A discussão sobre as desigualdades e os desafios enfrentados pelos povos indígenas no ensino superior é primordial, em especial, para a construção de uma educação mais inclusiva.
Gabriel Kuarasy*
BRASIL – O Encontro Nacional dos Estudantes Indígenas (Enei) é um ponto crucial no cenário educacional do Brasil, reunindo anualmente milhares de estudantes de diferentes regiões do país.
Contando com a presença e a articulação o Movimento Correnteza, o Enei, foi realizado nos dias 16 a 20 de outubro na Aldeia Jaraguá, em Rio Tinto (PB) e trouxe à tona uma série de questões importantes.
Os estudantes indígenas convergiram seus esforços para reivindicar uma educação mais inclusiva e livre de perspectivas eurocêntricas, etnocêntricas e cartesianas. Pleitearam uma nova ciência que não apenas acolha os indígenas, mas também outras comunidades marginalizadas, como quilombolas, ciganos e LGBTQIA+.
A participação do Movimento Correnteza no Encontro Nacional dos Estudantes Indígenas (Enei) foi uma conquista significativa, possível graças à mobilização ativa de estudantes da Universidade de São Paulo (Levante Indígena) e aos esforços colaborativos de coletivos indígenas do Rio de Janeiro, como Peabiru e CEI-UNIRIO.
Essa união de forças demonstra a importância da solidariedade e da colaboração entre diferentes grupos em prol da representatividade e da luta por uma educação mais justa e inclusiva. Essas parcerias fortalecem a voz estudantil indígena e ampliam o alcance de suas demandas, alinhando-se com os princípios de solidariedade e mobilização coletiva.
O Movimento Correnteza, em sua busca por uma educação de melhor qualidade, enfatizou nos debates a necessidade do diálogo por parte do governo, pressionando por mais investimentos em políticas de permanência estudantil que reflitam a realidade dos povos indígenas. Este compromisso não é apenas uma demanda por justiça social, mas também uma expressão da luta contra as estruturas opressivas que perpetuam a exclusão social.
Um exemplo concreto dessa luta é a Bolsa Permanência que foi criada em 2013 focando em estudantes indígenas e quilombolas. No entanto, ao longo do tempo, esse programa foi acabando e, sob o governo Bolsonaro, os estudantes indígenas nem sequer puderam se inscrever.
É preciso compreender que a ausência de recursos e apoio financeiro torna ainda mais difícil a permanência estudantil nas universidades, um problema que persiste há décadas.
O evento também destacou os avanços recentes, como a iniciativa de universidades públicas em criar vestibulares específicos para estudantes indígenas, uma resposta positiva à busca por uma educação mais inclusiva e representativa. É um exemplo notável de como a mobilização estudantil pode moldar políticas educacionais.
As palavras e experiências compartilhadas no Enei evidenciaram uma realidade marcada pela luta constante. A ausência de professores indígenas nas universidades brasileiras reflete a exclusão histórica dessa comunidade do ambiente acadêmico. A resposta para essa pergunta tão inquietante está enraizada na estrutura de poder que perpetua a opressão.
Os estudantes indígenas enfrentam entraves significativos, incluindo a ausência de bolsas e recursos para projetos, o descaso em relação às suas ideias e os obstáculos para o desenvolvimento de suas pesquisas. A luta é constante para serem reconhecidos como pesquisadores e não apenas como objetos de pesquisa.
Infiltrar as universidades, mesmo que isso represente um sacrifício pessoal, é um caminho que deve ser trilhado, pois cada estudante que chega abre espaço para outros e outras. As universidades, por sua vez, precisam se adaptar para acomodar o conhecimento indígena, oral e coletivo, produzido em conexão direta com a natureza.
Além de criar espaços para a valorização do conhecimento indígena, é necessário “reflorestar a mente da sociedade brasileira”. Somente assim os indígenas poderão ser reconhecidos como protagonistas na produção de conhecimento.
Os desafios enfrentados pelos estudantes indígenas no Brasil em busca de uma educação mais inclusiva e justa são emblemáticos das desigualdades sistêmicas que afetam as comunidades marginalizadas.
Nesse sentido, a luta dos estudantes indígenas não se limita à busca por uma educação de qualidade, mas também abrange a luta por justiça social, igualdade e reconhecimento de seus direitos.
A organização revolucionária é a chave para garantir que suas vozes sejam ouvidas e que as mudanças necessárias sejam efetivamente implementadas. A união e a determinação dos povos indígenas são fundamentais para a construção de uma sociedade mais equitativa e inclusiva e, principalmente, uma universidade orgânica, plural e de saberes.
* Membro da Executiva Nacional da União Plurinacional de Estudantes Indígenas e do Diretório Estadual da UP MG