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domingo, 6 de outubro de 2024

O que está por trás da recriação do Ministério das Comunicações

AMIGOS – Rodrigo Maia, Alexandre de Morais, Fábio Faria e Jair Bolsonaro têm o mesmo projeto político e econômico para os brasileiros. (Foto: Reprodução/Marcos Corrêa)
Igor Mello Diniz

SÃO PAULO – O presidente Jair Bolsonaro, mais uma vez visando agradar a certos setores da burguesia nacional e manter funcionando seu esquema de controle das informações típico de regimes autoritários fascistas, recriou por meio de medida provisória o Ministério das Comunicações, que havia sido extinto pelo seu antecessor, o golpista Michel Temer. Na gestão de Temer, o ministério foi diluído com outros, formando o MCTIC (Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações).

O Ministério das Comunicações foi criado pelo regime militar, que governou o país entre 1964 e 1985, através do decreto-lei 200/1967, sancionado pelo então presidente General Castelo Branco. Esta medida provisória 980, que recria o ministério, foi editada na semana passada, no dia 11/06/2020, com o anúncio sendo feito ao final da noite da quarta-feira, dia 10, para que mais uma vez as informações não fossem divulgadas pelos telejornais dos grandes veículos de comunicação, tática adotada também com os números de mortes do COVID-19.

O indicado para ocupar a chefia do ministério é o deputado Fábio Faria, do PSD-RN, casado com Patrícia Abravanel, sendo, portanto, genro de Silvio Santos, dono do SBT e um dos comunicadores mais populares do país. A indicação é defendida por Bolsonaro como técnica pois o ministro teria vivência na área até mesmo pela situação familiar e também por seu bom trânsito com empresas da área. Este patrimonialismo que beira nepotismo é próprio deste governo, que já viu o filho do próprio presidente sendo cotado para ocupar a embaixada brasileira em Washington apesar de não ter nenhuma credencial diplomática e nem mesmo saber se comunicar no idioma do país.

Há alguns elementos que na verdade servem de lastro para essa recriação e para esta indicação peculiar para a chefia do ministério:

Apoio do Centrão e a Ameaça do Impeachment

Ao recriar o Ministério o fascista rompe mais uma vez com o seu discurso de campanha que reduziria gastos do governo e que eliminaria cargos para acabar com a corrupção, mostrando mais uma vez (e nada indica que esta será a última) que na verdade sua candidatura e sua chegada ao poder nada tem a ver com acabar com a corrupção.

Entregando um ministério ao PSD de Gilberto Kassab, que fez parte dos governos de Dilma (até o último dia) e de Temer (desde o primeiro dia), Bolsonaro garante também o apoio de setores do congresso que não aprovariam seu pedido de impeachment caso o processo fosse iniciado pelo presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). Maia, pelo contrário, deu declarações aprovando a nomeação de Fábio Faria para o cargo. Desta forma, Bolsonaro começa a se cercar de formas de impedir que os pedidos de impeachment, que se acumulam na mesa de Maia, tenham prosseguimento e que, caso tenham, ainda assim não fossem a frente para derrubá-lo. Garante-se que os representantes diretos da burguesia nacional no Congresso continuem ao lado do presidente.

Continuação da Política de Entreguismo

Como já feito com outras empresas públicas, vide o caso da EMBRAER (cuja venda para a americana Boeing foi cancelada), agora vem a entrega da EBC, a Empresa Brasileira de Comunicação, para as mãos da burguesia que controla os meios de comunicação. Já não bastassem os enormes aportes financeiros para as redes que apoiam o presidente, a intenção agora é deixar alguém diretamente ligado a um destes conglomerados de comunicação diretamente no comando do ministério.

A Record, bem como o SBT de Sílvio Santos, já ultrapassou a Globo como maiores recipientes de verbas publicitárias, as mesmas que o governo tentou recentemente tirar de fundos do Bolsa Família para usar em propaganda, através de uma portaria que destina mais de 80 milhões de reais para tais fins. O chefe da Secretaria de Comunicação do governo (que passará de órgão da presidência a parte integrante do MC), Fabio Wajngarten, também é sócio de emissoras de TV, o que significa retroalimentar a máquina de propaganda.

O SBT, em especial, tem muito a ganhar. Há anos a emissora de Sílvio Santos vem enfrentando o perigo da falência, já tendo sido salva, inclusive, durante o governo Lula. Em 2019, o governo repassou R$7,3 mi em verba publicitária à emissora de Sílvio, cerca de R$3 mi a menos que a Record do bispo Edir Macedo e ainda assim, recebendo mais do que a Rede Globo, que ainda está isolada no primeiro lugar quando se pensa no alcance que as emissoras têm. Esta última, inclusive, é alvo da base de apoio ao presidente, base esta que com frequência defende o fechamento da emissora acusando-a de tentar derrubar Bolsonaro.

Além de ser responsável por verbas de publicidade e pelas concessões de redes de televisão, o MC tem ainda sob o seu guarda-chuva a ECT (Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos), cuja venda é defendida pelo governo mobilizando argumentos clássicos como o fim da corrupção nas estatais e algo que é muito caro às elites do país, que é a questão logística, como se ambas pudessem ser magicamente resolvidas com a entrega dos Correios para as mãos do setor privado. Sabemos muito bem que nada é verdadeiramente resolvido dessa forma e quem mais tem a perder são os mais pobres e aqueles que moram mais longe dos centros urbanos e até mesmo nestes, se pensarmos nos moradores de subúrbios e comunidades.

Guerra Cultural

No pronunciamento em que anunciou a recriação do ministério feito na noite do dia 10/06/2020, Bolsonaro mencionou à vontade privatizar a EBC, mas também de criar programas. Apesar de ter passado despercebido, isso indica que nada escapa da visão de guerra cultural que este governo segue em vários âmbitos e que tem como seus maiores expoentes a ministra Damares Alves e o ex-ministro Abraham Weintraub.

Ao produzir conteúdo veiculado por emissoras oficiais, tudo indica que este reproduziria os valores que este governo tem como mais caros: não apenas conservadorismo, mas totalmente reacionários, não é difícil imaginar que de programas infantis até o jornalismo, teríamos conteúdo atacando minorias e patrocinando uma “visão oficial” do que é ser brasileiro e do que é o povo do nosso país, excluindo aqueles que não se encaixam no padrão da branquitude (onde o negro é lido como subalterno e que assim deve se conformar a ser), do patriarcado (onde o feminismo é silenciado) e a heterossexualidade (e as vozes dissonantes dos LGBT+ são sufocadas).

É temeroso pensar que veículos como a EBC, a Rádio Nacional e a Rádio MEC (entre outras empresas), podem ser manipuladas a serviço da propaganda de um regime protofascista como o de Jair Bolsonaro.

Guerra Comercial e Subserviência aos EUA

Além de tudo, há que se lembrar que ainda está presente no nosso horizonte o debate do 5G, tecnologia de acesso rápido à internet que muito interessa às empresas de telefonia. Inclusive, o Ministério das Comunicações tem como uma de suas muitas atribuições regular este setor, e sua recriação representa, portanto, um movimento estratégico na forma como o Brasil se coloca nesse debate, tanto interna quanto externamente.

É sabido que os Estados Unidos de Donald Trump estão em guerra comercial com a China, e um dos muitos pontos de disputa é justamente o da soberania tecnológica e do avanço de empresas chinesas no ramo, especialmente da Huawei. Se tivermos em mente a admiração nutrida pelo entreguista Bolsonaro e pela pulsão subserviente de Guedes, entre outros membros do governo, é fácil entrever que todas as cartas jogadas neste debate estarão marcadas a favor dos americanos e das grandes empresas de comunicação do país, muitas das quais multinacionais, jogando um jogo que para variar vai contra os interesses do povo.

Assim sendo, a recriação do Ministério das Comunicações é uma jogada complexa e multifacetada do governo Bolsonaro para se manter e ampliar seu controle na guerra de narrativas.

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