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terça-feira, 19 de novembro de 2024

Juiz determina que ossadas de Perus continuem sendo analisadas no CAAF-Unifesp

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Grande vitória dos familiares! Entenda a importância desta vitória na matéria a seguir.

Vivian Mendes
Membro da Comissão de Familiares de Mortos e Desaparecidos políticos e Presidenta da Unidade Popular – São Paulo

Foto: Vivian Mendes / A Verdade

SÃO PAULO – O cemitério Dom Bosco, conhecido como cemitério de Perus devido ao bairro onde fica localizado, foi criado em 1971 pelo então prefeito Paulo Maluf. Desde sua concepção, uma série de suspeitas rondavam o local, já que foi projetado inicialmente para comportar um crematório, porém sem capela ou local para velar corpos a serem cremados.

De fato, o cemitério foi utilizado nos anos 70 para enterrar e ocultar corpos de militantes contrários à ditadura, bem como de vítimas de esquadrões da morte e crianças que vieram à óbito em um surto de meningite que atingiu a cidade, mas que a ditadura quis camuflar.

Apesar de familiares de desaparecidos políticos desconfiarem que ali haviam sido enterrados seus entes e que havia uma vala comum clandestina para isso, apenas em 1990 com o apoio da então Prefeita de São Paulo Luiza Erundina, a vala pôde finalmente ser aberta e iniciados os trabalhos de identificação das vítimas.

Cerca de 1500 ossadas foram encontradas na vala comum, porém, aproximadamente 500 pertenciam a crianças, portanto muito frágeis e impossíveis de serem identificados.

Foi então criada a CPI de Perus, ligada à Câmara Municipal de São Paulo, que auxiliou os familiares de mortos e desaparecidos a acessar documentos importantes do cemitério e de outros órgãos de repressão. Desta forma, restos mortas de militantes foram encontrados enterrados em covas individuais, sob nomes falsos, e chegou-se também a nomes de alguns militantes que, provavelmente, estariam enterrados na vala clandestina.
Nestes quase 30 anos desde a abertura da vala, uma série de novas violações de direitos aconteceram. Muita lentidão e descaso dificultaram a identificação até hoje.

A UNIÃO no banco dos réus

A União foi condenada em 2010, em ação civil pública movida pelo MPF, a identificar as ossadas. Porém, apenas em 2014 o trabalho foi, de fato, retomado.

O Estado queria, a princípio, que as ossadas ficassem sob responsabilidade do IML, o que era rechaçado pelos familiares, já que este foi um dos órgãos diretamente responsáveis pela ocultação de cadáveres emitindo atestados de óbito falsos.

Foi então que, por intercessão da Comissão da Verdade do estado de SP, mediada pela então ministra Eleonora Menicutti, a Unifesp assumiu o desafio de entrar como entidade parceira na solução deste impasse e, então, criou o Centro de Antropologia e Arqueologia Forense (CAAF).

A partir disso firmou-se um termo de cooperação entre a União, Unifesp e Prefeitura de São Paulo para dar continuidade ao processo de análise e identificação das ossadas.

Este importante trabalho foi realizado com primor e respeito até o momento e, inclusive, foi responsável pela identificação de dois desaparecidos políticos: Dimas Casemiro e Aluísio Palhano.

Porém, os diálogos com o Governo Federal têm sido cada dia mais difíceis em relação ao tema. O Ministério da Mulher, da família e dos direitos humanos têm desmontado as estruturas de busca da verdade histórica em nosso país. Além do sucateamento da Comissão da Anistia, a presidenta da Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos – responsável pela condução, por parte da União, do termo de cooperação – Eugênia Gonzaga, foi demitida sem justificativas em agosto deste ano e substituída por um militante do PSL, reconhecido por menosprezar os direitos humanos.

Não bastasse, na audiência de conciliação (realizada todos os meses com presença das 3 entidades envolvidas no acordo) que aconteceu em novembro, os representantes da União apresentaram a proposta de interrupção das análises no CAAF e que as ossadas fossem enviadas para a Polícia Civil em Brasília para continuidade do processo alegando redução de custos.

Os familiares receberam a informação com indignação, se mobilizaram, produziram um documento público aos envolvidos com assinaturas de cerca de 100 familiares exigindo o seguindo dos trabalhos tal como estão sendo realizados.

A nova audiência de conciliação, realizada em 09 de dezembro, contou com a presença de dezenas de familiares e defensores dos direitos humanos e, com apoio do MPF, da Unifesp e de representantes da Prefeitura, o juiz não concedeu a mudança solicitada pela União. As ossadas continuarão sendo analisadas no CAAF e nós precisamos dar visibilidade para esta vitória, porque, certamente, os ataques do Governo Bolsonaro não cessarão por aí.

Manoel Lisboa e Emmanuel Bezerra, presentes!

Importante rememorar que, graças ao trabalho da CPI de Perus nos anos 90, os familiares tiveram acesso aos documentos que nos levaram a identificar os restos mortais de Manoel Lisboa e Emmanuel Bezerra, enterrados no cemitério Campo Grande, na zona sul de São Paulo.

Os restos mortais desses heróis do povo brasileiro foram enviados para suas cidades de origem e recebidos com as homenagens que merecem.

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