Ildo Sauer é professor titular e diretor do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP. Foi diretor de gás e energia da Petrobras no primeiro Governo Lula. É um dos maiores cientistas brasileiros na área de energia com diversos artigos publicados em periódicos internacionais e livros. A Verdade foi ouvir este especialista para mostrar os sérios riscos que correm hoje as riquezas naturais do Brasil, sua economia e sua soberania.
A Verdade – No momento se fala muito das divisões dos royalties, mas pouco se discute no Congresso Nacional sobre a nova rodada de leilões do pré-sal. O que isso significa, quais os ganhos e as perdas desses leilões para os brasileiros?
Ildo Sauer – O grande problema é que não sabemos quanto petróleo foi entregue pelos leilões. Isso significa que o Brasil leiloou uma riqueza sem saber o seu valor. É uma grande irresponsabilidade o Governo organizar outra rodada desta mesma maneira, considerando ainda o momento de valorização do óleo existe nos blocos.
As perdas são enormes numa situação como essa. A luta pelo lucro suplementar, definida por Karl Marx, é uma luta radical entre a burguesia. Seus interesses são contraditórios. O petróleo tem o poder de, com um investimento baixo, gerar uma margem de lucro enorme.
Há muita divulgação na imprensa sobre os prejuízos da Petrobras. Qual é a situação real da empresa?
Na minha opinião, são três disputas que existem em relação aos rumos do controle e produção de petróleo no Brasil.
Os acionistas fazem uma enorme pressão política para que a Petrobras seja extremamente produtiva. Afinal, querem o retorno do que investiu o quanto antes, levando em conta também a pressão do capital em época de crise. Portanto, quanto mais alto o valor de venda, maior o lucro, e não importam as consequências para a economia.
Outra tendência capitalista é a da indústria nacional. Para a economia interna interessa que os derivados de petróleo acompanhem o mercado internacional. Para empresas como a Gerdau e a Vale, quanto mais baixo o valor dos derivados, mais lucros poderão ter.
Essa disputa tem reflexão na imprensa do Brasil, pois trata-se de uma disputa para pressionar o Governo para que consigam seu objetivo.
Qual deve ser a posição do movimento popular diante dos leilões?
Os setores populares do Brasil, desde a luta “O petróleo é nosso”, liderada pela UNE, até hoje, defendem que os recursos gerados pelo petróleo sejam utilizados para o povo: reforma urbana e agrária, saúde, educação, investimento em ciência, tecnologia e agroecologia, é o que eu defendo.
Diante desse quadro, o Governo brasileiro, com o PT assumindo em 2002 com a esperança de o programa popular ser atendido, sucumbiu às pressões do capital financeiro e traiu o povo que o elegeu.
O Governo Lula organizou cinco rodadas de leilão contra quatro de FHC. Além disso, manteve a ANP (Agência Nacional de Petróleo), criada pelo Governo tucano, que é uma agência que fundamentalmente cumpre o papel de expor e oferecer as riquezas nacionais para o superlucro.
Diante dessa realidade, o Governo joga uma cortina de fumaça para a população e para fazer propaganda política nas próximas eleições. Os royalties não passam de 15% do valor total gerado pelo petróleo nacional. A UNE deveria defender a estatização e o controle público do pré-sal e toda a cadeia petroleira do Brasil. A UNE não pode ser pautada pelos royalties, que é um jeito inócuo de resolver os grandes problemas de nosso país. Esse debate gerou também uma luta fratricida entre o bloco São Paulo, Rio de Janeiro e Espírito Santo contra os outros estados. A verdade que é o Estado brasileiro é que tem ficar com o lucro. Os locais de extração, em sua maioria, são longe da costa e sob responsabilidade da marinha brasileira.
Estão privatizando o nosso petróleo?
Tenho informações seguras, do Consulado americano, de que a Dilma sempre defendeu os interesses do capital financeiro. Quando secretária no Rio Grande do Sul, seu nome sempre esteve ligado às privatizações. Inclusive, o Governo vem criando empresas extremamente lucrativas financiadas pelo endividamento público, coordenadas pelo BNDES, por exemplo.
Por fim, o capital quer retirar o óleo e transformá-lo em dinheiro o mais rápido possível. Deixando migalhas para serem repartidas pela população. Estão no Brasil todas as grandes empresas mundiais do setor. A novidade é a agressividade das três petroleiras chinesas que estão com mais dinheiro para comprar, sob qualquer custo, o lhes interessarem. O correto seria o Brasil deixar o petróleo debaixo da terra e controlar a produção. Por isso, a imprensa ataca tanto a Venezuela, que produz e investe sob o interesse da população venezuelana. O papel da esquerda e de entidades como a UNE, não é ficar submetidas às contradições da burguesia, mas sim defender os interesses populares, que historicamente foram de uma Petrobras pública, sob controle do povo.
Ricardo Senese, São Paulo