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domingo, 9 de março de 2025

Yago Oproprio e sua poesia crítica do cotidiano

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O rapper Yago Oproprio, de 29 anos, lançou neste ano seu primeiro álbum, “OPROPRIO”. Com 10 faixas, o disco apresenta uma reflexão poética sobre o cotidiano e as dificuldades impostas pelo sistema capitalista. Em letras que abordam temas como alienação, vícios e desigualdade, o artista destaca a importância da coletividade e da resistência.

Higo Castro | Belém (PA)


CULTURA – O rapper de 29 anos, nascido na Zona Leste de São Paulo, Yago Oproprio lançou este ano seu primeiro álbum, intitulado “OPROPRIO”. Contando com 10 faixas, de maneira leve e poética, Oproprio nos leva a refletir sobre inúmeras questões que nos passam batidas na correria caótica do dia a dia. O cantor levanta perspectivas sobre a forma em que vivemos no capitalismo, a forma como nosso tempo de vida é quase completamente tomado pelo trabalho e que quando reivindicamos ou sequer questionamos esse modo de vida, o sistema faz de tudo para que nossas aspirações coletivas sejam reprimidas.

“La Noche” e “Inofensiva”

Nestas faixas do álbum, Yago nos leva a pensar sobre como nos perdemos em ilusões efêmeras como roupas da moda ou vício em álcool e drogas, procurando uma forma de escape das dificuldades da vida, e como nesse caminho acabamos nos acomodando e até mesmo nos tornando mais brutos conosco e com os outros.

Além disso, nos faz pensar como tais “escolhas” muitas vezes nos levam às famigeradas crises de meia-idade (inclusive muito cedo), quando nos vemos sem saída em um círculo vicioso de questionamentos sobre o nosso sucesso pessoal. Esta infelizmente é uma vivência muito comum no sistema capitalista, não apenas na fase adulta, mas já a partir da entrada no mercado de trabalho durante a juventude.

“Sempre me enganando pra fugir pra qualquer pico / Bailão na quebrada, se me chama, eu apetito / Whisky mais barato com meu boot mais bonito / Eu bebo até ficar esquisito e volto em casa pra poder / Na medida exata da loucura e o compromisso / Daqui duas hora eu bato o ponto no serviço / Honro as minha fita, ninguém tem nada com isso/ E se o caminho foi do vício, eu precisava(La Noche, Yago Oproprio)

“Jejum”

A faixa mais explicita no quesito político: “Jejum” fala sobre o que temos em comum uns com os outros, afinal, todos que pegam ‘busão’, trabalham todos os dias para trazer seu sustento, fazem parte da mesma classe na sociedade capitalista, temos todos os interesses em comum.

A questão, como coloca o cantor em entrevista, é que “a internet […] ela trouxe… cada um que levanta sua bandeira e a gente excluiu o outro, e essa cultura de destruir, às vezes, quem erra, pode afastar alguns irmãos que poderiam estar com a gente colando junto para construir algo”.

Dessa forma, é preciso que busquemos pautas que sejam unificadoras, pautas que a polarização política não consiga nos distanciar de nossa própria classe, como exemplifica Oproprio: “a música chama jejum porque eu acho que existem dores e pautas que elas são universais pra quem pensa parecido, por exemplo a fome, ela me revolta, então eu vejo alguém passando fome na rua eu fico triste.”

“Tamo pensando em um por um, que revolta cada um / Linha do tempo pode nos comprometer / Se te incomoda esse jejum, temos dores em comum / Basta ‘nós’ saber reconhecer” (Jejum, Yago Oproprio)

 “O Desespero de Odete”

Em menção honrosa, uma faixa que não faz parte do álbum, mas que retrata bem como não basta questionar e reivindicar, mas partir para ação. “O Desespero de Odete”, música com colaboração do rapper Murica, conta a história de uma mãe que perde seu filho para opressão policial. Assim, Oproprio denuncia estas situações que são comuns nas periferias em seus versos:

“Eu ouvi Odete pedindo socorro / Duas da tarde no morro Brejão Santa Luz / E os ‘home’ que ‘invadiro’ sentaram o pipoco / E ela com os filhos nos braços fez sinal da cruz”

Como via de solucionar o problema, Murica complementa, ressaltando como a PM é uma herança da ditadura militar fascista e como é necessária a organização coletiva do povo para por fim a essa chaga da sociedade capitalista:

“Quem que matou, quantos morreu? / E os frutos que ano de 64 deu

Não, com nóis não, sangue bom / Se esqueceu que nóis é malan’ / E o que virá é a revolução / Não vejo fita dominada

Falta estudo e organização / Estratégia e aplicação / Presidente em decapitação / E um samba pra ouvir com a rapa”

E, por mais que a faixa seja de 2021, recentemente em nosso país, houve uma crescente nos casos de abuso de autoridade por parte da Polícia Militar, como a invasão de um velório por parte da corporação em Bauru (SP), no qual os agentes agrediram familiares de luto e prenderam um dos irmãos do morto. “A PM destruiu minha família e está tirando o meu direito de ir e vir porque estou com medo. Se eu vejo uma viatura, é capaz de eu ter um troço”, relata a mãe de Guilherme Alves, morto pela PM no dia anterior.

O rap desde seu surgimento tem se colocado como contracultura, retratando a difícil realidade do povo pobre periférico, em especial, o povo preto, questionando o racista sistema capitalista e nos fazendo refletir sobre a coletividade necessária para mudar essa situação. Yago faz parte de uma leva de artistas que revive essa trajetória questionadora que não se rende a padrões da indústria, é preciso, portanto valorizar artistas deste calibre, pois vale lembrar os versos de Lord em “Favela Vive 5”:

“Favela tá lutando, mas ainda não venceu / Se eu lembrar de quem morreu / Saudade, choro muitas vezes / Quem dera se eu matasse e nesses versos nós vivesse / Quem dera se eu ficando rico, favela vencesse” (Favela Vive 5, ADL)

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