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quarta-feira, 24 de abril de 2024

A Medida Socioeducativa na atualidade

Foto: Reprodução / Três Pipas

Vitor Daolio

BRASIL – Com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA – lei 8069) instituído em 1990, surge o termo Medidas Socioeducativas, que tem por finalidade serem aplicadas a adolescentes autores de atos infracionais, tendo um cunho sancionatório, ao responsabilizar o adolescente pelo dano causado a sociedade, e um cunho educativo, ao auxilia-lo a descobrir novas formas de estar na sociedade, educando-o socialmente por assim dizer.

                Tais Medidas Socioeducativas são regulamentadas pelo Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (SINASE – lei 12594) instituído no ano de 2012, que irá tratar sobre a aplicação e execução das Medidas Socioeducativas, classificadas como de Meio Aberto, em que o adolescente é acompanhado pelo Estado com a sua liberdade preservada e as medidas Restritivas de Liberdade, em que os adolescentes são tutelados pelo Estado e mantidos em instituições específicas, que teoricamente tem como objetivo reeduca-los para a reinseri-los na sociedade. No estado de São Paulo, essas instituições são geridas pela Fundação CASA.

                A Medida Socioeducativa tem como objetivo inserir um caráter pedagógico as antigas medidas sancionatórias que eram previstas em legislações que tratavam de crianças e adolescentes anteriores ao ECA (o Código de Mello Mattos e o Código de Menores). O termo socioeducativo veio da Socio Educação, inspirado no livro Poema Pedagógico, de Anton Makarenko, (pedagogo da União Soviética que entre os anos de 1920 e 1928 dirigiu a Colônia Górki, recebendo jovens infratores e ajudando-os a tornarem-se cidadãos ativos) e é posto no ECA com a intenção de que os indivíduos que são enviados para cumprir as Medidas Socioeducativas consigam construir uma criticidade sobre a sociedade e sobre o local que ocupam nela, que se conscientizem das explorações sofridas e encontrem formas de atuar para supera-las.

Sobre o adolescente encaminhado para o cumprimento da Medida Socioeducativa, não devemos perder de vista de que este adolescente que comete um ato infracional está também comunicando algo a sociedade, tentando quebrar de alguma maneira com o que lhe foi dado por ela – que muitas vezes é o não acesso à educação formal, o desemprego, a negação de uma moradia digna, o não acesso ao sistema de saúde, entre outras diversas formas de exclusões promovidas pelo capitalismo –  e promover reflexões que o façam procurar formas mais saudáveis de expressar a sua revolta sem causar dano a sociedade – que muitas vezes são outros trabalhadores que possuem uma situação mais estável.

                Atualmente, na cidade de São Paulo*, os adolescentes autores de atos infracionais são encaminhados pela Justiça aos serviços de execução de Medidas Socioeducativas. Quando em Meio Aberto, tais serviços são de responsabilidade do Sistema Único da Assistência Social (SUAS), que irão acolher o adolescente e trabalhar para que ele seja inserido em espaços que trarão a ele experiências sociais diversas (escola, cursos profissionalizantes, oficinas, etc.) e também reflexões sobre o dano causado a sociedade e incentivando-o dar vazão as suas angústias e revoltas de uma maneira mais saudável e que não traga prejuízo a ele e a sociedade, através de atendimentos individuais e grupais.

                Porém, com as medidas ultra liberais promovidas pelo governo, diversas áreas em que o adolescente é encaminhado estão sofrendo com a falta de investimentos públicos: escolas degradadas e superlotadas, com professores sobrecarregados e funcionários desmotivados, o que acaba por incentivar a evasão escolar, Unidades Básicas de Saúde sucateados e sem condições de atender a população dignamente, o lucro sobre o serviço de transporte público, impossibilitando o acesso a própria cidade em que mora. Tal realidade faz com que o trabalho dos profissionais que acompanham os adolescentes em Medida Socioeducativa seja reduzido e dificultoso, inclusive porque os próprios profissionais também são alvos do sucateamento dos serviços públicos.

                Dessa forma, as Medidas Socioeducativas acabam por serem reduzidas, em muitos casos, a meros instrumentos punitivos operacionalizados pelo Estado Burguês, que não tem interesse de que os adolescentes encaminhados consigam superar as suas realidades de exclusão social, podendo despertar ainda mais revolta por parte deles, fazendo-os não se engajarem no cumprimento da medida.

                Assim, é possível deduzir de que a Medida Socioeducativa, apesar de ter boas justificativas e ser inspirada inclusive em um pedagogo socialista encontra diversos gargalos para que seja efetuada em sua plenitude. Gargalos esses criados pelo próprio sistema de produção vigente, o capitalismo. Portanto, socioeducação deve desprender-se do termo medida e ser aplicada em sua totalidade desde os primórdios da sociabilização do indivíduo, e em todas as esferas relativas a essa sociabilização. Só após esse entendimento é que conseguiremos tratar de forma responsável a questão da contravenção penal praticadas por menores de idade e não apenas oferecer alguma solução após a autoria de um ato infracional, em que o Estado (de forma paliativa) tenta olhar com mais cuidado esse indivíduo, após ter-lhe negado uma sociabilização digna e ferido diversos direitos ao longo da vida.

                Porém, para que a lógica da socioeducação seja expandida, devemos antes mudar o modo de que a sociedade olha para os jovens do nosso país, entendendo que a vida digna vem antes do lucro e é um direito universal e que todas elas possuem o mesmo valor. Lógica essa que só é possível através de uma mudança radical da nossa sociedade, em que o humano se sobreponha ao econômico, ou seja, uma lógica socialista.

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*Apesar de existir o SINASE, que padroniza os atendimentos promovidos pelos Serviços de Medidas Socioeducativas, tais serviços e os caminhos em que o adolescente percorre por ele variam muito de cidade e de estado, dependendo do tamanho da cidade, da forma que o Judiciário atua e da estrutura do SUAS.

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