Publicado originalmente no portal Folha de Minas.
Lenin Novaes | Rio de Janeiro
OPINIÃO – Marineth, militares assassinos covardes de Victor Jara foram punidos, condenados quase 50 anos após praticar o crime, setembro de 1973. Ele teve as mãos esmagadas a coronhadas e a língua arrancada à faca. De maneira sádica, os assassinos celebraram o ato bárbaro bradando que o artista “nunca mais vai cantar ou tocar violão”. À época do crime, os assassinos tinham patentes baixa e, através dos anos, conseguiram altos postos na hierarquia militar do Chile.
– Athaliba, os militares brasileiros que sequestraram, torturaram e mataram compatriotas na luta contra a ditadura militar-empresarial que vigorou no país no período de 1964 a 1985 pode ser punidos? Assim, como vem acontecendo no Chile e na Argentina, por exemplo?
– Infelizmente, a Lei de Anistia, nº 6.683, de 28/8 de 1979, Marineth, serviu para acobertar condenáveis crimes ocorridos naquele período de triste e amarga lembrança. A lei foi orquestrada pela equipe do general João Batista Figueiredo – último militar presidente da República – e por ele sancionada. Não podia ser diferente. Até hoje é contestada por defensores de direitos humanos.
– Athaliba, essa questão é intrincada, né? Um aspecto da tortura de Victor se assemelha ao espancamento do repórter Nestor Moreira, em 1954. Surrado pelo policial Paulo Ribeiro Peixoto, o Coice de mula, ele teve as mãos quebradas. E dizia, no hospital, onde morreu dias depois, que “a polícia é burra, acha que jornalista escreve com as mãos; jornalista escreve com a cabeça”.
– Pois é, Marineth. Coice de mula foi guarda-costas do então governador Carlos Lacerda. Era muito violento e foi condenado a 10 anos de prisão pela morte de Nestor, repórter do jornal A Noite. Multidão de 200 mil pessoas esteve no enterro do jornalista no Cemitério São João Batista, em Botafogo. É nome de via que liga a Av. Pasteur à Praia de Botafogo: Avenida Nestor Moreira.
– Athaliba, quais são os militares assassinos do cantor e compositor Victor Jara?
– Antes, Marineth, vale relembrar Victor Jara, nascido em 28/9 de 1932, em San Ignácio, no interior do Chile. Militou no Partido Comunista, no Comitê Central das Juventudes Comunistas. Foi professor de Jornalismo da Universidade do Chile. Aos 21 anos iniciou-se na área artística. Tornou-se renomado diretor de teatro. Fez parte do Conjunto Folclórico Cuncumén.
– Ele lançou sete discos até 1973, Athaliba. Dirigiu várias peças teatrais, percorrendo vários países da América Latina, além da Europa e União Soviética. Foi inesquecível a direção dele à homenagem ao poeta Pablo Neruda, que conquistou o Prêmio Nobel de 1971. É considerado um dos responsáveis pelo movimento musical-social Nueva Canción Chilena. Juntamente com Isabel Parra, a mãe dela, Violeta Parra, Rolando Alarcón e o Grupo Quilapayún, entre outros artistas.
– Marineth, aquele movimento fez parte da construção da Unidade Popular, coalização que reuniu partidos de esquerda. Entre eles o Partido Socialista e o Partido Comunista, resultando na eleição, em 1970, de Salvador Allende. Em 11/9 de 1973, o presidente socialista foi deposto pelo golpe terrorista do general Pinochet, arquitetado, promovido e financiado pelos Estados Unidos. É o que comprovam documentos desclassificados dos EUA e o Informa da Comissão Church, do Senado estadunidense. Aliás, na América Latina, os EUA fomentaram as ditaduras militar.
– Athaliba, diga os nomes, agora, dos militares assassinos de Victor, que foram punidos.
– Marienth, o presidente Allende foi encontrado morto horas após de o Palácio La Moneda ser bombardeado pela aviação e totalmente cercado por tanques de guerra e militares golpistas. Victor, apoiador, defensor do governo socialista, foi preso dia seguinte do golpe, com estudantes e professores da Universidade Técnica do Estado – UTE. E, depois de assassinado com mais de 40 tiros, o corpo foi jogado num beco da periferia de Santiago, capital do Chile.
– Athaliba, quais são os militares assassinos do cantor e compositor Victor Jara?
– Marineth, o general Pinochet foi preso em Londres, Inglaterra, 16/10 de 1998, por crimes contra a humanidade. Isso marcou jurisprudência global sobre crimes contra a humanidade. Pois bem. A Suprema Corte do Chile, 28/8, condenou Raúl Anibal Jofré González (brigadeiro do Exército), Edwin Armando Roger Dimter Bianchi (tenente do Exército), Nelson Edgardo Haase Mazzei (coronel do Exército), Ernesto Luis Bethke Wulf (tenente-coronel do Exército), Juan Renan Jara Quintana (tenente-coronel do Exército) e Hernán Carlos Chacón Soto (brigadeiro do Exército) a 25 anos de prisão. Rolando Humberto Camilo Melo Silva, ex-oficial e advogado, promotor militar, foi condenado como cúmplice do assassinato e sequestro. Três réus morreram durante a tramitação do processo. Após a sentença, familiares gritaram Victor Jara, presente!