Editorial do Jornal A Verdade, edição nº 222, página 2.
Redação
Jornal A Verdade
BRASIL – A natureza e o povo brasileiro, em particular, o nordestino, são vítimas de dois grandes crimes: o primeiro é óleo derramado por um navio tanque de uma das grandes companhias petrolíferas privadas; o segundo é a omissão do Governo do capitão reformado Jair Bolsonaro, que prefere viajar no avião presidencial e se hospedar em hotéis internacionais de luxo, do que proteger o meio ambiente. Com efeito, após as queimadas na Floresta da Amazônia, toneladas de petróleo cru foram despejadas no mar brasileiro e atingiu 266 localidades, 94 municípios de nove estados e 2.330 km da costa litorânea.
A falta de ação do Governo é tão grande que, no dia 17 de outubro, o Ministério Público Federal entrou com ação pedindo que a Justiça Federal obrigasse a União a colocar o plano de contingência em ação em 24 horas. Assinada pelos procuradores da República de todos os estados atingidos pelo óleo, a ação afirma que “se o Estado falha, por omissão total ou parcial, seja no exercício do poder de polícia administrativa, seja como agente de imputação de responsabilidade aos infratores ambientais, descumpre seu poder-dever de proteção”.
Para o Ministério Público, “a situação se agrava e, apesar de tudo isso, sem qualquer justificativa plausível, a União, embora figure como Autoridade Nacional, simplesmente insiste em não implementar o plano”.
O documento critica o governo pela reação limitada para conter as manchas de óleo, as quais descreve como o maior desastre ambiental da história no litoral brasileiro em termos de extensão.
“A União se limita a fazer limpeza de praias, a passos lentos, e também prossegue em sua omissão reiterada de não adotar medidas protetivas às áreas sensíveis”.
O MPF destaca o trabalho dos voluntários, dos servidores públicos municipais, estaduais e federais, que “têm trabalhado e se dedicado muito, por toda a Região Nordeste, em atividades que levam à exaustão, fator que merece registro e reconhecimento”.
O desprezo do Governo com o povo nordestino e a natureza é tamanho que o ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antônio, denunciado por corrupção eleitoral, colocou os pés num determinado trecho da Praia do Muro Alto, em Pernambuco, e afirmou que a praia estava “completamente apta à frequentação de turistas”. No entanto, no mesmo dia, a Agência Estadual de Meio Ambiente, considerou que “a praia estava imprópria por ainda ter óleo visual”. Pena que o ministro do Turismo não viu.
O Mistério Está no Ar
Como uma quantidade tão grande de petróleo caiu no mar sem a marinha brasileira nada ver?
O comandante de operações navais da Marinha brasileira, almirante Leonardo Puntel, disse, em entrevista à imprensa, que o óleo “muito provavelmente” veio de algum navio e que cerca de 140 embarcações passaram pela região no período do vazamento, mas que é impossível saber de qual deles saiu o óleo. Até então, pensava-se que a Marinha existia para proteger o mar brasileiro e ser responsável pelo policiamento da costa.
A Petrobras distribuiu nota afirmando que “a análise realizada em amostras de petróleo cru encontrado em praias do Nordeste atestou, por meio da observação de moléculas específicas, que a família de compostos orgânicos do material encontrado não é compatível com a dos óleos produzidos e comercializados pela companhia”.
Algumas evidências, porém, levam a suspeitar do envolvimento da transnacional Shell. De fato, um tambor de 200 litros de óleo com o logotipo da Shell foi encontrado nas proximidades da Ponta de Tabatinga, a 7,4 km da costa de Natal, no Rio Grande do Norte. Segundo a Marinha, o tambor vermelho estava boiando no mar quando foi avistado e recolhido. Mais: algumas semanas antes, dois testes realizados pela Universidade Federal de Sergipe (UFS) concluíram que o óleo vazado de outros barris também da Shell encontrados no litoral do Estado é idêntico ao das manchas de óleo que atingiram a costa do Nordeste.
No entanto, como se trata de uma poderosa companhia internacional de propriedade de grandes capitalistas e bancos, os meios de comunicação da burguesia se calam e propagam que o óleo é um mistério no mar. A última versão do Governo é, inclusive, de que o petróleo foi derramado por um “dark ship”, ou navio fantasma.
Será? Em entrevista à BBC, o oceanógrafo Tarcísio A. Cordeiro, professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) e do laboratório de Ecologia e de Sistemas Costeiros, declarou que encontrar os responsáveis é possível: “A imagem em tempo real está aí, disponível. É só juntar os pedacinhos, rodar o relógio ao contrário”. Segundo ele, há uma série de ferramentas na internet que permitem identificar em tempo real a posição e a rota das embarcações por satélite, além de mapear o histórico do tráfego – serviços semelhantes existem também para aviões.
Já a doutora em planejamento ambiental pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), Cristiane Jaccoud, afirmou que a principal hipótese para a origem do óleo é um descarte irregular e afirma que é a primeira vez que ela vê um vazamento tão grande demorar tanto tempo para identificar o responsável.
Enquanto isso, dezenas de milhares de trabalhadores do mar e de pessoas que vivem do comércio nas praias estão sem poder trabalhar e se juntam aos mais de 12,5 milhões de desempregados existentes no país. Apenas em Pernambuco, de acordo com o IBGE, há 30 mil pescadores e pescadoras. Todos estão sem trabalho há mais de 60 dias. O Governo Federal, com sua mesquinharia, até agora, liberou o seguro-defeso para somente 400 pescadores. Não há, pois, como se calar diante dos seguidos atos desse desgoverno. É preciso agir e lutar para pôr fim a todas essas arbitrariedades com o nosso país e o nosso povo.