário e o abandono das propostas de participação popular nas decisões políticas e econômicas do país.” (A Verdade nº 114, março de 2010)
Quem derrubou a ditadura?
Registremos que, após seis anos dessa declaração, o Sr. Paulo Skaf, presidente da Fiesp, passou a ser um dos principais financiadores das manifestações pelo impeachment de Dilma e propagador da campanha “Chega de pagar o pato”.
Lamentavelmente, mesmo após ser vítima de um golpe tramado e articulado pela grande burguesia nacional, isto é, a classe que é dona dos bancos, das grandes indústrias, dos meios de comunicação, das grandes empresas agrícolas e das terras, o PT insiste em jurar fidelidade não aos trabalhadores e ao movimento popular, mas à própria burguesia. Diz que a existência de um centro democrático é essencial para a democracia e que, graças a ele, derrotamos a ditadura no Brasil e que o PMDB, o tal centro democrático, tem uma parte boa (Renan Calheiros e Sarney) e uma parte má (Cunha e Temer).
Bem, a ditadura militar terminou, mas outra continuou, a ditadura da burguesia. Pois a democracia que temos hoje, como bem demonstra o atual golpe parlamentar, é uma mera formalidade em nosso país. Todas as grandes decisões são tomadas sem a participação do povo e aqueles que se dizem seus representantes são eleitos graças a milionárias campanhas eleitorais.
Depois, a bem da verdade, esse centro democrático não foi o fator principal nem o decisivo para o fim da ditadura militar. Não fossem as greves operárias, as manifestações estudantis e populares, a luta dos revolucionários que pegaram em armas contra o regime dos generais, como Manoel Lisboa, Lamarca, Yara e Marighella, que deixaram suas vidas nas masmorras do regime, o país não teria sepultado o regime fascista em 1985. Em outras palavras, tivéssemos nós esperado por esse “centro democrático”, até hoje teríamos general sendo chamado de presidente.
A luta é pra valer
O fato é que, com a aprovação do impeachment pelo Senado e a confirmação do golpe parlamentar, uma nova etapa da luta de classes se inicia em nosso país. Parte significativa dos trabalhadores conscientes sabe agora que não pode contar com o PT e o PCdoB para realizar profundas transformações na sociedade brasileira, pois esses partidos se aburguesaram, viraram partidos social-democratas defensores da conciliação de classes, do capitalismo e da democracia burguesa, mesmo quando ela mostra sua face de ditadura. Prova disso, é que o deputado Rodrigo Maia, do DEM, um dos principais articuladores do impeachment de Dilma, ao agradecer os votos que lhe garantiu a presidência da Câmara, fez um agradecimento especial ao deputado Orlando Silva, do PCdoB, por ter ido à sua casa defender que fosse candidato, e a Daniel Almeida, líder do PCdoB, pelo apoio que recebeu deste partido.
Este novo período será caracterizado por choques violentos entre o estado burguês e as massas e por grande repressão às lideranças populares e aos revolucionários. Não esperemos vida fácil: se fizeram o que fizeram com a presidenta eleita por 54 milhões de votos, não há limites. Além do mais, em três meses, o Governo Temer mostrou que representa o que tem de mais corrupto, mais reacionário e antinacional na sociedade brasileira. As medidas que pretende adotar vão desde o desmantelamento do SUS (Sistema Único de Saúde) e a privatização da saúde, à cobrança de mensalidades nas universidades públicas, aprofundamento da desnacionalização da economia brasileira; aumento dos gastos com as Forças Armadas; corte de verbas para a moradia popular; aumento da jornada de trabalho e retirada de vários direitos dos trabalhadores; criminalização do aborto e repressão às greves e às ações sindicais.
Por isso, quanto mais cedo derrubarmos o Governo Temer, mais cedo poremos fim ao sofrimento do nosso povo. Para que essa tarefa não fique na metade, é indispensável colocarmos em seu lugar um governo verdadeiramente revolucionário, comprometido com o poder popular, com o fim do domínio dos monopólios e do capital financeiro sobre a economia e a construção de uma sociedade socialista em nosso país.
(Luiz Falcão é membro do Comitê Central do PCR e diretor de A Verdade)
¹Segundo a Constituição brasileira, art. 85, são crimes de responsabilidade condutas que atentam contra a Constituição e, especialmente, contra a existência da União, o livre exercício dos Poderes do Estado, a segurança interna do País, a probidade da Administração, a lei orçamentária, o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais e o cumprimento das leis e das decisões judiciais.
A melhor coisa que poderia ter acontecido para o Brasil foi o impeachment da Dilma, assim tiramos o PT do poder, esse que durante tantos anos a frente da presidência só fez deixar um rombo enorme nos cofres públicos e muitas dívidas para o país. Vi que vc citou o Skaf como apoiador do PT e depois como “traidor”, em algum momento ele pode sim ter apoiado esse partido, mas diante de tudo o que tava acontecendo (e estamos seguindo com os rastros), não tem como uma pessoa inteligente continuar com o apoio ao PT, é só parar e pensar um pouco na nossa situação atual! Ele não tem que pagar o pato e nós tbm não!!!!!