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sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Movimento de Luta nos Bairros: “Gente que vai à luta pelo direito do povo”

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ALTO DO PANTANAL – Núcleo do MLB realizou brigadas de solidariedade durante os piores dias da pandemia. (Foto: Jornal A Verdade)
Redação Santa Catarina 
Jornal A Verdade

FLORIANÓPOLIS (SC) – Entre a universidade, o posto de saúde e um centro comunitário abandonado, encontra-se a rua que leva ao Alto do Pantanal, um dos únicos bairros que não está entre os mais de 130 processos de regularização fundiária da cidade. O acesso não é fácil, a rua íngreme e sem pavimentação impede a chegada do transporte público e do Samu. As milhares de pessoas que ali vivem sofrem constantemente com o descaso do poder público, que permite, além de outros problemas, a proliferação de ratos e doenças contagiosas devido à falta de saneamento básico e à ausência da coleta seletiva. A falta de água foi o estopim para que os moradores, junto ao MLB, presente desde abril pela Campanha de Solidariedade, se organizassem para lutar por melhores condições de moradia. Se iniciava ali o germe da organização popular. Essa história é retratada nessa entrevista que o jornal A Verdade, já conhecido pela comunidade, fez com alguns moradores e membros do Núcleo de Base do MLB do Alto do Pantanal.

Qual foi a primeira impressão ao conhecer o MLB?

Marise: Foi uma impressão positiva. É bem difícil de você ver jovens engajados numa luta de interesse popular, né?! Preocupados com os moradores, porque, até então, nunca teve ninguém… Só na época de eleição que eles sobem interessados em pegar votos. Nunca teve um grupo pra dizer: “não, a gente tá aqui pra melhorar a situação de moradia de vocês”. Então é por isso que digo que é interessante de ver jovens em busca desse melhoramento de moradia, saneamento básico, tudo isso.

Jean: A primeira impressão foi meio… O que é isso? Ultimamente, a gente está com uma resistência ao movimento de esquerda, uma por conta do nosso presidente, o Lula, por ter sido preso como um ladrão, que até hoje não foi provado nada, mas, mesmo assim, tá com uma campanha muito ruim e a gente vê a sociedade repudiando o movimento de esquerda. Mas, por mais que a gente olhe a história, sempre vemos a esquerda mais junto da população do que o movimento de direita, que só vai pensar mais nas indústrias, vai pensar mais no sentido de progresso sem considerar o fator humano.

O que te fez ir todos os domingos na encruzilhada para os encontros do MLB?

Marise: Ah, é saber que você tem capacidade de mudança, de melhoria. Acho que não só eu, como todos os moradores. Quando eles passarem a ter o conhecimento que tudo pode melhorar o saneamento básico, água, luz, eles vão vindo. Eu acho que aos pouquinhos vão vindo. Tem aquela desconfiança: “Será que realmente vai dar certo? Eles vão tá aqui ajudando mesmo?”. Então tem toda uma desconfiança porque nunca houve algo parecido. Mas é onde você tem que fazer aquele trabalhinho constante, sempre.

Jean: Olha, primeiramente foi para uma necessidade pessoal, porque eu moro no bairro que não é legalizado, que é um morro irregular. Eu já vi uma casa perto da minha ser demolida sem mandado judicial nem nada. Simplesmente ela foi demolida. Mas tem algo também que me chamava a atenção porque eu me perguntava: “O que eles estão fazendo aqui?! Não tão ganhando nada com isso… tão fazendo o quê, um pessoal jovem fazendo o bairro se unir…’’. Achava interessante essa ideia. Nós, os moradores dentro daqui não conseguia fazer essa união que vocês estavam propondo fazer. E uma coisa fundamental é a energia, o jeito com que vocês acreditam realmente naquilo que estão fazendo, não de uma maneira cega, mas pautada em alguns pilares que eu acho fundamentais que o ser humano deve ter, para ser como uma nação, uma democracia.

Você participava ou via alguma mobilização em prol do bairro?

Marise: Olha, teve dois anos atrás, né? Que tinha a AMAP… E já tem na Prefeitura alguns processos pra ter melhorias de rua, saneamento básico, água, nome pras ruas, mas aí parou. Só que a diferença era que não tinha o movimento que vocês têm. Que vocês vão pra rua se é preciso. Vocês vão pra Prefeitura. Vocês vão, mobilizam as pessoas, explicando. Que tem que ser feito esse movimento para mostrar pra eles que a gente tá acordando pra realidade. Então esse movimento de ir para rua e pra Prefeitura deu uma grande diferença.

Jean: Havia um movimento, uma associação, mas que estava em decadência aqui no bairro. Ninguém queria levantar a bandeira da associação do bairro do Pantanal. Parecida com essa do MLB não havia uma tentativa, mas ninguém tava tão entusiasmado como o pessoal do MLB.

O que você sente que mudou no bairro, com os moradores, após a chegada do MLB?

Marise: Aos pouquinhos tão vindo. Porque a gente conversa com um, explica, conversa com outro. E pode ver que, aos domingos, às vezes é um pouco, outros domingos que já são um pouco mais e eles vão mudando, né?! Mas eu acho que a consciência de cada um. É bem difícil, mas com o passar do tempo a gente vai conseguindo pela conscientização. Hoje foram pessoas ajudar a fazer o cadastro que nunca tinham ido.

Jean: A palavra seria união e trabalho. A união porque nem todo o pessoal estava participando, mas vários estavam ali todo domingo, e trabalho porque a gente tá trabalhando, não apenas teorizando a gente vai à luta.

E em você, o que sente que mudou?

Marise: Em mim? A consciência de ajudar, sabe?! Porque assim, até o momento que a gente tá passando de pandemia, às vezes eu ficava com medo. Minha filha diz que precisa ter cuidado e digo que temos. A gente usa máscara, passa álcool. Mas eu digo, não é porque a gente tem medo que a gente vai deixar de fazer. A gente tem que se prevenir, mas precisa ser feito! Porque se não for agora, até esperar passar tudo é muito tempo. Então em mim o que despertou foi essa consciência.

Jean: Me motivou a participar mais do meu bairro, que não tava participando, a conhecer também melhor o meu bairro.

Na sua visão, quais lutas você se vê travando junto ao MLB?

Marise: Nas lutas que forem necessárias para estar junto em conquista dos benefícios. Se tiver que ir pra rua. Aquele ato ali foi o primeiro movimento que a gente [ela e a filha, de 11 anos] participou. Eu penso que a gente tem que ir pra rua sim, porque a gente não tem água e eles têm que saber que somos seres humanos e precisamos. Porque uns têm direito e outros não têm?! Então a gente tem que estar indo, porque se a gente quer conquistar, a gente tem que ir atrás, tem que ter coragem.

Jean: Uma bandeira que eu levanto, que é levar a luta dos surdos para o MLB. Quem conhece o mundo surdo sabe o quanto o surdo se sente isolado, a maioria dos surdos nasce numa família ouvinte, então nunca tem contato com outros surdos. Então a gente leva essa bandeira para o surdo ter contato com outros e, através disso, desenvolver uma língua para poder organizar sua vida, sabendo que o que organiza a vida da gente é a capacidade de poder se comunicar.

Que recado você deixaria para as famílias de outros bairros, vilas e favelas do país?

Marise: Olha, para aderir ao grupo de vocês. Porque a gente aprende muito, todo mundo aprende. Porque se os moradores não passarem a ter consciência, conhecer, travarem uma luta junto, a gente não consegue. Porque os ricos, os grandes empresários, não vão sair de suas casas para fazer um trabalho que vocês estão fazendo. Então eu deixo um recado para que todo mundo dê apoio. Que esteja junto, que a união de todos faz a diferença. E, quando estão todos juntos por um mesmo objetivo, se tem um futuro melhor de conquista. Porque senão a gente fica aqui fechado como se tivesse uma venda, sem expectativa de melhorar. Então, vamos em busca de melhorias. E aí não é uma melhoria só individual, é pra todo mundo. Essa é a diferença. E é uma coisa que você tem que trabalhar dentro de você. É a consciência. Então todo mundo tendo essa consciência e querer aprender, nunca é tarde.

Jean: Conheça seu bairro, participe dos movimentos que tem no bairro, porque você pode ter sua casa, mas você conhece seu vizinho? Você sabe qual a situação dele? Você se sentiria bem sabendo que ele tá passando necessidade? Às vezes, a gente prefere nem mesmo conhecer para não ficar com o peso na consciência. Mas nós somos humanos, a gente precisa se preocupar com o outro. Acho que o sentido da vida é você conseguir olhar o outro e saber que ele é humano e sofre como você.

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