Fernando Alves | REDAÇÃO
Desde 15 de setembro, greves atingem o coração da indústria automobilística dos Estados Unidos. Trabalhadores das principais montadoras do país iniciaram uma jornada de lutas por direitos, aumento salarial e contra a precarização do trabalho.
É uma greve histórica, que já está impactando os rumos da economia e já mostra fortes influências na corrida à Casa Branca. Portanto, uma greve não apenas sindical, mas que ganha um forte caráter político.
Comandada pelo sindicato United Auto Workers (UAW), que representa mais de 150 mil trabalhadores, a greve já chegou a 38 centros de distribuição de peças da General Motors (GM), Ford e Stellantis – fabricante de peças automotivas para a Fiat. O setor é responsável por 3% do Produto Interno Bruto (PIB) estadunidense. Por esses fatores, os patrões e o governo temem que os prolongamentos das paralisações influenciem na economia do país.
O movimento dos trabalhadores vem gerando outros efeitos de natureza política, já que, tanto o atual presidente, Joe Biden, quanto seu maior opositor, Donald Trump, buscam tirar proveito eleitoral da ação da classe trabalhadora, numa demonstração de oportunismo, já que ambos atuam, na verdade, para desmobilizar a greve.
Por que lutam os trabalhadores?
Na pauta da greve está a reivindicação de 40% de reajuste salarial, e os patrões cogitam em negociar 20%. Porém, nada de concreto foi apresentado. Também constam na pauta a inclusão de mais dias de férias; fim dos níveis de variação salarial entre as categorias; jornada de trabalho de 36 horas semanais, com a garantia de pagamento de 40 horas; restauração de benefícios retirados em 2007 para novos contratados. Além desses pontos, o UAW exige o direito de o sindicato ter representantes em dez fábricas de baterias para veículos elétricos.
Atualmente, um trabalhador de alto escalão de uma montadora recebe, em média, 32 dólares por hora de trabalho, enquanto um trabalhador temporário recebe menos de 17 dólares. Ou seja, uma enorme distorção que os operários não aceitam mais.
Shawn Fain, presidente do sindicato, falou que são exigências “ousadas”. Porém, argumenta que os trabalhadores tiveram que abrir mão de parte de suas conquistas históricas durante o período da chamada Grande Recessão, que teve início em 2000 e foi até os anos de 2010. E também entre 2007 e 2009, período agudo da grave crise econômica mundial em que os EUA esteve no centro.
Agora, com a reorganização dos trabalhadores em todo o país e com as empresas registrando superlucros, é preciso recompor as perdas de direitos e os baixos salários. Nos últimos dez anos, as montadoras de Detroit obtiveram um lucro líquido de 164 bilhões de dólares.
Protagonismo da classe operária
Nos últimos anos, vêm aumentando as greves dos trabalhadores em todo o mundo, em especial, nos países centrais da economia capitalista. Greves e lutas estouram nos países mais importantes da Europa, como França, Alemanha, Inglaterra, além de outros mais periféricos, como Bélgica, Espanha, Portugal, por exemplo. China, Coreia do Sul e Japão vivem o mesmo clima de retomadas das lutas sindicais por direitos.
Nos últimos dois anos, os trabalhadores dos EUA vêm promovendo importantes lutas. Em resposta à grave crise econômica mundial, à retirada de direitos, às reformas neoliberais, ao arrocho salarial e à precarização, trabalhadores da Amazon, da gigante varejista Trader’s Joe e da badalada cafeteria Starbucks fizeram marcantes paralisações.
Agora, a greve chegou nos grandes centros operários e industriais, como as montadoras de Detroit, importante berço da classe operária mundial. Enfermeiras e trabalhadores dos correios – o maior sindicato do país – também se movimentaram nesse período, obrigando os patrões a ceder diante da força e da combatividade dessas categorias.
Em 12 meses do ano de 2021 foram registradas 102 greves, que mobilizaram 26 mil trabalhadores. Em 2022, somente de janeiro a junho, foram 180 movimentos grevistas, mobilizando mais de 78 mil trabalhadores. Em 2023, os movimentos grevistas já são maiores que nos anos anteriores, de acordo com o mapeamento da Escola de Relações Laborais e Industriais da Universidade Cornell, que indicou, até o início de agosto, quase 900 greves no país.
Uma parte dessa efervescência tem a ver com as condições de empobrecimento de grande parte dos trabalhadores, como o aumento da inflação e a alta dos custos de vida, que estão impulsionando as lutas e a organização dos trabalhadores. Não é por acaso que a pesquisa do Instituto Gallup, de agosto de 2022, apontou que 71% da população dos EUA é favorável à organização dos trabalhadores em sindicatos.
No entanto, esse não é um fenômeno particular da realidade norte-americana, é uma tendência mundial, resultado das constantes crises econômicas do sistema capitalista. Os trabalhadores estão fartos de sindicatos pelegos, que impedem a luta da classe trabalhadora, que não querem fazer as greves, que se acomodaram na burocracia sindical, na conciliação de classes e na busca de soluções puramente institucionais. O capitalismo agoniza e não apresenta mais soluções para a vida da humanidade. Pelo contrário. Só promove o fascismo, a violência, as guerras, a exploração, as injustiças e desigualdades econômicas e sociais.
A ruptura com o chamado sindicalismo pelego vem trazendo o surgimento de novos sindicatos e jovens lideranças de trabalhadores, com disposição de enfrentar os patrões e os governos que só agem em favor dos ricos e poderosos. O ultrapassado discurso de que a classe operária havia terminado, que seu papel histórico não era mais o mesmo dos finais do século 19 e início do século 20, cai por terra com as greves na Europa, nos Estados Unidos e em todas as partes do mundo.
Vladimir Lênin, grande líder da Revolução Bolchevique de 1917, na Rússia, deixou importantes ensinamentos sobre isso: “Os tempos de crises e grandes convulsões sociais também são tempos de revolução”. As greves combativas que assistimos nos dias atuais são sinais de que a luta de classes continua viva e avança para um novo momento histórico.
MLC se solidariza com a greve dos trabalhadores automotivos dos EUA
Iniciada no dia 15 de setembro, a greve dos trabalhadores automotivos dos EUA é um exemplo da força da classe operária nos dias atuais. Piquetes, atos e assembleias nos locais de trabalho em diferentes fábricas do país têm garantido o sucesso da greve por tantos dias.
As montadoras responderam com demissões. A Ford anunciou que demitiu temporariamente cerca de 600 trabalhadores em sua fábrica em Michigan. A General Motors disse que cerca de 2.000 trabalhadores em sua fábrica de Fairfax Assembly, no Kansas, podem ficar desempregados até que a produção seja retomada. Em resposta a essa política, houve o aumento na adesão dos trabalhadores e a falta de avanço nas negociações. O sindicato tem garantido apoio financeiro de US$ 500,00 por semana aos grevistas, que estão sem salário.
Situação da classe trabalhadora norte-americana
Os EUA possuem os piores índices de pobreza e desigualdade social entre os países classificados como desenvolvidos. Ao todo, são quase seis milhões de desempregados e há uma explosão no número de trabalhadores em situação de rua. Só na Califórnia, estado mais rico do país, cerca de 160 mil pessoas não têm onde morar. Dados de 2017 indicaram que 40 milhões de estadunidenses vivem abaixo da linha da pobreza. Entre a população mais vulnerável, estão os negros e latinos. Já os 10% mais ricos somam uma riqueza de US$ 95,4 trilhões, enquanto os outros 90% da população ficam com US$ 44,47 trilhões.
Outro fator decisivo para o aumento da pobreza, de acordo com o Council on Foreign Relations, um centro de pesquisas em Washington, é a piora das condições de trabalho e renda para aqueles com salários mais baixos, que representam cerca de 40% dos trabalhadores ativos do país, que sofreram perdas em seus ganhos reais nas últimas décadas.
Por essas razões, a greve dos trabalhadores automotivos representa a luta de uma população massacrada pela exploração capitalista, mesmo no país mais rico do mundo. A riqueza é privilégio de uma minoria e a luta coletiva se mostra como única saída possível para reverter o avanço da miséria para a classe trabalhadora em qualquer país capitalista do mundo.
O Movimento Luta de Classes (MLC) declara seu apoio irrestrito à greve da classe operária norte-americana e se compromete a divulgar no Brasil este exemplo de luta para combater a desinformação promovida pela grande mídia burguesa.