As famílias da Ocupação Luiz Gama, do MLB (Movimento de Luta nos Bairros Vilas e Favelas) foram despejadas após ordem de reintegração de posse pelo Tribunal de Justiça do RJ. Despejo é ilegal, pois a determinação desrepeita a última decisão do STF na ADPF 828, que sentenciou que o poder público deve assegurar abrigo público ou moradia adequada às famílias previamente à desocupação.
Igor Barradas | Redação RJ
LUTA POPULAR – Uma semana antes do Natal, nesta sexta-feira (16), 70 famílias foram despejadas da Ocupação Luiz Gama, no centro da cidade do Rio de Janeiro. A ocupação é um ato de resistência e é organizada pelo MLB (Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas) para garantir os direitos de seus moradores à habitação, segurança e alimentação digna. O prédio ocupado estava vazio há décadas, e o Movimento deu um valor social para ele.
No dia 14 de dezembro, o Desembargador da 14º Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, Francisco de Assis Pessanha Filho, ordenou em uma canetada a desocupação forçada em ação de reintegração de posse contra mais de 70 famílias hipervulneráveis. Essas famílias já vinham de outro processo de desocupação promovido pelo Estado, a antiga Ocupação João Cândido, realizada há um ano e meio atrás.
O Tribunal de Justiça havia concedido anteriormente prazo de 20 dias para desocupação voluntária do prédio. Contudo, após recurso do proprietário, o Desembargador deferiu a reintegração de posse no prazo de 24hrs, para despejar as famílias uma semana antes do Natal.
O despejo, realizado exatamente no dia em que a Ocupação Luiz Gama realiza um mês de existência, é criminoso. Ele viola a última decisão do STF na ADPF 828, que sentenciou que o poder público deve assegurar abrigo público ou moral. “Essa lamentável decisão desrespeita a decisão tomada na ADPF 828, que buscou evitar o cumprimento de liminares de reintegração de posse em conflitos coletivos, sem que houvesse tentativas de mediação e apresentação por parte dos poderes públicos de alternativas habitacionais”, afirmou, em nota, o Núcleo de Assessoria Jurídica Universitária Popular Luiza Mahin da Faculdade de Direito da UFRJ.
“A gente ou come ou paga o aluguel”
Logo após o despejo, os apoiadores e as famílias realizaram uma manifestação denunciando o ocorrido.“Olham pra gente com preconceito. Sendo que a gente não tem onde morar. E o prefeito não ajuda em nada. Com o auxílio que a gente recebe, 600 reais serve ou para comer ou para pagar o aluguel. Eu tenho quatro filhos. Moro de aluguel. Todo mês fico na correria. Preciso muito mesmo de uma moradia, um lugar digno para morar”, disse uma das moradoras da Ocupação Luiz Gama, durante a manifestação.
Uma pesquisa realizada pela Fundação João Pinheiro mostrou que em 296 mil moradias do estado do Rio, as famílias que ganham até três salários mínimos, gastam pelo menos 30% da sua renda pagando aluguel.
Outro levantamento, agora realizado pelo LABA UFRJ, afirma que mais de 13 mil famílias se encontram ameaçadas de remoção na cidade. Dentre elas, mais de 1.400 famílias estão na área central da cidade, e cerca de 6 mil famílias estão sendo ameaçadas pelo Poder Público.
Ocupar, resistir e construir
Embrião de uma nova sociedade, a Ocupação Luiz Gama é o poder do povo, quando os explorados e oprimidos decidem o rumo de sua história. A água, banheiro, cozinha, alimentação, educação, creche, lazer, cultura, saúde existiam para todos da Ocupação, e não somente para uma minoria.
A decisão desumana do Desembargador, não leva em conta a vida dessas famílias e demonstra que para a justiça burguesa é mais importante a propriedade privada, um imovel privado vazio ao direito fundamental e humano da moradia digna.
É urgente que essa decisão seja revertida imediatamente. As famílias da ocupação Luiz Gama devem ter seus direitos respeitados e a moradia digna garantida. Enquanto a população viver em barracos de papelão, de favor na casa de parentes, em áreas de risco, calçadas, praças e debaixo de viadutos, ocupar será um dever revolucionário.