A privatização da saúde pública não é um ato isolado. Há, na verdade, um processo de construção das condições que vão permitir a instrumentalização do projeto de privatização. Os governos de direita têm papel fundamental nesta construção.
Ludmila Outtes
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BRASIL – O Sistema Único de Saúde (SUS) foi oficialmente criado em 1988, com a Constituição Federal, e regulamentado em 1990, com a Lei 8.080/90, e teve seu modelo baseado principalmente no modelo de saúde de Cuba, com a atenção primária como carro-chefe do sistema, devendo ser a porta de entrada da saúde e ter como regra a promoção à saúde e a prevenção de doenças.
O SUS possui como princípios a universalidade (acesso para todos), a equidade (mais aos que mais necessitam) e a integralidade (garantia de integração dos diversos serviços de saúde, entendendo a ação social no somatório dos condicionantes da saúde ou doença). Outra característica do SUS é sua gratuidade e a gestão pública dos serviços. Porém, com o avanço das políticas liberais e de mercantilização dos serviços públicos, a terceirização tomou conta de vários setores do nosso país e, dentre eles, a saúde figura como um bom espaço de lucro.
Um modelo de terceirização e antessala da privatização ganhou muito terreno em Pernambuco: as Organizações Sociais da Saúde (OSS). Unidades de saúde construídas com dinheiro público (novas ou reformadas) são entregues para gestão da iniciativa privada, que recebe vultosos recursos para gerenciar o serviço. No estado, a principal OSS é o Instituto de Medicina Integral de Pernambuco Professor Fernando Figueira (IMIP), que tem como um dos donos Antonio Figueira, filho do fundador do IMIP e braço direito do atual governador, Paulo Câmara (PSB).
Segundo dados do Portal Transparência do Estado, em 2017, os gastos com as OSS em Pernambuco atingiram as cifras de R$ 783 milhões, enquanto as unidades de administração direta tiveram apenas R$ 276 milhões em repasses. A comparação fica mais absurda quando analisamos os repasses especificamente por hospital: o Hospital da Restauração, maior hospital de Pernambuco (conta com 704 leitos oficiais – com a superlotação, seguramente passa dos 800 leitos –, sendo 53 leitos de UTI) e referência Norte/Nordeste em neurocirurgia e atendimento à grandes queimados, recebeu durante todo o ano R$ 89.653.428,64, enquanto o Hospital Pelópidas Silveira (184 leitos, sendo 30 de UTI), construído com a promessa de desafogar os leitos de neurocirurgia do Hospital da Restauração, recebeu R$ 74.771.707,81. Ou seja, o HPS recebeu 83% do valor do HR para atender 28%, em média, da demanda.
Em 2019, dados de janeiro a meados de agosto revelam que a diferença cresceu: foram R$ 781 milhões destinados às OSS e R$ 183 milhões para a administração direta (dados retirados do Portal Transparência no dia 16 de agosto).
Vale destacar que, além da garantia de não haver superlotação – os hospitais geridos por OSS fecham as portas da emergência antes de atingirem o limite dos leitos ocupados, enquanto os hospitais de administração direta não podem se negar a receber pacientes mesmo quando não existem mais leitos vagos, criando assim os leitos “extras” (macas improvisadas como leitos hospitalares) –, as unidades geridas por Organizações Sociais normalmente atendem pacientes com menor gravidade (e, quando ocorre agravamento no quadro, os pacientes são transferidos para outras unidades), o que, consequentemente, traz menos gastos ao hospital e também traz melhores índices, como menor taxa de mortalidade, por exemplo.
Assim, na propaganda, as unidades administradas pelas OSS apresentam muitas vantagens: estrutura física impecável, pacientes mais estáveis, menores índices de infecção hospitalar e mortalidade, etc. E aí o governo vende a ideia de que privatizar é a solução para a saúde.
Defender o Público e Gratuito
O que o brasil precisa para ter uma saúde gratuita de qualidade não é terceirizar o serviço, pois já se comprovou que a terceirização sai mais cara aos cofres públicos e não há uma real melhora no atendimento, mas apenas uma maquiagem do serviço.
Vamos erguer as bandeiras pelo fim da mercantilização da saúde, colocar a gestão e o poder público nas mãos do povo, a exemplo de Cuba, que possui hoje uma medicina avançada e acessível a todos, apesar do duro bloqueio econômico que sofre desde a Revolução, em 1959.