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sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Movimento Negro Perifa Zumbi organiza curso de teatro para militantes da cultura

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PROFESSORA – Vera Lopes, bailarina clássica e professora de teatro e expressão corporal. (Foto: Reprodução)

“Ser Negro é enfrentar uma história de quase quinhentos anos de resistência à dor, ao sofrimento físico e moral, à sensação de não existir, a prática de ainda não pertencer a uma sociedade na qual consagrou tudo o que possuía, oferecendo ainda hoje, o resto de si mesmo.” – Beatriz Nascimento.

Redação Rio de Janeiro

RIO DE JANEIRO – Entendendo a importância de utilizar a arte como ferramenta para a tomada de consciência de si e do outro e a luta contra o racismo, o Movimento Negro Perifa Zumbi em parceria com a Professora Vera Lopes estão organizando durante a quarentena um curso online de teatro para os militantes que constroem nossa cultura popular. Poetas, cantores, rappers, escritores e atores compõem o quadro de artistas que participarão das aulas cuja qual começarão a partir do próximo dia 25.

O curso será conduzido pela Prof.ª Vera Lopes, que leciona dança e expressão corporal para atores na Escola Técnica Estadual de Teatro Martins Pena e é formada bailarina clássica pela Escola Estadual de Dança Maria Olenewa do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. Sua proposta é trabalhar o corpo através da africanidade enquanto político e admitido de função social. Em entrevista concedida pela Professora ao movimento, em parceria com o Jornal A Verdade, além de responder algumas perguntas em relação ao próprio curso ela diz: “Me interessa a essência do movimento, a potência. Poder perceber que aquele corpo é livre na sua majestade, na sua imponência e na sua potência é o que me encanta… é onde acredito que a arte acontece.”

Na sua opinião, qual a importância do teatro e da cultura como forma de resistência negra na luta conta o racismo?

Quando se quer destruir um povo e uma civilização, a primeira coisa feita é destruir a sua cultura. Na situação que o povo preto viveu, ele foi destituído de cultura, de tronco linguístico, de todos seus grupos étnicos. Ou seja, houve uma destruição da cultura enorme, e, no Brasil, nós sabemos quanto o povo preto conseguiu se reorganizar e produzir cultura. Em cada ponto do Brasil há uma manifestação cultural diferenciada e potente, seja no Nordeste, seja em Minas Gerais no Sudeste, no Sul. Então a capacidade que o povo preto tem de fazer cultura, de fazer linguagem sempre foi uma resistência.

E o teatro, no Brasil, a partir de Abdias, foi usado como uma linguagem não só de fazer arte, mas de educação, alfabetização e resistência. O trabalho de alienação, esse trabalho de lavagem cerebral que é feito pelo opressor através de uma cultura de massa, um alimento de baixa qualidade que vem de muito tempo. Então esse caminho da gente usar a linguagem de teatro e exercitar nosso olhar crítico para levantar nossa cultura… é a grande forma de resistência e de penetração que a gente pode ter em uma população que está anestesiada e alienada. Nossa ação é pelos meios de comunicação.

“Enquanto a gente não tiver conhecimento dos nossos avanços na política, no campo da conquista, a gente não consegue avançar na estrutura. Então acho muito importante organizar a partir da consciência, do conhecimento, porque este é o legado que fica pra todas as gerações.”

Qual o objetivo do curso e como será feito?

O objetivo é instrumentalizar o corpo ativista em oposição ao corpo colonizado e docilizado. Assim podemos potencializar o auto-crescimento do cidadão artístico e reconstruir uma corporalidade construída a partir das urgências seculares para a construção de uma unidade criativa decolonial [que combata as influências que o racismo e o colonialismo impuseram na cultura – nota da redação]. O curso, num primeiro momento seria de quatro aulas, mas com esse universo que foi se abrindo, acho que no mínimo teremos oito aulas pra trocarmos algo interessante. Percebo que é necessário um tempo de maturação e depois um tempo de experiência com vocês. Então aquilo que seria um trabalho desenvolvido só em cima da sua poesia de repente me abre uma possibilidade de travar um diálogo que nos permita fazer trabalhos posteriores.

E qual sua expectativa?

Eu tô com uma expectativa muito interessante, porque em função do trabalho que vocês me propuseram eu descortinei uma possibilidade de abordar o corpo de uma forma muito diferenciada. Eu tenho uma inquietude que busca uma função social do teatro, então por isso minha expectativa com vocês é muito grande, porque soma-se ação artística e a pesquisa da linguagem criativa à função social de uma atuação de transformação no mundo. Estabelecemos o contato de um objetivo maior, que não termina na ação artística, na poesia ou na cena. A poesia existe como um meio de uma coletividade que nos interessa na sua transformação.

ALUNA – Maria Cecília, atriz, poeta e militante do Movimento Negro Perifa Zumbi, é uma das alunas do curso. (Foto: Reprodução)
Você tem participado das aulas do curso de Formação Antirracista promovido pelo Perifa Zumbi, como você avalia a importância dessas aulas para a organização da luta do nosso povo?

O que eu acho mais interessante e bonito de vocês é o nível de seriedade que vocês têm sendo tão jovens e com a proposta teórica bastante resolvida. Enquanto a gente não tiver conhecimento dos nossos avanços na política, no campo da conquista, a gente não consegue avançar na estrutura. Então acho muito importante organizar a partir da consciência, do conhecimento, porque este é o legado que fica pra todas as gerações.

A tentativa que se teve em nossos governos anteriores e nesse principalmente, é de apagamento da luta política. Os avanços foram conquistados, mas com grande dificuldade e o apagamento foi contínuo. Por isso retomar a consciência das ações conquistadas é fundamental. É a história do Brasil que nunca se contou. Então é muito bonito, sério e importante o trabalho de vocês, que pensa aliado ao conhecimento teórico uma proposta artística, onde o sentimento tá impresso, onde o afeto tá correndo. Eu acho que qualquer proposta de mudança que a gente vá implantar, precisa ser diferenciado de tudo que a gente já teve na história da humanidade. Precisamos estabelecer uma outra fronteira, e esse avanço eu acho que é a arte e o afeto.

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