Entrevista com Tirso Saenz, vice-ministro de Che
Para celebrar a imortalidade do grande revolucionário Che Guevara, assassinado há 54 anos, o jornal A Verdade fez uma entrevista exclusiva com Tirso Saenz, autor do livro “Che: o Ministro”. Tirso nasceu em Havana, Cuba, em 12 de outubro de 1931. Formou-se como bacheral em Engenharia Química e é Doutor em Ciências. Em 1962, foi designado para ser vice-ministro da Indústria de Cuba, quando o ministro era Ernesto Che Guevara, foi nesta oportunidade que conviveu durante de cinco anos com ele. Além de ter sido ex-vice-presidente da Academia de Ciências de Cuba.
Na entrevista, Tirso ressalta a concepção Che, sua moral revolucionária e seu exemplo de vida. Destaca Tirso: “homem novo não era o símbolo de uma pessoa, mas a expressão de massas de cidadãos com um cada vez mais elevado nível de consciência lutando unidos na construção de uma nova sociedade.”
Alexandre Ferreira, Distrito Federal
A VERDADE: Quem foi Ernesto Che Guevara e que características mais relevantes você ressaltaria deste grande revolucionário?
Tirso Saenz: Ernesto Che Guevara, nascido na Argentina o 14 de julho de 1928, foi um médico revolucionário de formação marxista que havia recorrido vários países da América Latina para conhecer a realidade dos povos humildes e explorados. Conheceu o Fidel Castro no México quando se organizava a expedição para iniciar a luta revolucionaria contra a ditadura de Fulgencio Batista. Uniu-se ao grupo que em novembro de 1956 viajou a Cuba no iate Granma. Na luta alcançou o grado de comandante. Depois do triunfo da Revolução no 1º de janeiro de 1959, foi nomeado para diferentes cargos no Governo, entre eles o de Presidente do Banco Nacional e do Ministro de Indústrias.
O Che era um revolucionário integral, com grande sentido humanista, que estudou a profundidade a teoria marxista e com uma visão criadoura e antidogmática desenvolveu uma conceição sobre a construção de uma sociedade socialista. Ele era a encarnação de altíssimos valores éticos e morais, de solidariedade, generosidade, austeridade, exemplo pessoal, sensibilidade humana, decisão e disposição de oferecer até a própria vida pela liberação dos povos.
Como você definiria um homem novo na concepção do Che Guevara?
Numa entrevista o Che indicou que os dois pilares na construção do socialismo e do comunismo eram o homem novo e o desenvolvimento da técnica. Esse homem novo não era o símbolo de uma pessoa, mas a expressão de massas de cidadãos com um cada vez mais elevado nível de consciência lutando unidos na construção de uma nova sociedade. Esse homem novo vai alcançando cada vez mais um alto desenvolvimento ideológico, vai deixando detrás sentimentos de egoísmo e é cada vez mais solidário, com sentido patriótico, humanista, e ao mesmo tempo internacionalista disposto a dar a vida pela causa revolucionaria; é modesto, austero, com profundo sentido de justiça; dedica-se com entusiasmo ao cumprimento de suas responsabilidades sociais, cívicas e políticas; deve ser exemplo ante seus companheiros de trabalho e amigos e, sobretudo, ante sua família para ser elemento principal na formação integral dos seus filhos; também deve estudar para dominar os avanços crescentes da ciência e a tecnologia e assim contribuir melhor nas tarefas da construção socialista; acrescentava que sim esta consciência, que engloba a do seu ser social, não pode haver comunismo.
Como elemento fundamental para ir formando o modelando este homem novo, emerge o trabalho político, orientado pela vanguarda revolucionaria e fundamentalmente pelo exemplo pessoal dos seus dirigentes. O desenvolvimento ideológico se converte assim no motor principal no processo de desenvolvimento da sociedade socialista e não a hipotética locomotora da economia, independentemente de sua importância na construção da base material da sociedade.
Para o Che a consciência é o modo fundamental de se expressar a inter-relação do homem com o médio: é uma ação consciente, predomínio do fator subjetivo organizado; tais são os seus atributos principais que devem permanecer durante todo o período de transição ao socialismo e tender a homogeneizar a sociedade. Na conceição do Che a consciência é a alavanca fundamental, a ferramenta, para lograr que as forças produtivas e as relações de produção sociais deixem de ser médios para perpetuar a dominação como era no capitalismo.
Depois de conhecer e estudar a vida e a obra do Che, se pode dizer que ele é o arquétipo do homem novo que preconizava.
Você que teve a oportunidade de conviver com ele no Ministério da Indústria, como era Che na condição de Ministro?
O Che foi um excepcional ministro de grande autoridade moral e política. Entre suas características principais como dirigente podemos destacar:
- Combinava criativamente a visão estratégica do desenvolvimento industrial com o acionar prático e o critério político e ideológico vinculado estreitamente aos critérios técnicos e económicos.
- Incentivava a participação da classe operaria na tomada de decisões e na solução dos grandes problemas de produção causados pelo bloqueio imperialista;
- Praticava a discussão coletiva como forma de confrontar critérios, de criar um clima aberto à expressão de opiniões, de aprender, de avaliar propostas e proponentes, de desenvolver quadros, de provocar para conhecer se uma proposta estava bem fundamentada, de conhecer melhor às pessoas.
- Instituiu uma seria política de quadros baseada no desenvolvimento político técnico e administrativo dos funcionários, assim como no cumprimento adequado e exitoso dos seus deveres.
- Desenvolveu uma política de formação de recursos humanos a todos os níveis. Pode-se dizer que todo o Ministério e as suas empresas se converteram numa grande escola.
- Combateu arduamente contra o burocratismo, uma deformação que produzia demoras, procedimentos desnecessariamente enredados e complicados para abordar um problema e não o resolver ou dar-lhe uma solução inadequada.
- Impulsou o trabalho voluntario como parte da sua concepção sobre a construção da sociedade socialista y comunista.
- Uma das características mais distintivas do Che era a sua austeridade pessoal, a qual também a exigia dos funcionários do Ministério e as empresas.
- Estimulava o uso da crítica e da autocrítica como método de trabalho e era muito exigente no cumprimento das tarefas e ao mesmo tempo estava dotado de uma grande sensibilidade humana e um fino sentido do humor.
Quais foram seus maiores desafios à frente do Ministério?
Eu diria que foram os seguintes:
- O criminal bloqueio imposto pelo imperialismo norte-americano, assim como as agressões militares e os sabotagens promovidas pelo mesmo governo.
- A fuga estimulada de grandes recursos humanos qualificados.
- A inexperiência e falta de qualificação adequada dos novos quadros dirigentes.
- A falta de planos nacionais de desenvolvimento.
Quais principais contribuições de Che Guevara ao Desenvolvimento Econômico, Industrial, Científico e Tecnológico em Cuba?
Eu considero que entre as principais contribuições do Che neste sentido foram as seguintes:
- Organizar e estabelecer um sistema industrial mediante a recuperação e melhoramento das fábricas existentes no país, assim como os investimentos para construir novas instalações produtivas; entre elas: a criação de uma base mecânica praticamente inexistente; a ampliação da indústria elétrica; a busca e extração de recursos minerais próprios, em particular o petróleo e o mineral para a indústria do níquel, criando em particular uma base própria de construção industrial.
- Incrementar a participação da classe operaria na busca de soluções aos múltiplos problemas produtivos e na tomada de decisões.
- Promover a ampla capacitação dos recursos humanos a diferentes níveis.
- Estimular o desenvolvimento científico e tecnológico mediante a criação de centros de pesquisa e desenvolvimento, em particular os referidos aos derivados da indústria açucareira, a construção de maquinarias, os recursos naturais minerais assim como a eletrônica e a automatização dos processos industriais.
- Estabelecer mecanismos de planejamento, inseridos dentro dos planos nacionais de desenvolvimento económico e social assim como a definição de planos estratégicos a mediano e longo prazo.