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sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

Dona Conceição: “faltavam dois dias para voltar a trabalhar e ela me demitiu”

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TRABALHADORA – Conceição Fernandes mostra a vida dura de uma diarista. (Foto: Anne Fernandes/Jornal A Verdade)
Anne Fernandes

TERESINA (PI) – Desde o começo da pandemia de coronavírus no Brasil, algumas áreas profissionais viram suas vidas se tornarem ainda mais um caos devido à incerteza de ter renda e, consequentemente, o sustento da família. São vendedores ambulantes, motoristas por aplicativo, diaristas, empregadas domésticas.

As diaristas e empregadas domésticas vivem o dilema de não terem garantias do isolamento remunerado e os riscos de contaminação por Covid-19. Muitas dessas mulheres, com medo de serem demitidas pelos patrões, acabam se arriscando no deslocamento até as residências onde trabalham, dentro do transporte público, que tem um alto índice de aglomeração de pessoas ou até mesmo a pé, colocando-as em outros riscos.

Muitos casos de empregadas e diaristas contaminadas já foram relatados no país. No Estado do Rio de Janeiro, o primeiro caso de óbito por coronavírus foi o de uma mulher de 63 anos que trabalhava há mais de 20 anos como empregada no bairro do Leblon. A doméstica foi contaminada pela patroa, que viajou para a Itália e estava no país quando o mesmo atingiu o maior índice de Covid-19. A mulher retornou para o Brasil e não informou para a empregada a contaminação pelo vírus.

O Jornal A Verdade entrevistou Conceição de Maria Fernandes (50 anos), há quase 30 anos sobrevivendo como empregada doméstica e diarista. O trabalho de Dona Conceição é a principal renda da família. Moradora da periferia de Teresina, trabalhava em uma residência da zona leste da cidade há quase um ano. No período da pandemia, teve que encarar situações desumanas para se deslocar até a residência em que trabalhava, a mais de 9 km de distância. “Eu tinha que ir no ônibus cheio e as pessoas ficavam muito juntas, todas com medo porque o vírus estava rodando, e depois quando os ônibus pararam de circular na cidade, eu pegava os carros contratados pela Prefeitura, mas, na volta, tinha que ser caminhando e os meus pés doíam. Tenho problemas nos pés. Às vezes eu ia até a metade do caminho e minha filha tinha que pedir um Uber. Eu nem tinha dinheiro pra isso todo dia”, relata Conceição.

No começo do mês de junho, começou a sentir sintomas leves semelhantes aos de Covid-19, mas, com a falta de testes na UBS da área, voltou para a casa com apenas receitas para medicamentos e um atestado de 13 dias. Em seguida, a filha de Conceição apresentou sintomas mais severos de coronavírus, tendo, inclusive falta de ar. Uma situação muito difícil, já que na casa, que é pequena, ainda existe a presença de uma idosa de 73 anos, que está no grupo de risco.

Se não bastasse toda essa dificuldade, ainda de atestado, Dona Conceição foi demitida da casa onde trabalhava: “Faltavam dois dias para meu atestado acabar e eu voltar a trabalhar e ela me demitiu, mandou vários áudios dizendo para eu não retornar lá tão cedo, pois eu estava cheia de doença e minha filha também’’, afirma Conceição. “Ela disse que iria procurar outra empregada que dormisse no trabalho, pois não me queria lá depois de pegar vários ônibus todo dia”.

Assim como esses, existem vários outros casos de empregadas domésticas com Covid-19 que não têm nenhum auxílio ou ajuda por parte dos empregadores, mulheres sem nenhuma garantia trabalhista (já que a realidade é que poucas têm carteira assinada), impedindo o acesso a férias, 13º, FGTS, etc. Segundo dados do Instituto Locomotiva de Pesquisa, 39% dos empregadores de diaristas dispensaram os serviços sem manter a remuneração das mesmas, o que deixa incerto o futuro dessas mulheres e de suas famílias.

Infelizmente, é assim que são tratadas essas profissionais dentro do sistema capitalista, além de diversos tipos de humilhações morais por elas sofridas. E muita desta precarização é herança escravista, que, até nos dias de hoje, define traços das relações de trabalho capitalistas. O cuidado da casa-grande, crianças e idosos era feito pelas mulheres negras, escravas de suas sinhás. Mesmo após a abolição (1888), as mulheres negras ditas “livres” ofereciam serviços domésticos em troca de formas de remuneração, geralmente alimentos.

Apesar das dificuldades e do histórico dessas mulheres, existe um pouco de esperança que ameniza e traz felicidade para algumas. O Movimento de Mulheres Olga Benário está realizando uma campanha em apoio a todas que estão sem renda para que possam estar em suas casas, protegidas. A Campanha de Apoio às Diaristas é uma rede nacional que tem por objetivo montar e distribuir cestas básicas a essas mulheres. Outro exemplo importante são as campanhas de doação de alimentos, materiais de limpeza e recursos financeiros em diversos estados pelo Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB), que entrega semanalmente cestas básicas nos bairros pobres de cidades espalhadas pelo país e que tem aliviado o peso sobre as costas dessas mulheres.

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