Fábio Jota
BELO HORIZONTE (MG) – O espetáculo AntígonaS, encenado pelo Grupo de Teatro Mulheres de Luta, formado por mulheres da Ocupação Carolina Maria de Jesus, ganhou o Prêmio Leda Maria Martins de Artes Cênicas Negras de Belo Horizonte na categoria “Palco em Negro” (espetáculo em longa duração). A premiação valoriza a produção de teatro, dança e performance de artistas negros. O tema da premiação neste ano foi “Quilombismo”, inspirado na obra do teórico e militante negro Abdias do Nascimento.
A peça AntígonaS é uma releitura da obra clássica de Sófocles, dirigida pela atriz e diretora Cristina Tolentino. Ela foi encenada pela primeira vez no início deste ano na própria Carolina, utilizando os espaços do próprio prédio ocupado como cenário. O prêmio vem como um reconhecimento do trabalho e dedicação do Mulheres de Luta e da ocupação, e mostra a capacidade de criação e resistência, fazendo parte do processo de empoderamento de mulheres pobres na vida social e cultural da cidade.
Segundo Poliana Campos, moradora da Carolina e uma das atrizes da peça, “tem coisa que não tem preço. É o reconhecimento do esforço da luta e de estarmos juntas. Estamos de alma lavada, pois ouvíamos que não ia dar em nada, que teatro não era pra periferia e que o povo pobre não sabia apreciar o teatro. É esta a faixa que eu estou carregando, junto com muitas e muitos aqui dentro. Da luta, do reconhecimento e do companheirismo”.
O Grupo de Teatro Mulheres de Luta surgiu ainda em 2017, mesmo ano em que nasce a Ocupação, que, na época, ficava em outro endereço, no alto da Avenida Afonso Pena, na região central da capital mineira. No mesmo ano, a partir de oficinas de teatro com as mulheres da Ocupação, foi montada a primeira peça, “Todas as vozes, Todas elas”, que estreou naquele mesmo ano e já foi encenada em eventos internacionais. Já o AntígonaS, o espetáculo premiado, é o segundo espetáculo do grupo.
A força das duas peças e o reconhecimento que elas ganharam refletem que a luta do MLB vai além do direito à moradia. É também pela transformação da vida de pessoas excluídas pelo sistema capitalista do direito de morar, de viver, dignamente, de ter educação, saúde e direitos numa sociedade injusta e excludente. Carolina Maria de Jesus, que resiste agora na Rua Rio de Janeiro, também no centro de Belo Horizonte, e está sobre o risco de despejo, não é um amontoado de pessoas sem teto, são trabalhadoras e trabalhadores que buscam melhorar suas condições de vida, que lutam para romper os preconceitos e discriminações, em especial, as mulheres que são oprimidas e violentadas em todos os aspectos.
A Ocupação homenageia Carolina Maria de Jesus, escritora brasileira negra e periférica que escreveu sobre sua realidade e publicou um dos clássicos da literatura brasileira, Quarto de Despejo. É simbólico que nessa mesma Ocupação exista o Grupo de Teatro Mulheres de Luta, que apresenta a força das mulheres periféricas e em sua maioria negras que constroem a Carolina e o MLB.