Em Curitiba, funcionários da multinacional de call centers WebHelp relatam baixos salários e necessidade de dupla jornada de trabalho.
Redação PR
TRABALHADORES UNIDOS – A qualquer horário do dia é possível encontrar no Centro de Curitiba pessoas com o crachá do Grupo Services. A empresa paranaense de call center é a maior do setor na cidade, com diversos prédios espalhados pela capital, atende grandes empresas do país em setores como telecomunicações, bancos e operadoras de pagamento.
Em 2018, a empresa já atendia um total de 50 milhões de pessoas do mercado consumidor interno do país. Em 2019, num processo de expansão, a empresa gastou R$ 10 milhões com a construção de um prédio chamativo em uma das principais avenidas da cidade, que, junto com uma suposta modernização, prometia abrir 2.000 novos postos de trabalho.
Já em meados de 2022, o Grupo Services foi comprado pela empresa francesa WebHelp, sua 11ª aquisição em um período de cinco anos, expandindo o seu quadro de funcionários em Curitiba para aproximadamente 9.000 pessoas, num total de 110.000 funcionários em 58 países. Assim, a WebHelp consolida seu monopólio em serviços de call center pelo mundo com uma receita de quase US$ 3 bilhões (aproximadamente R$ 14 bilhões).
Em 2023, a WebHelp fundiu-se com outra grande empresa do ramo, a estadunidense Concentrix, que, combinadas, devem ter em torno de US$ 10 bilhões (aproximadamente R$ 50 bilhões) em receitas anuais estimadas para 2023.
Baixos salários
Apesar de seus lucros bilionários, a empresa tem enfrentado críticas por pagar salários muito baixos para seus trabalhadores. A situação é ainda mais grave quando se leva em consideração o fato de que muitos desses funcionários precisam trabalhar em dois empregos para conseguir sustentar suas famílias, dado que o salário oferecido pela WebHelp é insuficiente para cobrir todas as despesas. Além disso, o vale-alimentação também é muito baixo, o que torna ainda mais difícil para os trabalhadores manterem suas necessidades básicas.
Um dos trabalhadores da WebHelp denunciou que, além do salário e vale-alimentação muito abaixo do necessário, funcionários também não são pagos pelas horas-extras. “É comum a necessidade estendermos a jornada de trabalho, mesmo após bater o ponto, para pagar as horas que são exigidas logados no computador, que sofre influência, inclusive, pela situação das próprias máquinas e equipamentos precarizados e dos turnos de trabalho sobrepostos, que impedem o funcionário de estar logado assim que registra seu o ponto”.
Também não há transparência sobre quanto é repassado aos funcionários a título de comissões, com exceção quando ocorre perda da comissão. Os motivos são os mais variados: quando o funcionário não alcança os indicadores; por excesso de pausas; realização do registro dos atendimentos; faltas, mesmo com apresentação de atestado médico; etc.
Essas condições de trabalho precarizadas causam uma maior rotatividade de funcionários, dificultando a organização sindical desses trabalhadores. Além de ser o primeiro emprego de muitos jovens, que ainda não possuem uma devida formação técnica ou acadêmica.
Além da questão salarial, trabalhadores da WebHelp têm denunciado outras condições precárias de trabalho. Muitos relataram ter pouco tempo de descanso, com pausas que são insuficientes, o que compromete sua saúde e bem-estar. Além disso, alguns afirmam ter que arcar com os custos de deslocamento e alimentação durante os primeiros dias de treinamento, o que pode ser um peso significativo em um salário já baixo.
“Nós até recebemos o valor inteiro depois que o treinamento acaba, mas, até lá, a gente precisa tirar do próprio bolso. Tem gente desempregada que não vai ter de onde tirar essa grana, ainda mais com a passagem custando 6 reais”, afirma Laisa, uma das muitas mulheres que compõe o quadro de operadoras da empresa.
Condições de trabalho
Cerca de 1 milhão e 600 mil brasileiros trabalham em call centers, submetidos a uma rotina em que são expostos a jornadas de trabalho prolongadas e em ritmo acelerado de produção, de modo que todas as ligações que realizam são cronometradas, e isolados em suas posições de atendimento, que impedem a interação entre os operadores.
Além dos relatos da insuficiência das pausas para descanso durante a jornada de trabalho, do estresse causado pela pressão do ambiente de trabalho e do alcance das metas, também há o desrespeito aos limites dos funcionários que realizam atendimento ao cliente, que sofrem com a hostilidade de realizar a atividade de call center. Essas condições de trabalho provocam efeitos negativos na saúde mental do trabalhador, como estresse, ansiedade e esgotamento mental e físico.
Os equipamentos atrapalham o desenvolvimento da atividade, cadeiras apresentam irregularidades de manutenção, assim como as mesas, e não há nenhum lembrete para que os operadores sigam as normas regulamentadoras de segurança e medicina do trabalho, que orientam a troca do fone de orelha, por exemplo. Assim, a fiscalização parece servir muito mais aos interesses do empregador do que à qualidade do ambiente de trabalho e saúde do trabalhador.
É observável que a expansão da WebHelp no Brasil ocorre após a Reforma Trabalhista, de 2017, feita pelo governo golpista de Michel Temer, que facilitou a entrada de empresas estrangeiras com o intuito de explorar mão de obra no país, estas que agora não precisam se preocupar com a dignidade e direitos de seus funcionários. Quando as instituições se provam incapazes de garantir os direitos e dignidade dos trabalhadores, algo recorrente no sistema capitalista, não há outra saída que não seja a organização da classe e atacar aquilo que os capitalistas unicamente se importam: o lucro.
Ao longo da história, todas as conquistas de direitos e melhoria das condições de trabalho ocorreram através da organização e mobilização dos trabalhadores nas ruas. Os grandes empresários tentam impedir isso isolando-nos em cubículos durante o expediente, mas esquecem que a conscientização e a organização acontecem nas ruas, praças, parques, quando os trabalhadores discutem sua revolta.
A construção de um horizonte de soberania, dignidade e poder popular ocorre com a revolta de nossa classe, direcionado àquilo que mantém a exploração incessante dos trabalhadores, miséria e degradação: o sistema capitalista. É preciso lembrar do camarada Lênin: “A força da classe trabalhadora é a organização. Sem organização de massa, o trabalhador é nada, com organização, é tudo”.
Matéria publicada na edição nº 273 do Jornal A Verdade.