Mais dois jovens trabalhadores são assassinados na Zona Norte de Natal

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No dia 5 de janeiro, dois jovens trabalhadores da comunidade de Beira Rio, Zona Norte de Natal (RN) foram brutalmente assassinados.

Redação RN


LUTA POPULAR – No dia 5 de janeiro, uma das comunidades que compõem a Zona Norte de Natal, a comunidade Beira Rio, anoiteceu com violência e terror. Duas pessoas foram assassinadas dentro de casa, por volta das 21h00. Derick Bruno da Silva, um jovem de 17 anos que trabalhava não muito longe dali, na ponte Costa e Silva, mais conhecida como Ponte Velha, foi assassinado junto com seu primo Jean Cláudio da Silva, uma criança de apenas 13 anos que naquele dia não poderia imaginar que não presenciaria mais seus próximos aniversários, pois estava apenas brincando com seu primo em frente de casa.

A história se torna mais aterrorizante com o fato de que tudo aconteceu na frente da mãe da criança Jean, logo após a entrada forçada dos assassinos em sua casa. Além do corpo dos dois jovens, uma terceira pessoa também foi atingida por uma bala e hoje está hospitalizado, o irmão do Derick, Gleydson da Silva de 23 anos que trabalha como servente.

No dia seguinte ao acontecido, como forma de protesto, familiares e amigos resolveram fechar o trânsito da Ponte Velha para chamar a atenção da população ao caso. Um veículo foi incendiado como símbolo da revolta daquele povo. Esse veículo é da frota de ônibus de uma das empresas que mais lucram com a precarização do transporte público em Natal, não irá fazer tanta falta quanto a das vidas do jovem e da criança que foram ceifadas naquela noite aterrorizante para a comunidade.

Como uma segunda forma de protesto legítimo, marcaram outro ato após três dias, no dia 8 de janeiro, com faixas e balões para pedir a apuração do caso ao Estado. João Vitor, artista da região que estava conduzindo o ato, relatou: “Infelizmente, estamos sendo oprimidos, a comunidade. Infelizmente aconteceu isso agora, as crianças não podem mais brincar, fizemos aqui uma cotinha com toda comunidade para fazer um campo de areia para as crianças brincar mas infelizmente quando dá cinco horas, nesse horário não era pra ter ninguém aqui na rua, hoje não era pra ter ninguém aqui na rua, era pra tá todo mundo aqui trancado porque infelizmente chegam e dão na cara da sociedade, dá na cara do povo de bem e ninguém pode fazer nada. Eles querem nos calar mas nós não podemos nos calar, não podemos nos calar, temos que ficar aqui. Nós pede justiça, nós só quer paz, não queremos guerra com o Governo, não queremos guerra com o sistema, só queremos paz, só isso, o direito de ir e vir do trabalho, o direito de ir e vir de qualquer canto, chegar na sua casa em paz, dormir em paz, pois ninguém tá dormindo em paz, infelizmente é isso. Todo mundo tá com medo de sair pra seu trabalho de manhã, tá com medo de chegar em casa e ser abordado, levar um baculejo, de ser alvejado, infelizmente é isso. Nós só queremos mudança, paz”, completa o cantor.

Também em entrevista, Rosineide Barbosa da Silva, mãe dos meninos Jean e Gleydson, trabalhadora em cuidados com idosos, expressa sua indignação e tristeza ao jornal A Verdade. “A gente tá pedindo justiça, pedindo paz, porque dois inocentes sentados na frente da porta da minha casa, foram alvejado. Não tinha envolvimento nenhum, todos trabalhadores, é triste isso. Era pra gente ter confiança na polícia mas não, a polícia está machucando a gente. A gente não pode ter paz. Beira Rio quer paz, todos. Tem pessoas boas, pai de família que trabalha, mãe de família que trabalha, são pessoas de baixa renda, que precisa trabalhar. É triste você não poder ficar na frente da porta da sua casa, eles três não faziam mal a ninguém, todo mundo da comunidade gostava deles, todo mundo de luto. O de 23 anos que trabalhava de construção na ponte. Isso é terrível, você não pode ter paz na sua casa. Ai a gente vai fazer o que? A gente não tem condições de ir para um canto chique, a gente não tem condições de ir pra uma casa melhor, a gente tem que morar aqui e tem que ter um certo horário para estar dentro de casa. As crianças não podem brincar, porque fizeram uma área de lazer mas não deu certo porque a gente não vai deixar os filhos da gente brincar com o que é feito com uma polícia dessa, já desce atirando. É inocente, é criança. Esse crime é um crime cometido pelo Estado, porque quando chegaram para matar meu filho, falaram que eram da Polícia Civil. Que polícia é essa? Que a gente não pode pedir uma identificação. A gente só quer paz, queremos poder sentar na frente da nossa casa, conversar com os vizinhos, que os nossos filhos brinquem à vontade sem a gente estar se preocupando quem vai descer atirando. Só isso que a gente quer, paz”.

Até o momento da publicação dessa matéria, não houve nenhuma resposta do Estado aos familiares sobre o crime na comunidade. A população da região, marjoritariamente negra aponta a violência policial como o principal motivador de crimes como esses assim como seu feitio. Ter paz significa sair cedo de casa para trabalhar e chegar bem, ver as crianças brincarem na rua sem seus familiares temerem se serão as próximas vítimas. O desespero atualmente é sentido por cada morador. O velório dos rapazes aconteceram um dia após o ocorrido, e mesmo neste momento de despedida, de condolências e de um ínfimo e tenaz último momento de carinho dos parente com os corpos das vítimas, a polícia apareceu para ameaçar os presentes para ficarem calados.

Essa é a realidade da comunidade Beira Rio, uma realidade das tantas de violência policial que assola a zona norte de Natal há muito tempo e que escancaram o racismo presente na polícia. Cobramos justiça, em apoio e solidariedade aos familiares e comunidade, assim como celeridade do Estado na investigação do caso. Não podemos aceitar que a polícia aplique “pena de morte” com o aval do Estado. É discrepante que,  para a juventude, o Governo do Estado do Rio Grande do Norte não se preocupe com o investimento na educação, como ocorre com as mais de 173 escolas com obras paralisadas ou inacabadas por falta de verba, prejudicando a permanência das criança e jovens na escolas segundo o Ministério da Educação (MEC), enquanto que, para a compra de armas como fuzis, pistolas e etc, para a polícia, o Estado gastou mais de 135 milhões de reais no ano de 2023. Queremos justiça e política de vida e futuro para nossos jovens. Não à violência nas comunidades! Beira Rio pede paz! Pelo fim do genocídio da juventude nas periferias!