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terça-feira, 5 de novembro de 2024

Resolução de Normativa 017 na UFSC é um ataque à permanência estudantil

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Normativa que dispõe sobre o funcionamento de todos os cursos da Universidade Federal de Santa Catarina está em processo de resolução. As mudanças querem instituir critérios para expulsar os estudantes trabalhadores da universidade. 

João Rio e Mateus Pena | Florianópolis


EDUCAÇÃO – A Resolução Normativa nº 017/CUn/97 trata do regulamento de todos os cursos de graduação da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) discorrendo sobre a renovação, cancelamento e trancamento de matrícula; frequência e aproveitamento; validação de disciplinas; proibição de ação de trote, dentre outras coisas. 

Essa resolução não é alterada desde 1997. Em 2018, foi instituída uma comissão de discussão para elaboração de uma série de mudanças na normativa. Em 2023, essas elaborações foram apresentadas para consulta pública pela comissão. O que se viu foram uma série de propostas absurdas, completamente descoladas da realidade dos estudantes. Com propostas que trazem, basicamente, critérios mais práticos para a expulsão de estudantes, hoje a 017 é para a UFSC umas das pautas mais urgentes do movimento estudantil.

Entre as mudanças aplicadas, a mais gritante é a retirada da sessão de jubilamento da resolução e a adição de seções de bloqueio temporário e recusa de matrícula. 

A proposta é instituir uma série de situações que tem como resultado final o cancelamento da matrícula. Isso significa, na verdade, aumentar o número de maneiras com que o estudante pode ser expulso. Esse método cancela a matrícula do estudante na universidade sem atacar o real problema que causa o mau desempenho dos alunos nas matérias: cargas horárias de trabalho somadas aos estudos, políticas de permanência insuficientes, cursos com cultura de reprovação e diversas questões estruturais que precarizam as condições de estudo. 

A principal situação a ser questionada é a recusa da matrícula por “desempenho insuficiente”. A proposta é que se possibilite a recusa da matrícula de estudantes que tenham reprovado em todas as disciplinas do semestre anterior; reprovado 4 vezes em uma mesma disciplina; ou reprovado mais de 20 vezes desde seu ingresso no curso. Além de também, acabar com o arredondamento do 0,75  para cima. O que é na verdade instituir a possibilidade de deixar de recuperação ou mesmo reprovar estudantes com uma nota de 5,9.

As propostas da comissão demonstram que: ou de fato ignoram ou desconhecem por completo a realidade em que vivem os estudantes da UFSC.

A verdade é que os estudantes pobres passam no vestibular e precisam lutar com unhas e dentes para continuar suas graduações. A UFSC, embora eleita em muitos rankings, como uma das melhores universidades do país, está caindo aos pedaços. As bolsas de auxílio e estágios, além de serem quantitativamente poucas, financeiramente não são suficientes para garantir o alto custo de vida encontrado no entorno da UFSC e em Florianópolis de modo geral. Esse fato acaba obrigando a grande maioria dos estudantes a buscarem um trabalho. Ainda, a universidade não presta apoio para lidar com a defasagem de ensino da juventude que chega das escolas públicas, não têm auxílio suficiente para estudantes mães, não têm vagas na moradia e a realidade, principalmente nos cursos de exatas, é de professores carrascos reprovarem turmas inteiras e perseguirem estudantes por questões políticas e pessoais.

Além do mais, durante a pandemia, os estudantes da UFSC foram forçados a estudar de maneira remota, o que para muitos significou condições horríveis para o aprendizado. Após o retorno às aulas presenciais, esses estudantes não receberam apoio para se reintegrar no ritmo da universidade, levando a um aumento significativo das reprovações. Esses fatos chamaram atenção para um problema existente há muito tempo na universidade: a falta de condições para permanência dos estudantes. 

As engenharias serão as principais afetadas pela resolução:

Os cursos de engenharia do Centro Tecnológico (CTC/UFSC) estão dentre os cursos com maior número de reprovações. No semestre de 2022.1 os alunos do curso de engenharia elétrica tiveram disciplinas com índices de reprovação absurdos: em uma das matérias foram 57 reprovados de 86 matriculados (66,3% de reprovação) e em outra matéria somente 8 estudantes aprovados de 64 matriculados (87,5% de reprovação). Isso mostra o efeito que a pandemia teve no ensino e como a universidade se abdicou de cumprir com o seu papel de auxiliar no estudo de seus estudantes. 

Porém, o problema de reprovação não é exclusivo do período pós-pandêmico. Em 2019.1 essas mesmas matérias citadas tiveram 51,8% e 42,3% de reprovação respectivamente¹. 

Agora, a resolução 017 vem com mudanças que impactam na vida de todos os estudantes, principalmente  entre os estudantes pobres, trabalhadores, mães, pais e em cursos com altas cargas de disciplinas de cálculo e forte cultura de reprovação. A mudança irá dificultar a permanência desses estudantes na universidade e irá elitizar ainda mais o ensino superior na UFSC.

É comum estudantes terem diversos aspectos de suas vidas prejudicados por uma estrutura acadêmica que não se preocupa de fato com a formação técnica e intelectual. As gestões de cursos lidam com as aprovações e reprovações de forma leviana, descolada da vivência estudantil, cultivando o adoecimento em diversos estudantes, que nas rotinas intensas de trabalho e demanda de grandes cargas horárias de estudo, acabam adoecendo física e emocionalmente, com muitos vindo a evadir da Universidade.

Quem sofre com isso não são somente os estudantes, mas toda a comunidade científica e universitária. Afinal, o que se propõe é que as muitas barreiras para a formatura se transformem não mais apenas em barreiras, mas na impossibilidade dela. É uma política de retirada dos direitos de estudantes pobres de terem a perspectiva de um diploma e de conseguirem um trabalho menos precarizado.

¹ Dados retirados de um documento de incidência de notas do Departamento de Administração Escolar da Pró-reitoria de graduação.

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