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sexta-feira, 13 de dezembro de 2024

O fascismo na Itália: gênese, ascensão e queda

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O fascismo surgiu na Itália depois da Primeira Guerra Mundial (1914-1918) como reação das classes dominantes à vitória da Revolução Bolchevique na Rússia e à perspectiva de o socialismo avançar por toda a Europa.

José Levino | Historiador


HISTÓRIA – A palavra “fascismo” tem sua origem no vocábulo latino “fascio”, nome do símbolo utilizado nas cerimônias do Império Romano, que consistia num machado envolvido num feixe de varas.

Benito Mussolini (1883-1945) foi o mentor do fascismo italiano. Sua família era de classe média baixa (pai, ferreiro; mãe, professora). Foi militante de esquerda, atuando em sindicatos, jornais e outras frentes e, como costumamos dizer na gíria popular, “virou a casaca”. Isso ocorreu quando se deslumbrava a deflagração da Primeira Guerra Mundial.

Antecedentes da Primeira Guerra

O início do Século 20 consolida a evolução do capitalismo para a sua etapa imperialista, com monopólios e nações disputando mercados para seus produtos e fontes de matérias-primas e os países centrais lutando entre si pela hegemonia. Para isso, deu-se a formação de blocos, a exemplo da Tríplice Aliança (Alemanha, Itália e Império Austro-Húngaro) e a Tríplice Entente (Reino Unido, França e Rússia).

A etapa imperialista se desencadeia na segunda metade do Século 19 com a Segunda Revolução Industrial, que implanta novas tecnologias, concentra riquezas e coloca o sistema sob a lógica do capital financeiro, que se sobrepõe ao capital produtivo. Verifica-se o crescimento da classe operária, sua concentração em conglomerados e a ampliação de sua força sindical, com visível aumento das conquistas econômicas.

Ao mesmo tempo em que o ambiente se torna mais favorável à divulgação das ideias de Marx e Engels, as vitórias parciais criam a ilusão da possibilidade de mudanças estruturais sem ruptura, sem luta de classes, dando pano de fundo para o reformismo, que acabou dominando a Segunda Internacional Socialista. 

Foi essa realidade que levou Lênin a concluir que, diferente do previsto por Marx, a Revolução Socialista começaria nos elos mais fracos do capitalismo, no caso, os países periféricos, a exemplo da Rússia; tese que comprovaria em 1917 com a vitória da Revolução Bolchevique.

No início de 1914, já estava claro que a disputa interimperialista desaguaria num conflito armado. O Movimento Socialista Europeu se dividiu, com a maioria defendendo a união nacional para defesa da pátria e a minoria assumindo a tese leninista de que a classe operária deveria se organizar de forma independente, praticar o internacionalismo proletário e voltar as armas contra as burguesias nacionais.

Exemplo mais consequente dessa opção foi o de Rosa Luxemburgo, que rompeu com o Partido Socialdemocrata e liderou a criação do Movimento Spartacus, que deu origem ao Partido Comunista Alemão. Na Itália, Mussolini, que defendia a união nacional, foi expulso do Partido Socialista e se engajou no Exército.

A Itália, assim como a Alemanha, saiu derrotada da Guerra, em profunda crise econômica e política. Foi nessa conjuntura que Mussolini, com um carisma evidente, liderou um movimento que denominou de “fascismo” e que visava a levantar a autoestima do povo italiano, apelando para a sua superioridade e união para construir um futuro brilhante para a Itália, a quem caberia resgatar a glória do passado, do Império Romano.

Características do fascismo

  1. O fascismo não prescinde de um líder reconhecido, carismático e da adesão das massas (pelo menos, de uma parte significativa). Essa adesão não se dá pelo argumento racional, convincente, mas pelo apelo à emoção. Superioridade da raça, da nação, futuro brilhante, por enfatizar o objetivo final sem falar em dificuldades, mas na capacidade de alcançá-lo, pois “querer é poder”.
  2. Apelo ao sentimento religioso, místico. A palavra de ordem é que esse futuro radiante é querido e abençoado por Deus, que está acima de tudo, de todos, e de todas as coisas. E quem não acredita nele é inimigo e deve ser combatido sem dó nem piedade. É importante identificar o inimigo, e este é o comunista. Portanto, discordou uma vírgula, é comunista, com quem não se tem conversa. Na Itália, um país, na época, esmagadoramente católico, sede do papado, Mussolini, logo que assumiu o governo, concedeu independência e autonomia ao Vaticano. 
  3. Antissocialismo, anticomunismo, antibolchevismo. O comunismo (socialismo, bolchevismo) é o inimigo número um. Ele quer destruir o indivíduo, a família e a religião.  Sendo assim, não tem o direito de existir.
  4. Totalitarismo. Democracia, mesmo a burguesa (liberalismo), é instrumento do comunismo, por isso, tem que ser rechaçada. O Estado é totalmente centralizado, sem eleições, Parlamento, Judiciário (ou se existir é apenas pró-forma), pois o poder é do líder. No caso da Itália, do Duce (Mussolini); da Alemanha, do Führer (Hitler). 
  5. Militarização da sociedade. A repressão pode ser exercida pelo próprio povo. Identificando o inimigo, nem precisa recorrer ao aparelho estatal. A “justiça”, ou “justiçamento”, pode ser feita pelas próprias mãos, através das milícias. O programa italiano de educação das crianças visava a formar os meninos para serem soldados do trabalho ou do exército e as meninas para serem boas donas de casa.

Ascensão e queda de Mussolini

Terminada a Primeira Guerra Mundial, Benito Mussolini, ao tempo em que divulgava as ideias fascistas, criava uma organização paramilitar chamada Camisas Negras, numa alusão ao fardamento que seus membros usavam. Atacavam sindicatos, organizações políticas, jornais de esquerda e quem quer que se opusesse aos fascistas. Em 1921, Mussolini fundou o Partido Nacional Fascista (PNF), cujo programa previa a eliminação da luta de classes, garantia de uma sociedade coesa, corporativa. 

Em 24 de outubro de 1922, os fascistas promoveram uma mobilização nacional com 30 mil pessoas marchando sobre Roma. O rei Vítor Emanuel III nomeou Benito Mussolini como primeiro-ministro. Eleito em 1925, Mussolini deu um golpe de Estado, no qual dissolveu o Parlamento e o Judiciário, criando, no lugar dessas instituições, um Conselho de Estado composto apenas por fascistas. As eleições foram extintas e até os prefeitos passaram a ser nomeados pelo Duce. 

O PNF foi declarado Partido Único e tudo passou para o controle do Estado, inclusive a economia, com o apoio dos capitalistas. A educação, a imprensa, tudo ficou submetido ao controle do Duce, que estabeleceu censura prévia às atividades artísticas, culturais e à imprensa. Os opositores foram presos ou mortos. Em 1927, foi outorgada uma legislação trabalhista (a Carta del Lavoro) e estabelecido o enquadramento dos sindicatos, transformados em órgãos de conciliação, auxiliares do Estado fascista. Com a deflagração da Segunda Guerra Mundial (1939-1945), a Itália se engajou ao lado da Alemanha e do Japão (Eixo).

A vitória do movimento antifascista dos Partisans 

Não havia espaço institucional para oposição nem consentimento para sua existência. Esta existia clandestinamente e, sem meios para agir legalmente, adotou o caminho da luta armada. Foi o chamado Movimento dos Guerrilheiros Partisans Italianos.

O Movimento dos Partisans, ou Partigianos, foi uma frente ampla armada antifascista, com predominância de jovens (homens e mulheres), que contou com a participação de cerca de 300 mil pessoas e tinha em suas fileiras comunistas, socialdemocratas, liberais e até alguns monarquistas insatisfeitos com o papel de fantoche relegado por Mussolini ao rei Vítor Emanuel III.

Diante de sucessivas derrotas das frentes italianas na Segunda Guerra, as Forças Aliadas invadiram a Itália em 1942 e Mussolini foi destituído em julho de 1943. Um acordo de paz foi firmado, a Itália se retirou da guerra e foi invadida pela Alemanha.

A canção Bella Ciao

Os partisans combatiam os fascistas e tiveram que abrir uma frente de luta contra os invasores alemães. Essa invasão aconteceu depois que o Reino da Itália assinou com os aliados um acordo de cessar-fogo, por intermédio do general Pietro Badoglio, então primeiro-ministro, que substituíra Mussolini. Este acordo é considerado, de fato, uma rendição, e foi assinado em 8 de setembro de 1943. Quase que imediatamente, o Exército alemão ocupou a Itália. Os partisans criaram, então, o Comitê de Libertação Nacional para lutar contra os alemães, combateram até o fim da Segunda Guerra, em 1945, e foram considerados os responsáveis pelo fim da monarquia e a instalação da República Italiana.

Desde sua destituição, Mussolini viveu como foragido. Foi preso e executado num vilarejo do interior por um grupo de resistência antifascista partisan em 28 de abril de 1945. Seu corpo foi exposto, sem vida, numa praça pública de Milão. No dia 30 de abril de 1945, Hitler se suicidou em Berlim, já ocupada pelas tropas soviéticas.

Bella Ciao foi o hino de resistência dos partisans italianos, até hoje cantada no mundo inteiro como hino de louvor à liberdade. Com inúmeras gravações, a mais fiel ao original é a da banda Bassotti, e a mais recente, a da banda Cali Rock para a série espanhola A Casa de Papel.

“Resistência, agora e sempre!” (Palavra de ordem do Movimento Antifascista Italiano)

Matéria publicada na edição nº281 do Jornal A Verdade.

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