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sexta-feira, 29 de março de 2024

Mineradora Yamana Gold é investigada e exames técnicos apontam contaminação

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O Jornal A Verdade investigou inquéritos e relatórios relacionados a mineradora Yamana Gold e os levantamentos apontam para uma série de riscos ao meio ambiente.

Raí Macedo Carneiro 
Jacobina, Bahia


Foto: Divulgação


BRASIL – Atualmente, nós, brasileiros, vimos e ouvimos nos meios de comunicação as trágicas notícias sobre os desastres envolvendo as mineradoras da Vale em Minas Gerais, pois, por muito tempo, vamos lamentar e rememorar as vidas ceifadas em Brumadinho e em Mariana. Mas como o Brasil é um país de dimensões continentais, outro estado que tem grande presença dessas mineradoras é a Bahia. A multinacional canadense Yamana Gold é a responsável, desde 2006, pela exploração de ouro na cidade de Jacobina, localizada na região norte e distante aproximadamente 344 km da capital baiana. Segundo informações do Ministério Público da Bahia, é uma das maiores que operam no estado, ocupando uma área de 270 hectares.

A multinacional vem desenvolvendo ações no âmbito da comunidade jacobinense. Coordena e incentiva projetos da sociedade civil organizada que, segundo informações de seus comunicadores, alcança milhares de pessoas. O Recicla Jacobina, uma cooperativa de coletores de materiais recicláveis da cidade que contribui enormemente para o meio ambiente e que tem até mesmo ganhado prêmios nacionais e regionais de excelência, também já foi apoiado por ela. Por sua vez, o Instituto do Meio Ambiente do Estado (Inema) executa as políticas estaduais no âmbito da proteção ao meio ambiente e educação ambiental e respectivamente realizou os exames técnicos que serão demonstrados neste artigo.

Em relação aos cuidados com a proteção do meio ambiente, a Yamana Gold e o Inema vêm se omitindo de suas responsabilidades. Mais adiante veremos algumas informações que nos fazem perder a confiança nas atividades de uma grande multinacional do ouro que opera em seis lugares no mundo e até mesmo nas instituições de nossa prezada democracia, pois, em relação à primeira, seu objetivo primordial é a obtenção do lucro em detrimento de outras responsabilidades que lhe são atribuídas. O lucro é a lógica. Já em relação à segunda, é interessante não perdemos totalmente a confiança, mas a falta de uma atuação mais efetiva ajuda a manter a ideia de que o que é público é ruim ou ineficiente. Por isso, a razão das críticas e informações seguintes, que também têm o objetivo de fornecer argumentos mais coerentes à população.

Como sabemos, enquanto característica própria da atividade de uma mineradora, há todo um impacto ambiental, gerando desmatamento e degradação. Aqui em Jacobina, além do medo provocado na comunidade pelas duas barragens de rejeito localizadas a poucos quilômetros da cidade, a multinacional também está sendo investigada pelo MP-BA, em âmbito ambiental, sobre denúncias de contaminação dos recursos hídricos e do meio ambiente com as substâncias utilizadas na mineração. São vários os insumos utilizados no processo e um dos principais deles é o cianeto.

De acordo com as informações e os autos do Inquérito Civil nº 702.9.76928/2017, da Promotoria de Justiça Especializada em Meio Ambiente em âmbito regional, com sede em Jacobina, e o Relatório Técnico nº 13/2017 do Inema, tanto a Yamana Gold demonstra ser omissa para com a atenuação dos impactos ambientais, quanto o próprio Inema faz pouco caso no tocante à fiscalização das atividades da mineradora. No inquérito há várias citações sobre a falta de documentos fiscalizatórios e a perceptível morosidade na realização das inspeções, a exemplo das galerias subterrâneas que alcançam ao todo 20 km de extensão e que o Inema parece deixar de lado.

O inquérito também traz denúncias de três moradores da localidade de Itapicuru, área de impacto direto da mineradora. Esses cidadãos, no ato da denúncia no dia 17 de abril de 2017, informaram sobre a mortandade de 23 animais no local desde o dia 13 de abril. Também fizeram vídeos e fotos de um vazamento advindo da tubulação da mineradora Yamana Gold, que dava diretamente no Rio Itapicuruzinho, sendo que nas imagens é possível ver os materiais plásticos e metálicos sendo carreados diretamente ao rio.

É um descaso com o meio ambiente essa situação da Yamana Gold em Jacobina, que vem se arrastando durante muito tempo, pois no mesmo inquérito podemos ver outras investigações sobre o descaso com o meio ambiente e até mesmo sobre multas dirigidas à empresa. Em relação ao relatório do Inema, recolheu-se um total de 38 amostras, sendo que 21 de águas, 12 de sedimentos, dois de efluentes e três de solos. Dessas 21 amostras de águas recolhidas para os exames técnicos, 14 delas revelaram contaminação com mais de um elemento químico, ou seja, apresentaram desconformidades com a Resolução do Conama nº 357/2005 – que dispõe sobre a classificação dos corpos de água e diretrizes ambientais para seu enquadramento, como também estabelece as condições e padrões para lançamento de efluentes e outras providências – e o mais visto entre esses elementos é o cianeto.

Os pontos que ocorreram maiores contaminações foram o Riacho do Cuia (A-05), com os elementos Ph (acidez), alumínio solúvel, alumínio total, íon sulfeto e cobre; no represamento e no rio do Itapicuruzinho (A10/11), com desconformidades para os elementos Ph, alumínio solúvel, ferro, cobre e manganês total; e no Riacho Canavieiras (A08), onde foram encontradas seis desconformidades para os elementos água salobra, cianeto livre, cianeto total, nitrogênio amonical, cobre e manganês total.

Outro ponto de coleta que apresentou resultados preocupantes foi o ponto (A07) Barragem de Canavieiras/Embasa, pois nessa barragem é captada 70% da água para o consumo humano da cidade. Segundo os exames, ela estava com índices elevados de íon sulfeto, nitrogênio amonical e manganês total. No inquérito civil citado acima, outro ponto de coleta foi a Área da Mina Complexo Ambiental (A20), que segundo a mineradora se trata de “água limpa”. Os resultados apontaram contaminação elevada para os elementos cianeto total, alumínio total, íon sulfeto e manganês solúvel. Aquela água é usada para irrigação das mudas do complexo ambiental, ou seja, vai parar no lençol freático e num futuro próximo vai prejudicar mais ainda o meio ambiente.

Sobre os resultados dos exames realizados nos sedimentos, a situação também é preocupante, pois apontam que nos 12 pontos coletados, seis apresentaram desconformidades com as normas para o parâmetro mercúrio, e detectam a presença de cianeto em oito dos 12 pontos coletados, assim como também índices elevados de alumínio total e ferro total. O mercúrio e demais substâncias citadas, em pequenas quantidades nos organismos e no meio ambiente, são responsáveis por efeitos danosos em seu funcionamento e manutenção, além de serem cumulativos.

É importante deixar claro que a Yamana Gold usou o discurso histórico de que o uso de mercúrio “vem desde muito tempo”. Aqui houve muito garimpo na época colonial, é fato, mas ela usou do conhecimento histórico para tentar amenizar sua situação perante as investigações do MP-BA. Em contraponto, é importante frisar que no período colonial as técnicas de exploração eram mais rústicas devido à falta de tecnologia mais avançada, e que jogar a culpa para o garimpo de um período distante e em pontos relativamente distantes um do outro para tentar se eximir de suas responsabilidades para com a preservação do meio ambiente não é nada plausível.

Em relação às duas amostras de efluentes coletadas para os exames, uma delas apresentou índice elevado de Ph – que indica a acidez ou basicidade de uma solução aquosa –, que foi o efluente da ETA- Embasa, indicando o percentual de 9,32%. Nos solos foi detectada a presença de produtos derivados do petróleo, pois há muita movimentação de carros e caçambas nas áreas do empreendimento.

Foto: Divulgação


Outro dado preocupante trazido à tona pelo IC diz respeito à falta de atenção dada pela própria mineradora no tocante ao monitoramento das águas e de suas barragens de rejeito. No período de 2012 a 2017, a mineradora realizou apenas 11 coletas de água para monitoramento, não contemplando todos os parâmetros de análise estabelecidos pela norma do Conama nº 357/05 e Portaria nº 2.914/2014. E, para piorar, não foi dito como se realizaram os procedimentos e os seus respectivos locais de coleta. O MP-BA também desconhece os Relatórios Técnicos de Auditorias da Barragem de Rejeito II entre os anos de 2010 e 2018.

No final do inquérito foi prorrogado o prazo para conclusão e diligências dessas denúncias através da Promotoria Especializada em Meio Ambiente com sede em Jacobina e também foi chamada uma audiência pública que ocorreu no dia 19 de setembro de 2018, que acabou debatendo essas diligências durante todo o dia. Para quem participou da audiência ficou claro que a empresa colocou seus trabalhadores e trabalhadoras em peso para defendê-la, com muitos cartazes de apoio, alguns dizendo: “se a mineradora parar, o comércio também para!”, “o que a CPT fez por Jacobina?”, “queremos nossos empregos”. Houve a presença em menor quantidade da sociedade civil organizada e de alguns cidadãos preocupados com o assunto. Essas informações e outras muito preocupantes são encontradas no IC nº 702.9.76928/2017 e no Relatório Técnico nº13/2017 do Inema.

Nós, que pregamos o Socialismo, entendemos que enquanto cidadãos, fazemos parte da mesma comunidade e que cada um é responsável por seus companheiros e companheiras. Preocupa-me bastante o fato de que nosso povo possa contrair doenças altamente perigosas como o câncer, a silicose, o Alzheimer, e ainda correr perigo com uma barragem que tem capacidade de armazenamento de 23 milhões de metros cúbicos de rejeito, tudo isso decorrente de ações de uma empresa multinacional que visa, primordialmente, o lucro, e acaba deixando de lado as responsabilidades com o meio ambiente e as pessoas do local.

Vivemos um lugar de belas paisagens e de um potencial turístico e ambiental muito grande. Aqui em Jacobina, só nas áreas de outorga de exploração do ouro se encontram mais de 105 nascentes de água, assim como também fauna e flora diversificadas. A conscientização das pessoas sobre os problemas que afetam a cidade é um passo fundamental para que exerçamos melhor nossa cidadania.

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