UM JORNAL DOS TRABALHADORES NA LUTA PELO SOCIALISMO

sexta-feira, 22 de novembro de 2024

Dieese estima 17 milhões de desocupados em 2020

Outros Artigos

A Verdade entrevistou o sociólogo Fausto Augusto Junior, 45 anos, diretor técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos). Na entrevista, ele fala sobre Medidas Provisórias do presidente Bolsonaro e sobre os possíveis cenários pós-pandemia.


O Dieese desenvolve a Pesquisa Nacional da Cesta Básica, que apresenta o custo da cesta em algumas capitais e qual deveria ser o salário mínimo necessário para a manutenção de uma família brasileira. A pandemia provocou um aumento no custo de vida? Como uma família que deveria contar com aproximadamente R$ 4.500 mensais para ter uma vida digna vai sobreviver com o auxílio emergencial de R$ 600 aprovado pelo Congresso Nacional?

Fausto – Neste momento, não é possível falar sobre aumento do custo de vida porque nossa pesquisa do ICV foi interrompida para atualização e a da cesta básica foi paralisada em 18 de março, por causa da pandemia do coronavírus. Fizemos algumas adequações para retomar a da cesta e vamos conseguir divulgar novos resultados, referentes a abril, no início de maio.

O valor de R$ 600,00 está muito longe de garantir o mesmo que o salário mínimo necessário de R$ 4.483,20, estimado pelo Dieese, em março de 2020, para uma família de quatro pessoas viver. Naquele mês, o custo de uma cesta de alimentos básicos para uma única pessoa, no Município de São Paulo, foi de R$ 518,50, quase o valor do auxílio.

Mas, apesar de não ser suficiente, o auxílio é muito importante porque tem um largo alcance e atinge as camadas mais pobres. Segundo estimativa do Dieese, 42 milhões de pessoas serão beneficiadas, o equivalente a 20,4% da população brasileira. A ampliação do benefício para os agricultores familiares pode impactar positivamente a vida de mais de 11 milhões de pessoas.

Vivemos um momento de exceção, causado pela pandemia, mas é importante lembrar que milhões de famílias já estavam em situação de vulnerabilidade, por conta de medidas que cortaram gastos e serviços públicos, precarizaram as condições de trabalho e reduziram a renda, adotadas por este governo e pelo anterior.

O presidente Bolsonaro editou as Medidas Provisórias nº 927 e nº 936, sob o pretexto de preservar empregos, de não provocar uma quebradeira na economia nacional. Como o Dieese analisa estas medidas?

O texto da MP 927 fala que a negociação deve ser feita entre o empregador e o empregado e, desta forma, retira o sindicato da negociação. O conteúdo da medida parece atender apenas às demandas do setor empresarial, pois se baseiam unicamente na redução das prerrogativas dos trabalhadores e em regras que regulam a duração e a execução da jornada, a concessão de férias, a organização de turnos de revezamento e a vigência dos acordos e convenções coletivas.

Sabe-se que a negociação individual entre empregado e empregador é totalmente desequilibrada, em favor deste último, relação que pode piorar ainda mais num momento de crise e desemprego. A MP também não prevê como os empregadores deveriam agir para conduzir o trabalho e a produção do que for preciso manter em funcionamento, sem que os trabalhadores adoeçam ou se contaminem. Por outro lado, a demanda por bens e serviços tende a cair abruptamente pela perda de renda das famílias, e a MP não estabelece medidas mitigadoras desse efeito nem menciona a garantia dos empregos.

A garantia de emprego vai aparecer na MP 936, de maneira limitada e com pouca efetividade, pois pode ser quebrada mediante pagamento de uma multa e só vale para os que aderirem à suspensão do contrato ou à redução de jornada e salário.

O Programa Emergencial instituído pela MP 936 não coloca nenhum limite para redução da jornada e da renda. Não garante 100% do salário integral – somente para quem ganha salário mínimo e a taxa de reposição dos salários fica entre 90% e 70% para salários até três salários mínimos, mas, conforme a renda aumenta, cai drasticamente. Também retira os sindicatos da negociação coletiva destas medidas, deixando mais vulneráveis o conjunto dos trabalhadores.

Os sindicatos têm melhores condições de buscar a ampliação da taxa de reposição salarial, do período de estabilidade e negociar outras condições de implementação das medidas, e inclusive fiscalizar a aplicação das ações pelas empresas.

Também acreditamos que, para que todos possam ficar tranquilos neste momento, deveria ser proibida qualquer dispensa sem justa causa.

Devido à pandemia da Covid-19, uma nova situação surgiu para os trabalhadores e para o movimento sindical. Como isso tem afetado os acordos e convenções celebrados entre as entidades sindicais e os patrões?

Cabe aqui destacar a importância dos sindicatos, que protegem os trabalhadores da base, e  ressaltar a forma como essas entidades estão, rapidamente, se adequando ao momento de pandemia, com a realização de acordos padrões que servem de referência para várias categorias, com utilização de sistemas eletrônicos de consulta à base, reuniões e assembleias virtuais.

Observou-se um crescimento das negociações referentes aos efeitos da crise do coronavírus. O tema mais pactuado foi a suspensão do contrato de trabalho, presente em 213 instrumentos coletivos analisados pelo Dieese. Parte dos acordos reitera as disposições da MP 936 e outros definem outras disposições.

Já a redução de jornada e de salários apareceu em 187 instrumentos coletivos e foi o segundo tema mais negociado. As cláusulas refletem as disposições da MP 936, estabelecendo a duração máxima de 90 dias da medida e os percentuais de redução de jornada permitidos de 25%, 50% e 75%.

Em seguida, vem o tema da concessão de férias individuais ou coletivas, negociada em 161 instrumentos. As cláusulas tratam da antecipação de férias para trabalhadores que não cumpriram o período aquisitivo e da priorização de grupos vulneráveis, entre outros. O banco de horas foi pactuado em 128 instrumentos. A maioria das cláusulas estabelece de que forma as horas não trabalhadas por conta da pandemia podem ser compensadas no futuro.

Também muito presente nas negociações está o trabalho em casa, que aparece em 81 instrumentos.

Em seu “Boletim de Conjuntura” de março, o Dieese fez as primeiras projeções do quadro pós-pandemia no Brasil em relação à queda do PIB e ao aumento do número de pessoas desocupadas. Fale sobre essas projeções.

Todas as projeções indicam recessão da economia após a pandemia, uma vez que medidas de isolamento, necessárias para preservar vidas, têm sido tomadas. Um dos grandes problemas é que a economia do país já vinha patinando por conta das políticas adotadas a partir de 2016, com a mudança de governo. Além disso, em 2019, o PIB ficou em 1,1%, com diminuição do investimento privado no último trimestre do ano e baixo crescimento industrial.

O total de desempregados em março de 2020 era de 12,3 milhões e, como as expectativas de crescimento da economia para 2020, pós-pandemia, eram de um PIB próximo a zero, ou mais provavelmente negativo, a tendência é que esta queda se acentue muito ao longo do ano.

As projeções do Dieese mostraram três possíveis cenários: um pessimista, um intermediário e um otimista. Os pressupostos desses cenários são os impactos da paralisação decorrente da crise e o tempo estimado para a recuperação econômica. No pior cenário, estima-se queda de 8,5% do PIB, com aumento do volume de desocupados em 4,4 milhões, o que elevaria o total, no Brasil, para cerca de 17 milhões de trabalhadores desocupados ao final de 2020. O cenário intermediário, por sua vez, aponta a possibilidade de queda do PIB de 4,4% e aumento de 2,3 milhões no contingente de desocupados. Já o cenário otimista, que acreditamos ser muito improvável, indica queda do PIB de 2,1%, com crescimento de 1,1 milhão no número de desocupados.

Conheça os livros das edições Manoel Lisboa

DEIXE UMA RESPOSTA

Por favor digite seu comentário!
Por favor, digite seu nome aqui

Matérias recentes