Ativistas e povos indígenas denunciam desmatamento, garimpo ilegal e enfraquecimento dos ministérios em ato na cidade de São Paulo.
Agnes Rodrigues e Victor Bravo | São Paulo
LUTA POPULAR – O povo Guarani do Território Indígena do Jaraguá e diversas entidades da sociedade civil ocuparam a Avenida Paulista no dia 18/06, em São Paulo, em um protesto contra os ataques sofridos pelo Ministério dos Povos Indígenas e pelo Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática.
O ato teve início em frente ao MASP com mensagens reivindicando políticas socioambientais e combatendo o desmatamento ilegal, a exploração de recursos no recife de corais da Amazônia e outras ações predatórias ao meio ambiente que avançam a passos largos em função de lucro.
Líderes influentes na luta contra a crise climática também marcaram presença. Amanda Costa, fundadora do Perifa Sustentável, ressaltou a importância da mobilização popular diante dos retrocessos no Congresso Nacional: “A aprovação do Marco Temporal é inadmissível. Vai contra nossa Constituição e representa um retrocesso sem precedentes. Por isso, é essencial ocupar as ruas e mostrar que não vamos aceitar isso”.
Fica evidente que o atual sistema socioeconômico, o capitalismo, é o verdadeiro inimigo do meio ambiente. Dados do sistema Deter-B, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), revelam que somente em maio foram registrados 812 km² de alertas de desmatamento.
Esse sistema da floresta serve, por exemplo, à agropecuária, onde a terra é desmatada para dar lugar à criação ilegal de gado. Posteriormente, o gado é transferido para fazendas regulares a fim de ser comercializado sem deixar rastros de destruição.
Os biomas também podem ser desmatados para a plantação de commodities como milho e soja em milhares de hectares de terra de modo que alimentem essas criações de gado e outras indústrias associadas ao agronegócio.
Essa lógica predatória é uma consequência do sistema em que vivemos. Em 2022, o setor pecuário no Brasil faturou R$374,27 bilhões, o segundo maior valor em 34 anos, segundo o Ministério da Agricultura e Pecuária. Enquanto isso, mais de 33,1 milhões de pessoas sofrem com insegurança alimentar grave, de acordo com dados do Penssan.
Karai Djekupe, também conhecido como Thiago Guarani, Xondaro da Terra Indígena Jaraguá, presente na manifestação, abordou o cerne do problema da crise socioambiental global: “O fim do mundo só é possível porque as pessoas estão viciadas na destruição. Somos educados desde o nascimento, inclusive pelo sistema educacional, a sermos competitivos e individualistas. Isso nos impede de reconhecer a vida dos outros e de todas as formas de vida que também contribuem para a nossa.”
Ministério dos Povos Indígenas é esvaziado
Na primeira semana deste mês, o Senado Federal aprovou a MP 1154/2023, que reestrutura os ministérios do governo Lula e que afeta diretamente os direitos indígenas e do meio ambiente. O texto foi aprovado com 51 votos a favor, 19 contra e uma abstenção.
O Ministério dos Povos Indígenas (MPI) foi mantido, mas foi retirado o reconhecimento e a demarcação de terras indígenas deste órgão para que volte a ser responsabilidade do Ministério da Justiça. Essa medida vai contra a política indigenista do governo Lula, que havia anunciado a homologação de seis novos territórios indígenas no último Acampamento Terra Livre (ATL), em abril.
“A retirada da atribuição do ato declaratório do Ministérios dos Povos Indígenas, com certeza, tira nossa autonomia”, disse Sonia Guajajara, ministra dos Povos Indígenas.
Vale lembrar que, desde o início deste ano, cerca de 20 mil garimpeiros ilegais invadiram o território Yanomami em busca de ouro, poluindo rios, destruindo florestas e ameaçando a existência deste povo ancestral.
Entre 2019 e 2021, a área garimpada irregularmente na Terra Indígena Yanomami aumentou 1.963%, segundo dados da Hutukara Associação Yanomami.
Além disso, dados do Ministério da Saúde revelam que, nos últimos quatro anos, 570 crianças com menos de 5 anos morreram de doenças evitáveis, enquanto pelo menos 21 pedidos de ajuda foram ignorados pela gestão do ex-presidente fascista Bolsonaro.
O caso dos Yanomami ganhou visibilidade na mídia e, diante do genocídio, medidas de socorro foram tomadas no governo atual, como envio de equipes médicas e de assistência social. Mas é importante lembrar que, apesar de os Yanomami terem sofrido muitos ataques ao longo dos anos, eles não foram o único povo atingido pela política fascista do governo Bolsonaro, tampouco são os únicos a sofrerem descaso e apagamento de sua cultura e modo de vida, ataques estes que são históricos para os povos indígenas do Brasil.
Ministério do Meio Ambiente fragilizado
A Medida Provisória também afetou o Ministério do Meio Ambiente e Mudança Climática, transferindo o Cadastro Ambiental Rural (CAR) para o Ministério da Gestão e Inovação em Serviços Públicos, chefiado por Esther Dweck. Trata-se de um serviço essencial para monitorar as áreas de atuação da agropecuária.
Além disso, a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA) foi transferida para o Ministério da Integração e Desenvolvimento Regional, sob a liderança de Waldez Góes. O Sistema Nacional de Informações em Saneamento Básico (Sinisa), o Sistema Nacional de Informações sobre a Gestão dos Resíduos Sólidos (Sinir) e o Sistema Nacional de Gerenciamento de Recursos Hídricos (Singreh) também deixaram o Meio Ambiente e foram para o Ministério das Cidades, com Jader Filho.
“Acatamos porque, na democracia, a gente acata as decisões legítimas do Congresso Nacional, mas não posso concordar. Não posso concordar porque vai na contramão daquilo que significa ter uma legislação ambiental robusta e que faça que o Ministério do Meio Ambiente possa cumprir com suas atribuições que lhes são conferidas na Constituição Federal e em todas as leis que asseguram a criação do Sistema Nacional do Meio Ambiente”, afirmou Marina Silva, Ministra do Meio Ambiente e Mudança Climática.
A luta precisa continuar
Mediante os constantes afrontamentos às políticas de proteção aos povos indígenas e ao meio ambiente, é necessário que se mantenham as mobilizações de forma que novos ataques sejam impedidos.
A organização popular é a ferramenta mais eficiente para o combate aos desmontes ocorridos nos últimos meses e historicamente no sistema capitalista. É preciso que partidos, coletivos, organizações sociais e toda a sociedade civil continuem se manifestando e combatendo nas ruas estes retrocessos que só avançam à medida que o capitalismo sufoca as possibilidades de vivermos uma sociedade justa para todos.
Somente um programa revolucionário poderá mudar a forma de a humanidade existir no planeta, onde seja possível uma coexistência saudável com os biomas do Brasil e do mundo. Portanto, a luta pelos direitos do meio ambiente é uma luta que deve ser mantida como um pilar de alta importância para a construção da revolução brasileira.
É urgente que os revolucionários ampliem seus trabalhos em direção à luta dos povos indígenas e do meio ambiente, pois não existirá a chance de se construir uma sociedade socialista se o planeta estiver em condições inabitáveis para os seres humanos e demais espécies.
É preciso combater o desastre ecológico nas ruas para que se avance no enfrentamento à crise climática! Não aos retrocessos das políticas ambientais e indígenas!