A História do assalto ao Quartel Moncada

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Em 1953, a resposta à tirania de Fulgêncio Batista foi dada por jovens rebeldes que se identificavam como a Geração do Centenário de Martí, junto com trabalhadores inconformados com a realidade de opressão vivida. Seu líder, o jovem Fidel Castro, 27 anos, acreditava que não era possível acabar com o golpe militar em Cuba apenas por via pacífica. Conheça a história do ataque ao Quartel Moncada.

Júlia Andrade Ew | Florianópolis


HISTÓRIA – No dia 10 de dezembro de 1952, poucos dias antes das eleições presidenciais, Fulgêncio Batista, um militar apoiado pelo imperialismo estadunidense e pela grande burguesia, organizou um golpe de Estado em Cuba. Com o objetivo de suprimir os movimentos progressistas que se organizavam no país prendeu os comunistas, colocou os sindicatos na ilegalidade, proibiu as greves, censurou a imprensa e cortou relações com a União Soviética.   

Em 1953, a resposta à tirania foi dada por jovens rebeldes que se identificavam como a Geração do Centenário de Martí (1), junto com trabalhadores inconformados com a realidade de opressão vivida. Seu líder, o jovem Fidel Castro, 27 anos, acreditava que não era possível acabar com o golpe militar em Cuba apenas por via pacífica. Entendia que, fora da ditadura, era possível utilizar o Parlamento para propor um programa revolucionário, mas que era necessária uma revolta popular, e que apenas o povo em ação poderia mudar os rumos do país. Para isso acontecer, nem seria necessário importar armamento: ele já estava na ilha, apenas nas mãos erradas. Surge então a ideia do Assalto ao Quartel Moncada, localizado no extremo oriente da ilha, em Santiago de Cuba. 

Preparação e ação

A ação ocorreria em Julho, mês de festas carnavalescas em Cuba, o que poderia ajudar na dispersão das forças batistianas. Já em abril, Fidel e seus companheiros alugam uma casa em Santiago, que ficou conhecida como “Granjita Siboney”. A ação foi planejada inteiramente na clandestinidade. Para não levantar suspeitas, disseram se tratar de um grupo de amigos que começava um negócio, simulando um aviário. A estrutura montada para as aves na realidade escondia os carros e armas para a ação. Na noite de sábado, dia 25 de julho, todos os companheiros e companheiras que chegavam de diferentes províncias da ilha se concentraram na granja para centralizar o plano e efetivá-lo. 

Raúl Castro, na época com 22 anos, coube à missão de tomar o palácio da Justiça, em frente ao quartel com mais 10 homens. Abel Santamaria, jovem de 25 anos, era segundo nome na direção do movimento (2), deveria tomar o Hospital Civil com mais 22 pessoas. Fidel Castro tomaria o Quartel, junto com 95 revolucionários. 

No dia 26 de julho, os revolucionários foram para ação. O desvio de uma parte do grupo da rota e o encontro inesperado entre o carro que levava Fidel e uma patrulha móvel armada com metralhadoras fez com que o embate começasse de forma prematura e desfavorável. Dos mais de 120 participantes do assalto, 70 foram assassinados. Mas apenas 8 em combate. A grande maioria dos insurgentes foi presa, torturada, tiveram seus corpos ocultados em valas comuns no cemitério Santa Ifigênia e tiveram motivo de morte forjado como “queda em combate”. 

O papel das mulheres revolucionárias

Além das enfermeiras do hospital, que espontaneamente somaram-se à luta ajudando a recarregar as armas dos moncadistas, duas grandes revolucionárias participaram do assalto. Ambas integraram o grupo de Abel Santamaría:  Melba Hernández, 32 anos, e Haydée Santamaría, 30 anos. Ambas foram presas após a ação, duramente torturadas e sobreviveram, participaram da guerrilha integrando o Exército rebelde e foram ativas na construção do socialismo em Cuba, sendo fundadoras e membras do Comitê Central do Partido Comunista Cubano. Melba foi embaixadora de seu país no Vietnã e Deputada da Assembleia Nacional. Haydée foi a principal organizadora da Casa de las Américas, importante instituição cultural do país. 

Em 1953 Haydée foi presa junto com seu irmão mais novo, foi posta em uma cela ao lado de Abel, podendo escutar seus gritos de dor ao ser covardemente torturado. A postura de Haydée na prisão foi digna de uma verdadeira revolucionária. Fidel conta que os torturadores arrancaram um dos olhos de Abel e o levaram para a irmã para arrancar dela informações sobre o movimento. Caso ela não falasse, eles arrancariam o outro olho. A resposta de Haydée foi resoluta: “Se vocês lhe arrancaram um olho e ele não falou, muito menos falarei eu”. Haydée perdeu, nesse dia, seu irmão e seu noivo, Boris Luis Santa Coloma, assassinados pelas mãos dos carrascos da ditadura. Mesmo assim, afirmou que se sentia mais forte do que qualquer um de seus torturadores, afinal as pessoas que amava haviam morrido pela libertação de Cuba, e “morrer pela pátria é viver”. 

A História me Absolverá

Após o combate, Fidel e alguns companheiros vão para as montanhas, mas são capturados após dias de cerco. Logo após a prisão dos revolucionários é aprovada a lei de censura à imprensa pelo governo de Batista, que propagandeava mentiras e ataques aos rebeldes do Moncada diariamente nos jornais cubanos. Em 21 de setembro é instaurado o tribunal para julgar os participantes que sobreviveram, e os revolucionários que estavam enfrentando o cárcere puderam então falar. Fidel vale-se de sua prerrogativa de advogado para fazer sua defesa frente ao júri. Porém, o conteúdo dessa intervenção foi muito além de uma defesa individual: foi uma verdadeira denúncia que colocou Batista e sua ditadura no banco dos réus. Ao apresentar a justificativa da ação revolucionária, Fidel realiza uma ardente descrição da situação de miséria enfrentada pelo povo cubano. Por duas horas, Fidel discorre sobre o analfabetismo, a mortalidade infantil, o desemprego, a humilhação sofrida por quem vive em barracos e vê seus filhos morrendo de fome, a exploração dos camponeses, dos homens e mulheres que morrem trabalhando em uma terra que nunca será sua, a situação degradante vivida pelos professores, a independência ainda não concretizada em Cuba devido à intervenção estadunidense no país, a solidariedade com os outros países da América Latina que enfrentavam o fascismo, entre muitos outros temas. 

Além das denúncias, apresenta o programa popular para Cuba, e as 5 leis que seriam implementadas imediatamente quando da vitória da revolução. Certo de que a insurreição do povo cubano triunfaria, e de que a justiça burguesa não era capaz de pôr um ponto final na luta iniciada no dia 26 de julho, Fidel termina sua defesa com a famosa frase “condenem-me, não importa. A história me absolverá”. Fidel afirma que em seu discurso está presente “a influência do movimento progressista cubano, do movimento revolucionário cubano, do pensamento martiano e do pensamento marxista-leninista”. Seu objetivo era que esse programa fosse um panfleto a ser agitado e conhecido no meio do povo. 

Para que pudesse ser transcrito, durante seu período na prisão, Fidel escreveu o discurso em pequenos pedaços de papel com suco de limão, que coubessem dentro de uma caixa de fósforo, e passou para Melba, Haydée e Lídia Castro, sua irmã, de forma clandestina durante as visitas. Essas mulheres editaram o discurso de Fidel e fizeram-no circular entre o povo cubano. A História Me Absolverá foi uma importante ferramenta de agitação e propaganda, que armou ideologicamente centenas de trabalhadores para a importante batalha que se aproximava. 

O ano de 1955 foi marcado por um avanço das lutas populares, com a realização de muitas greves operárias e também por um amplo movimento de massas pela anistia para os presos políticos do 26 de julho, que foram libertos graças à pressão popular. A direção do movimento, sem nenhuma dúvida sobre a justeza de sua causa, e agora também em memória aos companheiros assassinados pela ditadura, organizou-se no México para, em 1956, desembarcar do Iate Granma novamente em Cuba e dar início à guerra de guerrilhas que culminaria, em 1959, com a queda de Batista e a vitória do movimento revolucionário. Onde era o Quartel Moncada em 1953, hoje funciona um centro escolar e um museu que relembra os heróis e heroínas da geração do centenário de José Martí, e até hoje o dia 26 de julho é comemorado, ano após ano, como o Dia Nacional da Rebeldia Cubana. 

Matéria publicada na edição nº 272 do Jornal A Verdade.

*Júlia Andrade Ew é presidente da Unidade Popular de Santa Catarina

  1. Nascido em 1853, José Martí foi o grande mártir da independência de Cuba frente à colonização espanhola. Suas contribuições práticas, teóricas e poéticas são pilares da cultura revolucionária em Cuba.
  2. A bela “Canción del elegido” de Silvio Rodrigues é dedicada a Abel Santamaría.

Referências:

“El Juicio del Moncada”, Martha Rojas, 1988, Editorial de Ciencias Sociales, La Habana. 

“A História me Absolverá”, Fidel Castro, 1953.

“História da Revolução Cubana parte 3”, Jornal A Verdade História da Revolução Cubana parte 3 / 4 – YouTube 

“A Estratégia do Moncada”, Fidel Castro, 1977.