Carta | “O Norte morre sem luz, sem oxigênio, sem dignidade”

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ABANDONO E DESESPERO – Agentes de saúde transportam paciente no hospital Getúlio Vargas, em Manaus, em meio ao novo surto de Covid-19 na capital amazonense. (Foto: Reprodução/Bruno Kelly)
“Genocidas que agem unicamente de forma verborrágica, viram de suas poltronas Manaus ter 187 pessoas no dia de ontem (14), sufocados, sem ar. Alas inteiras, como no antigo Grão-Pará pouco tempo antes da Cabanagem, onde um barco chamado Palhaço com 256 indígenas, negros, pobres em geral morreram sufocados.”
Rodrigo Souza
Unidade Popular Pelo Socialismo

MANAUS (AM) – A capital que fica no centro da maior floresta do mundo, viveu nessa quinta-feira (14) um de seus dias mais traumáticos de sua história. O oxigênio faltou. A ironia mórbida do que era chamado de pulmão do mundo ter passado um dia sem oxigênio nos hospitais públicos e privados é inevitável. O clichê da tragédia anunciada é impossível não ser usado.

O governador Wilson Lima (PSC), envolvido em escândalos desde o início de seu mandato, como quando comprou respiradores inúteis para o tratamento da Covid-19 de uma vinícola, ou quando teve seu secretariado e subordinados superfaturando valores de serviços de lavanderia, se mostra alinhado a Jair Bolsonaro (sem partido) no projeto necropolítico em andamento, é uma tragédia em si.

Wilson abriu as escolas mesmo sendo alertado do risco de circulação vírus dentro do ambiente escolar, transporte público, entre professores e demais profissionais como merendeiras, agentes de limpeza, secretaria e etc. Os casos foram aumentando numa aparente lentidão. Muitas vezes colocada como “recontagem” de casos passados.

O comércio passou a voltar a sua normalidade. Mesmo aferindo temperatura num rigor cômico, no pulso, para preservar a glândula pineal dos cidadãos que recebiam o “alerta” falacioso pelo Whatsapp de que poderia ter câncer por via dos termômetros, mesmo com o chão cheio de adesivos recomendando o distanciamento, tudo estava como o dinheiro gosta. Circulando e enchendo o bolso de quem está longe e protegido.

O governador, oriundo de um típico programa de televisão desses que expõe a violência policial contra a população pobre, a mesma polícia que nunca é vista fazendo nada parecido em áreas nobres de Manaus, se comunica muito bem usando palavras bem articuladas, se mostra um tipo de especialista em fugir de sua responsabilidade falando e nunca dizendo nada. Andou por dias com o ministro Pazuello à tiracolo, este parece ter a mesma habilidade de falar, falar e nunca dizer nada. Na verdade, disse. Disse que a vacina “seria no Dia D e na Hora H”. O Prefeito dessa distopia é Davi Almeida (AVANTE), que onde vai fala de tratamento precoce indo na cartilha de seu líder, Jair.

Genocidas que agem unicamente de forma verborrágica, viram de suas poltronas Manaus ter 187 pessoas no dia de ontem (14), sufocados, sem ar. Alas inteiras, como no antigo Grão-Pará pouco tempo antes da Cabanagem, onde um barco chamado Palhaço com 256 indígenas, negros, pobres em geral morreram sufocados.

A média por dia tem sido 119,5 sepultamentos. Normalmente a capital não registra mais de 30 enterros diários. Por fim, Wilson Lima (PSC) decidiu que o vírus só age entre 19 até às 6 horas, e baixou decreto impedindo circulação de pessoas. Manauaras contam com a solidariedade de artistas, jogadores de futebol, atrizes e atores e, com menos firmeza, na educação do vírus em obedecer ao decreto.

O Norte morre sem luz, sem oxigênio, sem dignidade. E não é de hoje. De 1.500 pra cá, nunca terminou.