Por Amanda Bispo e Gabriela Torres
Falta de leitos, funcionários da saúde desvalorizados, casos de contaminação e falta de brigadas de incêndios nos hospitais. Essa é a situação da saúde pública na cidade de Mauá (SP), localizada na região metropolitana do ABC, há anos. Nesse contexto de descaso e durante um momento tão delicado como o atual, a situação da população mais pobre se torna ainda mais preocupante.
Segundo enfermeira Rosana do Hospital Nardini:
“Não temos como saber o número de casos. Não há testes […] Às vezes as pessoas não acreditam que não estejam com a doença, querem um teste, mas não temos como fazer.”
No momento em que este texto foi escrito, noite do dia 05 de Abril, haviam 18 casos confirmados do dia 03 de Abril, pois a prefeitura não enviou o boletim com número de casos do dia 04. São 410 casos suspeitos. Ainda nessa semana o Jornal a Verdade denunciou a falta de testes para a doença na cidade. Leia mais: https://averdade.org.br/2020/04/covid-19-estado-nao-controla-numero-de-infectados-e-mortos/
Frente ao crescimento do número de contaminados pelo COVID-19 a prefeitura de Mauá tomou medidas extremamente limitadas para enfrentar a pandemia. Uma das poucas medidas tomadas pelo atual prefeito, Átila Jacomussi (PSB), foi a instalação de três lavatórios coletivos no centro da cidade. Porém, dias após uma intensa propaganda em suas redes sociais, a ação foi interditada por não possuir condições de higienização eficaz: as torneiras foram instaladas muito próximas das outras e não eram automáticas, a vazão da água era muito baixa, e não foi disponibilizado sabão ou papel. Enquanto medidas efetivas poderiam estar sendo adotadas, a atual gestão segue acreditando que frases prontas e uma meia dúzia de fotos publicadas resolverão o problema da contaminação dos munícipes, e segue promovendo ações eleitoreiras com o dinheiro público.
O prefeito ainda iniciou a instalação de um Hospital Municipal de Campanha no dia 01 de Abril no Paço Municipal. Este hospital conta com 30 leitos, podendo dobrar a capacidade em até 72 horas, o que ainda é pouco. Em declaração vergonhosa Átila afirmou:
“Fomos a primeira cidade a contar com lavatórios públicos para combate ao contágio e conscientizar sobre a importância de limpar as mãos, fomos a primeira cidade (da Grande São Paulo) a fazer uma parceria com hospital particular e vamos buscar mais parcerias contra o Covid-19, e imunizamos 100% de nossos idosos contra a gripe, que agora devem permanecer em suas casas, assim como toda a população, enquanto a gente trabalha pela população para vencer essa guerra”, alegou Atila.
Os idosos vacinados contra a gripe não atingiram a essa marca aparentemente vitoriosa de 100%, como esclarece a aposentada Maria Lourdes (67) à redação do Jornal A Verdade: “Tentei me vacinar na UPA perto de casa, mas eles [os funcionários] disseram que já tinha acabado. Lá eles resolveram a falta fazendo agendamento, mas fiquei com medo de esperar”, afirma. “Fui andando até o centro de Mauá para tentar também, mas quando cheguei não tinha mais”.
Essa não foi a primeira vez que a cidade lida com suas mentiras. Enquanto dizia que “a virada na saúde de Mauá começou”, após seu retorno ao cargo, o Hospital Nardini sofreu uma ação civil pública pelo Ministério Público do Trabalho pela estrutura em que se encontrava, com as instalações elétricas do Hospital fora do padrão de segurança. “Em caso de incêndio, o evento de uma catástrofe é praticamente inevitável”, diz o documento de defesa da sentença, já que o local não possui extintores, rotas de fuga em caso de emergência e não promove brigadas. Como confiar em um prefeito responsável pelo não-pagamento de 13° de funcionários da saúde, pela falta de equipamentos de segurança para enfermeiros e pela reutilização de seringas hipodérmicas em trabalhadores, idosos e gestantes?
Enquanto o prefeito tenta usar esse período tão delicado para a saúde da população para fazer campanha sobre si próprio e sua gestão, os munícipes estão se organizando prevendo as maiores dificuldades que passarão nas próximas semanas. Ações de arrecadação de alimentos e produtos de limpeza já se iniciaram na cidade para que doações possam ser realizadas nos bairros mais precários.
Mauá possui mais de meio milhão de habitantes, inúmeras favelas e cortiços onde não existe a possibilidade de isolamento, falta de água generalizada e uma população em situação de rua crescente, e por isso, os impactos da COVID-19 serão gigantescos. A decisão mais humana seria investimentos massivos na saúde pública, mais hospitais de campanha sendo criados, vacinação nos bairros de periferia, melhorias estruturais nos aparelhos da cidade, como as Unidades Básicas de Saúde (UBSs), as Unidades de Pronto Atendimento (UPAs) e o Hospital Nardini.
Uma cidade que possui mais de 70% da população dependente do Sistema único de Saúde (SUS) não precisa de parcerias com empresas privadas. Quem defende essa política mesquinha atende aos interesses das grandes redes de convênio, que lucram com o sucateamento da saúde gratuita, e garante que mais da metade dos habitantes de Mauá não terão acesso ao direito de viver.
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