Desde o início do mês de março, os trabalhadores da educação federal encontram-se em greve. Neste sábado (25), representantes de todas as categorias e de diversos campi da Universidade e do Instituto Federal de São Paulo marcaram presença em evento para reivindicar diretamente ao presidente a recomposição orçamentária da educação federal.
Ester Vitória* | Guarulhos (SP)
Neste sábado (25), o presidente Lula esteve presente em evento que inaugurou a entrega de uma obra na rodovia Dutra, em Guarulhos, próximo ao campus de Guarulhos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). Representantes de todas as categorias e de diversos campi da Universidade e do Instituto Federal de São Paulo marcaram presença para reivindicar diretamente ao presidente a recomposição orçamentária da educação federal. Outro objetivo do ato era entregar ao presidente as cartas com as reivindicações específicas de cada categoria.
A palavra de ordem “Do arcabouço eu abro mão, quero dinheiro pra saúde e educação!” entoou na voz de estudantes, servidores e professores ao longo do evento, em denúncia ao Arcabouço Fiscal (ou “novo Teto de Gastos”), que concentra o orçamento da União no pagamento da dívida pública (isto é, o pagamento de juros a banqueiros e grandes empresários), enquanto bloqueia a verba destinada à educação, saúde e outras demandas sociais.
Desde o início do mês de março, os trabalhadores da educação federal encontram-se em greve por período indeterminado. A greve na educação conta com a adesão de estudantes, que junto aos professores e TAEs (técnicos-administrativos em educação), já somaram cerca de 80 institutos e 50 universidades em greve.
O desmonte dos Institutos Federais de Educação Ciência e Tecnologia
Entrevistamos Cristiane Toledo Maria, professora do IFSP Itaquaquecetuba e membro do Comando de Greve local, que estava presente no ato. Perguntada sobre a atual situação dos IFs, afirmou: “Já tem uns dez anos que o orçamento está sofrendo vários cortes, então o orçamento de dez anos atrás era maior que orçamento de hoje, sendo que os campi cresceram, tem mais alunos. Então a gente está sofrendo um estrangulamento financeiro.”
A maioria dos campi do IFSP não conta com restaurante estudantil, levando os estudantes a assistirem às aulas com a barriga roncando; há defasagem de programas de auxílio e permanência, além dos problemas estruturais, como péssimas condições dos prédios e falta de espaços de convivência, salas de estudo, etc. A defasagem salarial leva os servidores a pedirem exoneração dos cargos e, ao mesmo tempo, não há abertura de concursos, levando a um quadro de funcionários reduzido; os baixos salários também dificultam a contratação de professores.
Ainda assim, diante das manifestações que ocorriam no evento, o presidente Lula relembrou a decisão de criar 100 novos Institutos Federais, ao que Cristiane afirma: “É uma contradição ele anunciar a abertura de 100 novos campi. Não que a gente seja contra, a gente acha que tem que abrir mais, mas se não tem dinheiro nem pra fazer o mínimo para manter a estrutura funcionando […] como que vai ter dinheiro para abrir esses 100 institutos?”
A precarização na Universidade Federal de São Paulo
A reitora da Unifesp, Raiane Assumpção, afirmou recentemente que a universidade só tem recursos para funcionar até setembro deste ano. Na prática, há muito tempo a Unifesp funciona de maneira extremamente precária.
A situação de desmonte é evidente em todos os campi: há mais de 15 anos, se aguarda a entrega do campus definitivo da Unifesp Osasco, em Quitaúna; na Baixada Santista, no início deste ano, estudantes chegaram a passar mal de calor dentro do prédio; a Unifesp Zona Leste sequer possui restaurante universitário (RU); e, para chegar na Unifesp Guarulhos, um estudante trabalhador pode chegar a ficar três horas preso no trânsito.
Além da defasagem salarial dos servidores e professores e da falta de condições de permanência estudantil, constata-se também o avanço da privatização dos setores da universidade. São comuns as denúncias de comida estragada e/ou contendo larvas de inseto nos RUs privatizados, que também já deixaram os trabalhadores terceirizados por meses sem receber.
No ano de 2024, a Unifesp recebeu o menor repasse desde 2014, ao passo que nesses anos houve abertura de novas turmas e novos cursos. A atual verba da Unifesp não contempla o mínimo, porém temos que lutar não só pelo mínimo, mas para que possamos construir coisas novas, para que tenhamos condições de criar inovações científicas e uma nova sociedade.
O descaso do governo federal e a necessidade da luta
Foram, sem dúvidas, os estudantes e trabalhadores da educação que elegeram Lula e derrubaram Bolsonaro, aguardando o cumprimento das promessas de investimento na educação.
O grevista e servidor técnico-administrativo do IFSP, Sidinei Roberto, afirmou: “Uma outra pauta muito importante para a gente é a revogação de uma série de medidas que foram tomadas nos governos anteriores, nos governos do fascismo, e que não foram revogadas […]. Se é um governo que se diz progressista, o mínimo que ele tem que fazer é revogar as medidas que atacam a educação, como o Novo Ensino Médio”
Durante o ato, a presidência se negou a receber e dialogar com os estudantes e trabalhadores que reivindicavam seus direitos. Às pressas, os TAEs conseguiram entregar sua carta reivindicatória e os professores da Unifesp conseguiram marcar uma reunião em Brasília. Os estudantes, categoria mais fragilizada pelo desmonte da educação federal e responsáveis por vanguardear a manifestação, por pouco não ficaram no completo desprezo.
Foi então organizado um pequeno encontro entre o ministro das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, e representantes das categorias da educação federal de São Paulo, sendo permitida a participação de apenas um estudante. As cartas reivindicatórias dos professores e estudantes foram entregues ao ministro, que não deu nenhum compromisso de negociar e atender às demandas, mas apenas um discurso repleto de desculpas esfarrapadas, de que eles “entendem a situação, mas lá em Brasília é muito difícil”.
Fica cada vez mais nítido que a única saída para uma educação popular é a luta coletiva e organizada e que nada adianta esperar favores de políticos que não nos servem. A esse respeito, o estudante de Engenharia Mecânica, Micael Moreira, faz um chamado:
“Eu queria chamar todos os estudantes a participarem do movimento estudantil […]. A gente não pode ficar achando que vai ter bandejão, que vai ter PAP [Programa de Auxílio Permanência], auxílio moradia… se nós não integrarmos o movimento estudantil”.
Não vamos cessar as mobilizações. Só a luta muda a vida e só o povo salva o povo!
*Estudante e membro do Comando de Greve da Unifesp Guarulhos