Livros de autoajuda, jornais e, mais recentemente, com as redes sociais, somos condicionados a viver em competição, a enxergar o outro como concorrente e a medir nosso valor pessoal com base em resultados. Isso gera uma sensação contínua de fracasso ou insuficiência, já que o sucesso, nos moldes capitalistas, é para poucos.
João Pedro Souza | Redação PE
SAÚDE – A relação entre saúde mental e capitalismo é algo que nos dias atuais não pode mais ser ignorado. Desde cedo, com livros de autoajuda, jornais e, mais recentemente, com as redes sociais, somos condicionados a competir, a enxergar o outro como concorrente e a medir nosso valor pessoal com base em resultados. Isso gera uma sensação contínua de fracasso ou insuficiência, já que o sucesso, nos moldes capitalistas, é para poucos. Trabalhar cada vez mais, com menos garantias de estabilidade e sem uma rede de apoio adequada, tem levado cada vez mais pessoas ao esgotamento emocional.
O ambiente de trabalho reflete essa lógica, com metas inalcançáveis e exigências excessivas, impactando profundamente o psiquismo dos trabalhadores. A ansiedade passa a estar na ordem do dia, e episódios de depressão, esgotamento e outros transtornos mentais afetam pessoas que muitas vezes nem têm tempo ou recursos para procurar tratamento, dado que o acesso à Rede de Atenção Psicossocial – RAPS, no SUS, ainda é limitada em várias cidades do país.
O ambiente corrosivo do capitalismo afeta diretamente a classe trabalhadora, que sofre com a precarização das condições de trabalho. Com a flexibilização das leis trabalhistas, aceleradas pela Reforma Trabalhista de 2017, no qual os trabalhadores estão sofrendo com jornadas exaustivas, salários baixos e a constante ameaça de demissão. Ademais, o clima de insegurança financeira todos os meses, não afeta apenas a sobrevivência material, mas também abala profundamente o psicológico, criando um clima na classe trabalhadora de incerteza e medo constante. A falsa promessa de “sucesso financeiro” e “ascensão social” é um elemento-chave na manutenção desse ciclo, pois as pessoas são levadas a acreditar que o esforço individual é suficiente para alcançar uma vida melhor, ignorando as barreiras estruturais impostas pelo próprio sistema.
Na verdade, o culto ao sucesso pessoal é uma forma de manter as pessoas insatisfeitas com suas vidas. As metas são sempre inatingíveis, e a comparação constante com outras pessoas — agora amplificada pelas redes sociais — reforça a ideia de que nunca seremos suficientes. Essa frustração contínua afeta a autoestima e os sentimentos de valor pessoal e sentimento coletivo, exacerbando o surgimento de fobias sociais no desenrolar das telas dos celulares.
É fato que as redes sociais, por sua vez, poderiam ser espaços de ligação e apoio entre as pessoas. Contudo, são moldadas por algoritmos que promovem a alienação e a comparação constante. Cada curtida e comentário oferecem um breve momento de validação, que rapidamente se esgota, criando um ciclo vicioso de solidão e baixa autoestima. A solução oferecida? Mais consumo, medicamentos, livros e programas de autoajuda, vendidos como a saída mágica para males que, na verdade, têm raízes muito mais profundas e complexas. O fato é que sem uma mudança estrutural, essas opções se limitam muitas vezes a paliativos, incapazes de resolver a verdadeira causa do problema.
É importante destacar que o individualismo que rege o capitalismo impede a construção de laços fortes e saudáveis. O outro é visto como um meio para atingir objetivos pessoais, seja no trabalho, nos relacionamentos amorosos ou até nas amizades. Isso desumaniza as interações e nos impede de sentir e fornecer apoio emocional verdadeiro uns aos outros. Com isso, a saúde mental piora à medida que o isolamento emocional e a desconexão social se tornam mais frequentes.
Ainda no mundo do trabalho, a ideia de que o trabalhador precisa estar disponível a qualquer momento, seja através de e-mails, mensagens ou até redes sociais, cria um ambiente de vigilância constante por parte dos patrões, onde nunca se está realmente desconectado do trabalho. Esse estresse prolongado também deteriora a saúde mental e leva muitos à exaustão completa. E, mais uma vez, a responsabilidade recai sobre o indivíduo, que é encorajado a “cuidar de sua saúde mental” mas sem os incentivos e as condições necessários para que isso ocorra de fato, dado que suas próprias limitações socioeconômicas e problemas estruturais das cidades caóticas não permitem que os trabalhadores tenham direito ao lazer e ao seu autocuidado.
O capitalismo nos coloca enquanto produtos do próprio sistema. Números e metas a bater para enriquecer os grandes ricos. A saída desse ciclo passa por uma compreensão mais ampla de que o problema não está nas pessoas, mas no sistema. Somente através da coletividade e da solidariedade é possível enfrentar essas questões e criar um ambiente onde a saúde mental seja uma prioridade de saúde pública, e não uma preocupação secundária ou um luxo acessível a poucos. Somente no governo revolucionário dos trabalhadores, no governo socialista, numa produção socializada, esse ambiente é possível.