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domingo, 22 de dezembro de 2024

Zona Leste de São Paulo registra mais de 2 mil casos de violência de gênero anualmente

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Governo fascista ignora alta demanda, precariza os poucos serviços e as mulheres vivem com medo.

Nicole Ramos* | São Paulo


MULHERES – A Zona Leste de São Paulo é formada por 34 bairros – uma área de 387 quilômetros quadrados – onde vivem 4 milhões e 620 mil habitantes. De acordo com o Mapa da Desigualdade de 2022, a maior parte é composta por mulheres, tendo o bairro de Guaianases com 51,6% da sua população sendo feminina; José Bonifácio 52,7%; São Mateus 51,7%; Itaquera 52,2%; Arthur Alvim 53,1%; Itaim Paulista 57,8%; Vila Prudente 52,9%; Penha 53,3% dentre outros bairros da região que apresentam um percentual de 50% para cima.

Por apresentar uma expressiva população feminina, a região tem altos índices de violência contra a mulher. A partir dos dados do Mapa da Desigualdade de 2022, os registros de ocorrência na Zona Leste são os mais altos, tendo Itaquera no topo da lista com 334 denúncias, seguido por Guaianases 276; José Bonifácio 233; São Mateus 308; Arthur Alvim 299; Itaim Paulista 233; Vila Prudente 199; Penha 251. Na somatória não constam os números de denúncias de todos os bairros, mas dos registros feitos, o total é um número assustador de 2.123 casos anualmente, de múltiplos tipos de violência cometidos contra as mulheres da região e sabemos o quão é desafiador para as mulheres fazerem a denúncia.

O contexto de alto índice de violência contra as mulheres da Zona Leste enfrenta uma realidade igualmente perversa, que é a oferta insuficiente de serviços de atendimento a essas mulheres. Contamos hoje com apenas três Delegacias de Defesa da Mulher (DDM) na região do Tatuapé; Itaquera e São Mateus, as quais enfrentam muitas dificuldades para que de fato as mulheres acessem esse serviço visto, que estão em regiões afastadas dos extremos da Zona Leste, como também as DDMs não são um espaço seguro para um atendimento qualificado, com ênfase no acolhimento humanizado e na compreensão a importância de uma rede complexa de enfrentamento à violência.

Além disso não temos nenhuma Casa de Referência para Mulheres (CRM) na região, mas contamos com 7 Centro de Defesa e Convivência da Mulher (CDCM) que estão espalhados pela zona leste e cumprem o principal trabalho de acolhimento às vítimas de violência, entretanto ficam sobrecarregados devido à alta demanda e à escassez de investimentos nos serviços.

Outro fator preocupante: as consequências da precarização e sucateamento dos serviços públicos voltados às mulheres no estado de São Paulo, como exemplo o fato de todos os CDCMs estarem terceirizados e em condições precárias para as trabalhadoras que estão em luta, dedicando-se diariamente para atender com qualidade.

É evidente a desproporção entre as ocorrências de violência contra a mulher na Zona Leste e a insuficiência na oferta de serviços públicos disponíveis e bem preparados para de fato acolher as mulheres que necessitam de apoio e proteção do Estado frente à violência.

A história de luta das mulheres na Zona Leste

As mulheres da Zona Leste de São Paulo sempre lutaram pelas suas vidas e por melhores condições de trabalho. Em 1917 milhares de mulheres estiveram à frente da greve que ocorreu em São Paulo, que teve início na região da Mooca na Zona Leste, no Cotonifício Crespi, fábrica têxtil.

Na época, o número de trabalhadoras na fábrica era de 448 mulheres e 213 crianças, de acordo com o Boletim do Departamento Estadual de Trabalho de 1912. As reivindicações da greve pautavam a defesa da jornada de 8 horas, o fim do trabalho infantil; segurança no trabalho; aumento salarial, dentre outras reinvidicações.

Além disso, as mulheres trabalhadoras da Zona Leste exigiam a regulamentação do seu trabalho, visto que recebiam salários menores do que os dos homens e eram submetidas a situações de violência pelos patrões, enfrentando inúmeros assédios.

Trabalhadoras e trabalhadores no Cotonifício Crespi, na Mooca, em São Paulo, em 1917. Foto: Arquivo/Unicamp

Trabalhadoras e trabalhadores no Cotonifício Crespi, na Mooca, em São Paulo, em 1917 – Foto: Arquivo/Unicamp

O espírito combativo sempre esteve associado às mulheres da Zona Leste e elas desenvolveram com muita determinação lutas por melhores condições de trabalho, sendo precursoras nas campanhas pelo direito à saúde e à educação.

Em 1970, durante a ditadura militar, período em que o direito à saúde era negado à população, as mulheres da Zona Leste deram exemplo de mobilização em defesa da vida. Escondidas numa sala de fundo da Paróquia Santa Luzia, as moradoras do Jardim Nordeste, na região de Arthur Alvim, iniciaram reuniões de mães e donas de casa semianalfabetas, com o objetivo de debater o tema da saúde e a preocupação com a mortalidade infantil, sarampo, paralisia infantil entre outras questões.

Essas mulheres realizavam panfletagens na porta das igrejas, nas feiras e escolas, fazendo assembleias populares, dialogando com os médicos que as ajudaram a compreender as questões sanitárias. E em 1979 realizaram a maior assembleia, com cerca de 800 pessoas. Desse modo, revisitando a história de resistência na região da Zona Leste de São Paulo, percebemos que as mulheres trabalhadoras, mães e jovens nunca ficaram caladas perante as diversas explorações e retirada de direitos.

A organização das mulheres como forma de mudar a realidade

A Zona Leste de São Paulo é uma das regiões que mais mata mulheres no Estado e nos deparamos com o medo permanente, medo de sair de casa sem saber se voltaremos, medo por ver nos veículos de imprensa que todos os dias acontecem novos casos de violência, com ou sem feminicídio, mas que nos tiram o direito de viver em paz. E quando buscamos ajuda, não somos amparadas pelo Estado, o qual, ao contrário de nos amparar, efetua cortes de verba e fecha e/ou privatiza serviços destinados ao atendimento às mulheres.

O governo do fascista Tarcisio de Freitas (Republicanos) desviou 99% do orçamento da Secretaria da Mulher para a Secretaria de Transporte. Não satisfeito, adotou várias medidas que enfraquecem os poucos serviços existentes, como a terceirização dos serviços, o que afeta a qualidade no atendimento. Com uma demanda alta e sem investimentos na estrutura, a vida das mulheres é dada como sem importância para o governo de Tarcísio de Freitas e o prefeito Ricardo Nunes.

Porém, não podemos nos submeter ao fascismo. Seguindo o exemplo das pioneiras mulheres da Zona Leste, vamos nos organizar e construir grandes mobilizações populares, para exigir o direito de viver sem violência. Para isso, o caminho é a organização das mulheres trabalhadoras da Zona Leste no Movimento de Mulheres Olga Benario.

Juntas, vamos fortalecer a luta diariamente pelo fim da violência contra as mulheres na região, exigindo mais serviços de acolhimento e suporte e a formação de uma rede complexa de enfrentamento à violência e ao feminicídio.

Não vamos admitir mais mortes de mulheres. Não vamos aceitar a condição de viver com medo de perder a vida ou sofrer violências físicas, psicológicas ou patrimoniais. Vamos agir, mobilizar e organizar as mulheres trabalhadoras exigindo nossos direitos e lutando por uma nova sociedade livre da exploração.

MULHER, ORGANIZE-SE NO MOVIMENTO DE MULHERES OLGA BENARIO E LUTE PELO FIM DA VIOLÊNCIA CONTRA AS MULHERES!

*Militante do Movimento de Mulheres Olga Benario

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