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terça-feira, 19 de março de 2024

A crise do Coronavírus na Região do ABC Paulista

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Foto: Rubens Cavallari/Folhapress

Por Amanda Bispo, João Coelho e Reinilson Câmara
Santo André, São Bernardo e Mauá – São Paulo

A Região do Grande ABC Paulista registrou no dia 15 de março seu primeiro caso de contaminação por Covid-19 e no dia 25 de março o primeiro óbito causado pela doença. Até 15 de maio foram registrados 3.493 casos e 353 óbitos nas 7 cidades da região e a previsão é de que se completem 60 dias após a primeira morte, em 25 de maio, com mais de 400 óbitos. Os números são assustadores, além da alta quantidade de mortos, a letalidade da doença na região (10,1%) é maior que no Estado de São Paulo (7,7%) e no país (6,8%). A quantidade de mortes na região tem dobrado a cada 9 dias.

Esses dados, apesar de já demonstrarem um cenário caótico, são muito piores na realidade, já que a subnotificação, assim como em todo o país, é muito grande. Mais de 6 mil pessoas passaram pelo sistema de saúde da região com sintomas de Covid-19 e, por falta de testes, não tiveram seu diagnóstico confirmado. São 66% dos casos sem exame. Só em São Bernardo, cidade com o maior número de casos e mortes, são 4041 casos ainda em investigação e a cidade não tem testes suficientes nem mesmo para todos os trabalhadores da saúde que estão com suspeita de ter contraído o vírus.

A previsão é que nos próximos dias e semanas esses números apresentem grandes saltos. A doença tem se alastrado nas periferias das cidades, onde a tendência à contaminação e mortes é maior devido à falta de condições sanitárias, abastecimento de água, coleta de lixo e de esgoto adequadas, somado às más condições de moradia e à impossibilidade de manter a quarentena por questões financeiras. Nas cidades de Mauá e de Diadema, onde estão os bairros mais empobrecidos da região, essa situação pode ser ainda mais grave.

A relação entre a letalidade da doença e o nível de renda das pessoas demonstra como a doença atinge mais os pobres. A cidade de São Caetano, que possui PIB per capita de cerca de 78 mil reais (o maior da região), já atingiu uma taxa de infecção de 399 por 100 mil habitantes e ao mesmo tempo tem a menor letalidade da região, de 4,1%. Já em Mauá, os números são bem diferentes: com um PIB per capita de 22,7 mil reais (o terceiro menor do ABC), possui uma taxa de infecção de 61,3 por 100 mil habitantes, mas a letalidade é de 15,2%, a maior da região.

Esses números deixam claro como as condições de acesso à saúde são determinantes para a sobrevivência nesse momento. Aqueles que possuem acesso ao sistema de saúde sobreviverão, enquanto o povo mais pobre da região será devastado pelos efeitos da pandemia.

A que se deve, no entanto, essa situação? Será impossível defender a vida das famílias contra as consequências da chegada do novo coronavírus?

Foto: Angelo Baima/PSA

A cidade de São Bernardo, com 122 mortos, é a mais afetada da região. Desde o início da pandemia o Prefeito Orlando Morando (PSDB) tem dado entrevistas nas rádios, na televisão, em jornais impressos e em transmissões pela internet defendendo a quarentena e dizendo que está fazendo de tudo para conter o avanço da doença, porém a situação é grave. O município tem 1,67 médicos para cada mil habitantes, abaixo da média do ABC (2,10), da média estadual (2,7) e até mesmo da média nacional (2,11), o que dificulta o atendimento da população.

O déficit habitacional em São Bernardo, se for somado às famílias que não possuem moradia e às famílias que moram em condições precárias, ultrapassa 50 mil casas. Isso se agrava ainda pela sistemática e inconstitucional política de despejos sem processo legal levada a cabo pelo Prefeito nos últimos anos, que quando questionado pelos movimentos sociais disse que o déficit habitacional da cidade é de “apenas” 1,9 mil moradias.

Nas unidades de saúde os trabalhadores continuam sem os EPI’s necessários para atender à população, o que pode ter sido responsável por um surto de contaminação entre crianças internadas com problemas cardiológicos no Hospital de Clínicas Municipal.

Apesar da falta de estrutura da cidade para lidar com a crise, fruto de anos de descaso com o povo por parte da Prefeitura, as limitadas ações do Prefeito são propagandeadas aos quatro ventos. A inauguração de dois hospitais com mais de um ano de atraso, o Vale Alimentação entregue apenas para as crianças que estudam na rede municipal (deixando todas as outras sem qualquer apoio) e a entrega de 30 mil cestas básicas, custeadas com doações da própria população, retiradas pelas famílias no centro de distribuição da Prefeitura em meio a aglomerações (podendo entregá-las nos bairros) são medidas que aparecem como se fossem grandes feitos do prefeito.
Para propagandear isso a Prefeitura ainda renovou, em meio à quarentena, os contratos com as empresas de publicidade com custos de até 32 milhões de reais para os cofres públicos. Já os contratos com as mais de 700 merendeiras e trabalhadoras da limpeza das escolas municipais foi rompido pela mesma prefeitura, que acha melhor economizar no salário das trabalhadoras pobres que nos contratos com grandes empresas de propaganda.

A cidade de Mauá, que possui seu prefeito e 22 de seus 23 vereadores comprovadamente envolvidos em casos de corrupção, iniciou a pandemia sem contrato para serviços de saúde pública. O único hospital público da cidade está sucateado, além de atender também as cidades de Rio Grande da Serra e Ribeirão Pires, que não possuem nenhuma UTI, mesmo após 2 meses de ter sido decretado o isolamento social no estado por conta da Covid-19. Nesse mesmo período apenas 1 hospital de campanha com 30 leitos foi construído em Mauá e o prefeito Átila Jacomussi (PSB) está sendo acusado de superfaturamento na obra.

Com o valor gasto na cidade poderiam ter sido construídos 3 hospitais como os de Santo André, que possuem mais que o triplo de leitos do de Mauá. Enquanto isso os casos na cidade só crescem, sendo 539 confirmados com 38 mortes, o que a coloca em quinto lugar no ABC. Segundo o Consórcio Intermunicipal do ABC, Mauá tem a situação mais preocupante da região por já ter alcançado a taxa de 100% de ocupação de suas UTI’s. A prefeitura nega esta informação mas no último sábado (17) uma mulher de 66 anos morreu a espera de uma transferência de uma UPA para algum hospital com UTI.

Em Santo André a situação não está melhor. Segundo o boletim oficial da prefeitura publicado no dia 18/05, a cidade já contava com 1.139 casos confirmados, 3.609 casos aguardando resultados e 104 óbitos. Esses números como bem mostrado por meio da pesquisa realizada pela Colab, startup que faz parcerias com governos, juntamente com a Epitrack, uma companhia especializada em detectar epidemias, no programa denominado Brasil Sem Corona por meio de uma análise com cerca de 1,5 mil moradores da cidade demonstrou que o número de infectados cresce exponencialmente para as pessoas com renda familiar abaixo de R$ 1.892,00. Já entre as pessoas com renda familiar acima de R$ 8.159,00, a situação é oposta e o crescimento no número de casos já está controlado.

A situação é difícil entre os trabalhadores da cidade, após realização de testes rápidos nos profissionais do transporte público da cidade, no dia 14 de maio, constatou-se 48 pessoas infectadas com o Covid-19 entre os motoristas e cobradores da cidade, o que representa 5,2% dos profissionais da categoria que foram examinados. Além disso, medidas como demissão de 479 trabalhadoras da empresa Asservo (terceirizada que cuida da limpeza das escolas e creches na cidade) feitas em abril agrava a situação de desigualdade vivenciados na cidade.

Enquanto os trabalhadores morrem, a prefeitura de Santo André decidiu colocar máscaras em estátuas do município como saída para combater à situação de calamidade pública desencadeada pela contaminação do novo Coronavírus (Covid-19) na cidade.

Só com um governo popular o povo do ABC sairá da crise

Na região do ABC Paulista o índice de isolamento social é de apenas 49%, um valor muito abaixo dos 70% recomendados para um efetivo controle do crescimento no número de infectados pelo vírus. Tal situação é resultado, em partes, da falta de condição da população ficar em casa, sem dinheiro para comprar comida e pegar as contas como água, luz e aluguel. Há falta de auxílio das prefeituras para que a população realmente possa fazer a quarentena e não é por falta de possibilidades do que poderia ser feito.

A cada dia que passa, assim como acontece com o Governo Bolsonaro, os prefeitos e governantes locais deixam mais clara sua incapacidade de seguir governando, o que fica ainda mais evidente frente a atual crise enfrentada. Enquanto grandes capitalistas estiverem no poder e a prioridade do sistema econômico for a manutenção das extraordinárias taxas de lucro, mesmo que isso custe a vida do povo mais pobre, nós não conseguiremos vencer crises como esta e nosso povo seguirá na miséria.

A saída para a atual crise que o país e a Região do ABC Paulista enfrentam e a construção de um governo popular, que implemente um programa que defenda os interesses da classe trabalhadora. É possível por em prática propostas que efetivamente seriam capazes de diminuir o contágio da população, evitar mortes e mitigar as consequências desse período na região.

Construção de mais hospitais de campanha, distribuição nas residências de mantimentos para desempregados e informais, estabelecimento de agentes públicos sanitários, que poderiam ser até trabalhadores de setores não-essenciais, para identificar e monitorar os casos, congelamento dos alugueis, mensalidades do Minha Casa, Minha Vida são algumas das medidas que se adotadas diminuiriam muito impacto da crise no povo pobre.

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