Dados da Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostram que os trabalhadores brasileiros estão entre os mais explorados no mundo. Enquanto no Brasil o operário trabalha 44 horas semanais, nos Estados Unidos, a jornada é de 38 horas; na Rússia, 38 horas; na Alemanha, 39 horas; no Japão, 43 horas; no Canadá, 31 horas; e no Chile, 43 horas.
Além de trabalharem mais, recebem salários menores. O valor do salário mínimo no Brasil é de R$ 880. É menor que o da Argentina, R$ 2.040; da Alemanha, R$ 7.521; do Reino Unido, R$ 7.335; da Austrália, R$ 7.322; dos EUA, R$ 4.775; do Japão, R$ 3.492.
Para complementar o pequeno salário, grande parte dos trabalhadores é obrigada a fazer hora extra ou bicos e termina ultrapassando a jornada de 44 horas semanais. Não bastasse, é comum encontrar trabalhadores sendo submetidos a condições degradantes e sem nenhum direito respeitado. Somente nos últimos cinco anos (2010 a 2015), de acordo com o Ministério do Trabalho, 11.516 pessoas que trabalhavam em condições análogas às de escravidão foram libertadas.
Além disso, os trabalhadores e suas famílias moram mal. De acordo com estudo do Departamento da Indústria da Construção (Deconcic), divulgado no início deste ano, 6,2 milhões de famílias não têm onde morar ou moram precariamente.
Em decorrência do crescimento do desemprego, essa situação piora a cada dia. Já são 12 milhões de desempregados no país; o governo, em vez de adotar medidas para evitar que essas pessoas fiquem desamparadas, apenas informa que, em dezembro, serão 14 milhões de pessoas sem trabalho.
Por outro lado, os ricos – uma ínfima minoria de famílias –, apesar da crise econômica, aumentam suas fortunas. Dados da Receita Federal revelam que somente 71 mil brasileiros concentram em suas mãos 22% de toda a riqueza do país.
Apesar dessa profunda desigualdade, a classe rica está insatisfeita e quer aumentar a exploração da classe operária, fazê-la trabalhar mais com salário menor.
No dia 8 de julho, o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Braga de Andrade, em encontro com mais de 100 empresários, defendeu que a jornada de trabalho no Brasil fosse de 80 horas semanais. Disse ele: “Nós aqui no Brasil temos 44 horas de trabalho semanais. As centrais sindicais tentam passar esse número para 40. A França, que tem 36 horas, passou agora para 80; a possibilidade de até 80 horas de trabalho semanal e até 12 horas diárias de trabalho. (…) O mundo é assim. A gente tem que estar aberto para fazer essas mudanças. E nós ficamos aqui realmente ansiosos para que essas mudanças sejam apresentadas no menor tempo possível”.
Depois da declaração, a CNI divulgou nota afirmando que seu presidente não defendeu a jornada de 80 horas, mas de até 60 horas.
Detalhe: trata-se da jornada dos trabalhadores, pois a jornada dos patrões, eles mesmos a estabelecem; até hoje não existe nenhuma lei determinando que os patrões trabalhem sequer duas horas por dia. Sabem todos que os patrões tiram férias várias vezes no ano, nunca aparecem nas fábricas que possuem, pois contratam executivos para dirigirem suas empresas, e, no máximo, marcam almoços ou cafés da manhã (breakfasts), que chamam de reuniões de trabalho.
Aliás, o Sr. Robson Andrade falou sobre a jornada de trabalho na França, mas esqueceu de dizer que lá o salário mínimo é R$ 5.562 e não de R$ 880, como é no Brasil.
A ganância dos patrões
Por que os empresários estão ansiosos para mudar a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e aumentar o número de horas de trabalho dos operários? Por que nada dizem sobre uma lei para aumentar o salário?
E uma velha pergunta precisa novamente ser feita: por que existem patrões e trabalhadores, ricos e pobres?
A divisão da sociedade entre uma classe exploradora, a burguesia, infinitamente minoritária e imensamente rica, e outra, a classe dos assalariados, extremamente numerosa e pobre, é consequência de os meios de produção da sociedade, aqueles meios que permitem a sociedade produzir – as máquinas, as fábricas, os prédios, a terra, os meios de transporte, além dos bancos –, estarem na posse de uma minoria de pessoas, os chamados ricos, mais conhecidos como patrões. Como essa minoria é dona dos meios de produção, todas as demais pessoas, os trabalhadores, são obrigadas a trabalhar para eles, para quem vendem sua força de trabalho.
Os patrões pagam aos operários um salário para trabalharem 176 horas por mês (44 horas por semana), com uma condição: tudo o que o trabalhador produzir durante todo o mês pertencerá ao patrão. Se produzir pão, o pão é do patrão; se produzir sapatos, os sapatos serão do patrão; se produzir carros, os carros serão dos patrões, como as roupas, os televisores, os telefones, os alimentos, etc. Na prática, com uma semana de trabalho, o trabalhador reembolsa ao patrão o que recebeu em salário; poderia, então, deixar de trabalhar com duas semanas, já que pagou o que recebeu e ainda houve uma sobra. Mas não é assim; ele continua trabalhando e entregando o que produziu ao dono da fábrica. A diferença entre o que o operário produziu e o salário que ele recebeu fica com o patrão, é mais-valia, de onde vem o lucro do empresário. No final do mês, o trabalhador está sem dinheiro, tem que comprar no cartão, pagar juros; já o patrão, depois da exploração dos trabalhadores que realizou, ficou ainda mais rico.
Quando novas máquinas são instaladas na fábrica, máquinas que permitem produzir mais produtos em menos tempo, em vez de se reduzir a jornada do operário, garantindo que eles tenham mais tempo para ficar com os filhos, para o lazer, a cultura, acontece o contrário; operários são demitidos e os que continuam trabalhando com as novas máquinas passam a produzir muito mais do que antes, embora continuem recebendo o mesmo salário.
Portanto, por trás do discurso de “modernizar” a CLT, de mudar as leis trabalhistas, está o interesse dos patrões de aumentar seus lucros, e, para isso, precisam obrigar os operários a trabalharem mais horas de trabalho.
Nem mesmo o enorme desemprego existente no país é suficiente para diminuir essa ansiedade, na realidade, ganância da classe capitalista. Com efeito, os desempregados formam um exército de reserva para os capitalistas: se a economia tiver qualquer crescimento, eles vão e contratam um desempregado; caso a recessão continue, eles demitem, e o exército de reserva aumenta. Sabem que se o exército de reserva crescer, como acontece agora, ocorre uma pressão para diminuir os salários dos trabalhadores. As empresas, então, desempregam trabalhadores e contratam outros por salários menores para fazer o mesmo trabalho. Prova disso é que, o valor médio do rendimento real dos trabalhadores, entre abril e junho deste ano, diminuiu 4,2% em relação ao mesmo período de 2015.
Jornada de 60 horas aumenta desemprego
Para tentar enganar as massas trabalhadoras e a opinião pública, os capitalistas afirmam que não querem uma jornada maior, mas flexibilizar a lei, liberar só para quem quiser trabalhar até 60 horas por semana. Haja astúcia: querem uma lei para obrigar que os operários trabalhem até 60 horas por semana, 240 horas por mês, mas os patrões continuam sem lei nenhuma.
Dizem ainda que que a CLT está ultrapassada porque é de 1940¹.
O que dizer, então, da jornada de trabalho flexível, isto é, aquela que pode ser quantas horas o patrão quiser? Essa é mais velha ainda, é do século 19. Basta lembrar que, no dia 1ºde maio de 1886, na cidade de Chicago, Estados Unidos, 180 mil operários realizaram uma greve geral e foram às ruas reivindicar a redução da jornada de trabalho de treze (13) para oito horas diárias.
Propagam também que a CLT foi um paternalismo, como se tivesse sido um presente dado aos trabalhadores pelo governo. Outra mentira. Nem os patrões nem o governo queriam a jornada de oito horas; ambos fizeram de tudo para manter a jornada acima de 12 horas de trabalho. Mas os trabalhadores lutaram muito e venceram.
Já no começo do século 20, ocorreram as primeiras greves de trabalhadores no Brasil pela redução da jornada de trabalho. Nessa época, a jornada de trabalho era de 12 horas por dia, e podia ser ampliada de acordo com a necessidade ditada pelo patrão. Dezenas de greves foram realizadas de 1907 a 1917, principalmente em São Paulo e no Rio de Janeiro. As reivindicações dessas greves eram a redução da jornada de trabalho para oito horas, o descanso semanal e a remuneração da hora extra. Foram essas lutas que obrigaram os patrões a aceitar a jornada de trabalho de oito horas e, nessa época, assim como hoje, o governo estava do lado dos patrões.
De fato, no último dia 20 de julho, o ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, do PTB, afirmou que o governo de Michel Temer vai “encaminhar propostas para a reforma trabalhista e para regulamentar o processo de terceirização ao Congresso, até o fim do ano”.
Como mostrou um estudo do Dieese, os trabalhadores terceirizados ganham salários 24,7% menores, trabalham em média três horas a mais por semana do que os contratados diretos que exercem a mesma tarefa e sofrem mais acidentes de trabalho.
Outra mentira dos empresários e de seus meios de comunicação (TVs, rádios e jornais) é que, se mudarem as leis trabalhistas, o desemprego vai diminuir. É exatamente o contrário: a redução da jornada de trabalho de 44 horas para 40 horas geraria a necessidade de contratar mais dois milhões de trabalhadores e se nenhum trabalhador brasileiro fizer mais hora extra seria preciso contratar um milhão de pessoas. Portanto, ao aumentar o número de horas da jornada de trabalho, o desemprego cresce, e não diminui.
Previdência: trabalhar mais 40% para se aposentar
Mas não param aí os planos dos patrões e dos partidos políticos que os defendem para aumentar a exploração da classe operária no Brasil. Pretendem também os patrões e seu governo realizarem uma contrarreforma da previdência com o objetivo de aumentar em 40% o tempo para o trabalhador se aposentar. Isso mesmo: um acréscimo de 40% no tempo de trabalho para se obter a aposentadoria. Um exemplo: se hoje um trabalhador falta dez anos para se aposentar, após a reforma faltarão 14 anos. Os que hoje faltam 20 anos, após a reforma terão de trabalhar oito anos mais. Ao lado desse acréscimo, querem obrigar que nenhum trabalhador possa se aposentar antes de completar 65 anos. Há até membros do Governo Temer que defendem a idade mínima de 70 anos. Ora, como a expectativa de vida no Brasil, conforme dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) é, em média de 75 anos, embora no Norte e Nordeste, não passe de 73 anos, essa elevação da idade mínima para se aposentar, na prática, forçará os trabalhadores a trabalharem até morrer. Para que? Para o patrão ficar mais rico e o governo ter mais dinheiro para pagar mais juros aos banqueiros, financiar o agronegócio e conceder isenção de imposto à classe rica.
Modernizar é acabar com a exploração capitalista
Se a verdadeira intenção fosse modernizar as leis trabalhistas em nosso país, o que deveria ser feito não era aumentar a jornada de trabalho nem o tempo de trabalhado para se aposentar, e sim reduzir a jornada semanal. Afinal, a OIT, em 1962, lançou a “Recomendação de Redução da Jornada de Trabalho”, citando as 40 horas semanais como “um padrão social a ser alcançado por etapas, se necessário”.
Assim, moderno, novo, não é aumentar a exploração dos trabalhadores, mas acabar com a escravidão assalariada, com a exploração de uma minoria rica sobre a imensa maioria da população brasileira há séculos; é transformar o Brasil numa sociedade sem ricos e sem pobres, onde todos trabalhem, e não apenas os operários e os camponeses.
Essa verdadeira modernização, entretanto, eles não querem. Querem que o Brasil continue sendo um país atrasado, dominado por uma elite, a burguesia, pelos donos das usinas, das terras, dos bancos, dos shoppings, essa minoria que toma posse de todas as riquezas produzidas pelos trabalhadores.
Mas, da mesma forma que eles não querem essa modernização, os trabalhadores não podem nem devem aceitar o aumento da jornada de trabalho, a continuidade dos abusos dos patrões, o roubo dos seus direitos e tampouco esses salários humilhantes.
Como vemos, os patrões nunca estão satisfeitos; sua ganância é ilimitada. Seus objetivos não são desenvolver a economia, mas crescer suas fortunas. Com muita luta, conquistamos a jornada de trabalho de 44 horas e, apesar de todos os avanços técnicos, em vez de diminuir para 40 horas, querem voltar no tempo, estabelecer jornada de 60 e até 80 horas por semana. Querem nos explorar ainda mais, nos transformar em burro de carga, quando nem mais burros de cargas existem. Por isso, temos que travar outra luta maior, a luta pela transformação da sociedade, para acabar com a exploração do homem pelo homem e construir uma nova sociedade que, como disse Lênin, o líder da Revolução Socialista Russa de 1917: “Não seja um punhado de ricaços, mas sim, todos os trabalhadores que tenham proveito dos frutos do trabalho de todos!”.
Luiz Falcão é diretor de Redação de A Verdade e membro do Comitê Central do PCR
¹A CLT foi criada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943. Foi sancionada pelo presidente Getúlio Vargas, unificando toda legislação trabalhista então existente no Brasil.